CISMAS, REFORMAS E DIVISÕES NA IGREJA – CCV

CISMAS, REFORMAS E DIVISÕES NA IGREJA – CCV

Adventistas do Sétimo Dia – II

Já aqui lembrámos que por volta de 1800 a jovem nação que eram os Estados Unidos experimentara um reavivamento religioso que ficou conhecido como o Segundo Grande Despertar. As suas origens costumam ser ligadas à reunião campal de Cane Ridge, em 1801, no Kentucky, com a participação de mais de dez mil pessoas. Pouco tempo depois, deu-se um despertar religioso na Universidade de Yale, em 1802, cujos licenciados se espalhariam pela costa leste, disseminando a renovação espiritual. O revivalestendeu-se em ondas por todo o Nordeste, avançando depois para o Oeste, ainda não muito distante da costa oriental. O interior do Estado de Nova Iorque, por exemplo, experimentaria tal sucessão de renovos espirituais que ficaria conhecido como o “distrito em chamas”. Emergindo como o principal pregador deste segundo despertar, temos Charles G. Finney (1792-1875), pastor presbiteriano que ajudou a moldar um estilo de revivalismo, envolvendo “novas medidas” como pregação directa e oração, reuniões prolongadas e a espera ansiosa, que daria forma ao evangelismo americano até aos dias de hoje.

A par de outros pregadores do despertar religioso, Finney enfatizou a conversão pessoal e uma via de aperfeiçoamento espiritual. Tal como na letra do popular hino do movimento renovador cristão, “Rock of Ages”, Finney declarava: “Seja do pecado a cura dupla, salve-me da ira e torne-me puro” (Be of sin the double cure. Save from wrath and make me pure).

O desejo de perfeição pessoal, para muitos revivalistas e para os que se iam convertendo ou aderindo ao movimento, estava também relacionado com a expectativa pós-milenar de que o despertar estava a preparar o caminho para o estabelecimento do Reino de Deus que está para vir. Para ajudar à vinda desse reino, formaram-se sociedades voluntárias para promover o movimento, como a American Bible Society (1816), a American Sunday School Union (1824) e a American Tract Society (1825). Os seus membros também procuraram atacar os males da sociedade através de organizações como a Society for the Promotion of Temperance (1826) e, mais importante, a anti-esclavagista American Anti-Slavery Society (1833).

GÉNESE DO ADVENTISMO

Enquanto as igrejas Metodista e Baptista cresceram rapidamente durante o Segundo Grande Despertar, grupos mais radicais procuravam restaurar o Cristianismo primitivo baseado no Novo Testamento, sem divisões ou derivas institucionais. Os mais proeminentes entre esses restauracionistas foram Alexander Campbell e Barton W. Stone, que se opuseram fortemente àqueles credos e se opuseram à organização de denominações. No entanto, acabariam por estabelecer uma nova denominação, os Discípulos de Cristo. Enquanto Campbell e Stone pregavam o restauracionismo no Oeste em expansão, um grupo menos proeminente, o Christian Connection (originalmente escrito Connexion), promovia ideias semelhantes na Nova Inglaterra.

No interior do Estado de Nova Iorque, recorde-se que o já aqui referido Joseph Smith levava a ideia de renascimento do Cristianismo primitivo ainda mais além quando, com “O Livro de Mórmon”, afirmava ter recebido uma nova revelação, ou um terceiro testamento, diríamos.

No mesmo Estado, uma outra figura, decisiva na fundação do Adventismo, William Miller, um fazendeiro que morava em Low Hampton, contribuiria para uma mistura, no Segundo Grande Despertar, de revivalismo, milenarismo e restauracionismo, a partir da sua surpreendente previsão, apresentada publicamente pela primeira vez em 1831, de que Jesus regressaria em torno do ano de 1843. Miller, um antigo deísta que se tornou baptista, reflectia aquilo que era um “cristianismo democrático” em desenvolvimento na América, baseado na crença de que qualquer indivíduo poderia interpretar correctamente a Bíblia sem depender de autoridades académicas ou de teólogos. Apesar de ter usado outras evidências bíblicas, Miller concentrou-se no livro de Daniel, particularmente em 8,14, “Duas mil e trezentas tardes e manhãs; depois disso, o santuário será restaurado”.

Considerando que um dia no tempo profético se referia a um ano do tempo real e que o termo “santuário” significava a Terra, Miller acreditava que este texto predizia o tempo do Segundo Advento de Cristo. Embora a sua compreensão pré-milenarista do Segundo Advento fosse diferente do pós-milenarismo reinante no Segundo Despertar, as “palestras” de Miller, tal como ele as designava, produziram múltiplos avivamentos, com muitos ministros e pastores, na sua região, a convidá-lo para pregar nas suas igrejas. Miller teve apenas impacto regional na década de 1830, mas o seu encontro com Joshua V. Himes (1805-1895), em 1839, um pastor do Christian Connection de Boston e promotor do Revivalismo, atirá-lo-ia para uma proeminência nacional.

Usando as ferramentas promocionais forjadas pelos vários grupos reformistas aos quais ele próprio pertencia, Himes fez do Milenarismo um movimento autêntico. À medida que as conferências e reuniões campais eram organizadas, artigos promocionais eram publicados e pregadores enviados por todo a Nova Inglaterra, na costa leste, criando um impulso adventista que começou a ir muito para além do controlo de Miller. Na verdade, a pressão do movimento forçaria mesmo Miller a declarar, de forma mais precisa, que Jesus voltaria entre 21 de Março de 1843 e 21 de Março de 1844, curiosamente o primeiro dia da Primavera, estação do renascimento da natureza. E em 1843, Charles Fitch (1805-1844), pregador americano, em contraste com a oposição de Miller à formação de uma nova denominação (que podia ser tida até como uma seita), convocou os milenaristas a deixar as suas igrejas domésticas, pois essas denominações tinham-se tornado como que uma espécie de Babilónia. Ou seja, de um cativeiro. Era preciso “partir novamente para Sião”, para a esperança da renovação.

Mas Jesus afinal não voltou. No Verão de 1844, finalmente, depois do falhanço da profecia, Samuel S. Snow (1806-1890), um pregador milenarista, mas menos importante, previu que Jesus viria, porém, naquele mesmo ano, no Dia da Expiação, ou seja, 22 de Outubro. Esta nova profecia espalhou-se como o fogo na seara, dentro do movimento revivalista. Enquanto grandes grupos de milenaristas se reuniam em torno dessa nova expectativa, na esperança dessa vinda, Miller e os outros líderes não a aceitaram, pelo menos até ao final de Setembro e início de Outubro desse ano. Mas Jesus voltou a não… voltar! No entanto, coube a Himes, Miller e a outros líderes, ajudarem, logo de imediato, os seus seguidores a recuperarem-se daquilo que ficou conhecido como o “Grande Desapontamento”. Era preciso fazer algo e depressa!

Vítor Teixeira

Universidade Católica Portuguesa

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