A humilhação pode ser boa
A 21 de Fevereiro de 1957, o professor Joseph Ratzinger teve que se apresentar para uma palestra com a sua tese de pós-doutoramento, que o capacitaria a ensinar se fosse aprovada. Estava muito nervoso porque, segundo o examinador, um teólogo chamado Michael Schmaus não era a seu favor. A posição de Ratzinger era tão controversa que durante a defesa da tese houve uma discussão calorosa entre o seu mentor Gottlieb Söhngen e o professor Schmaus, em pleno auditório.
«Foi uma situação extraordinária», observou Ratzinger, hoje o Papa emérito Bento XVI, durante a entrevista com Peter Seewald, para o seu livro recém-publicado, “Last Testament. In his own words” (O Último Testamento. Nas suas próprias palavras).
Quatro anos antes, em 1953, imediatamente depois de ter obtido o doutoramento, o reitor da Universidade disse-lhe: «Esperava tê-lo como colega no seminário», relembrou o Papa Bento XVI. Isto deu-lhe um impulso positivo ao seu ego.
Mas a batalha da tese de pós-doutoramento foi uma grande humilhação. «Fui muito diminuído nessa ocasião», comentou o Papa Bento XVI. «E isso fez-me bem de uma certa forma: reconhecer, novamente, sim, a nossa total pobreza; e estar ali, não como um grande herói, mas antes como um humilde candidato».
E desta experiência retirou uma lição: «precisamos de humilhações», disse, acrescentando: «Acredito que é perigoso para um jovem, simplesmente caminhar de sucesso em sucesso, sendo normalmente elogiado ao longo do percurso. Assim, é bom para esse jovem conhecer os seus limites, ter que lidar ocasionalmente com o criticismo, ter que sofrer na sua caminhada durante um período negativo, reconhecer as suas limitações e não conseguir apenas sucessos após sucessos. Um ser humano necessita de enfrentar algo de forma a aprender a avaliar-se a si próprio correctamente, e também – não menos importante – a aprender a pensar com as outras pessoas. Assim, não julgará precipitadamente os outros mantendo-se distante, mas, pelo contrário, aceitando-os positivamente nas suas dificuldades e fraquezas».
Precisamos de humilhações. De facto, as humilhações são um bom caminho para a humildade. As humilhações podem vir de outras pessoas, que nos mostram a verdade face a face, ou por intermédio de mentiras. Os fariseus rejeitaram Jesus porque Ele comeu e bebeu com cobradores de impostos e pecadores (Mateus 9:11, Marcos 2:15, Lucas 5:30) e envolveu-se com mulheres má fama (Lucas 7:36-40, João 4:3-42, 8:1-11). Acusaram-No falsamente de exorcizar demónios pelo poder de Beelzebu (Mateus12:24, Lucas 11:15).
Também podemos ser humilhados em certas situações e circunstâncias quando enfrentamos as nossas incapacidades, face a alguns problemas. Somos humilhados pelas nossas falhas, mas as derrotas são um bom remédio para o orgulho.
«Por vezes surpreendi-me a mim próprio», revelou o Papa Francisco, «ao pensar que algumas pessoas empertigadas poderiam ter umas “escorregadelas” ocasionais e assim poderiam lembrar-se que são pecadores e com isso reencontrarem Jesus. Penso de novo nas palavras do Servo do Senhor, João Paulo I, que durante uma audiência das quartas-feiras disse “o Senhor ama tanto a humildade, que às vezes até nos permite cometermos alguns pecados capitais. Porquê? De forma a que esses, que cometeram tais pecados, possam continuar humildes depois de se arrependerem”» (The Name of God is Mercy) “O nome de Deus é Misericórdia”.
Pe. José Mario Mandía