ATEÍSMO

ATEÍSMO

A negação de um deus que não é Deus

Muitos filósofos da época moderna tiveram a ousadia de refutar a existência de Deus, porém não apresentaram reflexões ou raciocínios sobre as religiões monoteístas: Judaísmo, Cristianismo e Islamismo.

Os grandes pensadores ateus, entre 1850 e 1950, limitaram-se a abordar este tema a partir da divindade hegeliana (Hegel, filósofo alemão, 1770-1831), que recorrendo à sua dialéctica complexa entre o Ser, o Nada e o Devir reduziu Deus a uma ideia, não se esforçando por construir argumentos válidos sobre a não existência de Deus.

Racionalmente nada provaram nem procuram fazê-lo, por isso o ateísmo é considerado como irracional, na medida em que a razão não foi tida como elemento de trabalho para estes filósofos.

Bakunin (pensador activista russo 1814 – 1876), considerado uma das figuras mais influentes do  anarquismo e um dos principais fundadores da tradição social anarquista, foi despertado para o estudo da filosofia de Fichte, a partir da qual conheceu as obras de Hegel. No seu radicalismo ideológico e revolucionário, partindo do conceito do “deus hegeliano”, concebeu a ideia de deus como o ser mais vazio, o nada, uma abstracção morta, algo que não pode existir.

Os hegelianos de esquerda interpretaram Hegel num sentido revolucionário, o que os levou a defender sem tréguas e a implementar o ateísmo na religião e o socialismo na política. Entre eles destaca-se Ludwig Feverbach e o seu mais famoso seguidor, Karl Marx.

Defendendo a ideia de que Deus impede o desenvolvimento do homem, Ludwig Feverbach logo entendeu que para se fazer uma revolução, implementando o comunismo, era necessário retirar da cena política todo e qualquer vestígio divino, para que o “futuro da sociedade pudesse ser luminoso e próspero”.

Karl Marx (filósofo, sociólogo, historiador, economista, jornalista e revolucionário socialista, nascido na Prússia,1818-1883) foi o maior influenciador da expansão do ateísmo no mundo. Partindo do pressuposto que esta tese estava, supostamente, confirmada e demonstrada pelos filósofos anteriores, dedicou-se a aplicá-la na prática: a revolução e a construção do comunismo, a qual com a ajuda de Engels deu origem ao “ateísmo científico”, o caminho desejado, livre e necessário, ausente de obstáculos. Sem Deus, o homem sozinho e sem referências superiores ou divinas fica à mercê do mais forte, torna-se terreno fértil e perfeito para a estratégia da luta de classes, para ser dominado e despojado de todo o seu valor humano e reduzido a uma peça da engrenagem marxista.

Também Friedrich Nietzsche (filósofo alemão, 1844-1900) seguiu o intento de negar a Deus e opor-se fortemente ao Cristianismo, não só porque o seu “coração altivo” se recusava a aceitá-Lo, mas também por um misto de rebeldia e revolta, fruto do seu carácter irónico. Porém os seus fracos conhecimentos de religião não lhe permitiram a construção racional nem a argumentação necessária para o fazer, limitando-se a ajudar a demolir o esvaziado deus hegeliano, na ânsia de conquistar mais “vontade de poder”.

Mais tarde, no século XX, Jean-Paul Sartre (escritor e filósofo francês 1905-1980), seguindo a tese dos filósofos anteriores, necessitava de negar a existência de Deus para poder proclamar a liberdade para o homem.

Em nome duma “amoralidade”, o guru do Maio de 68 não olhou a meios para atingir fins, aliás ele próprio defendia que “todos os meios são bons quando os fins são eficazes”. Longe duma reflexão filosófica sobre a religião, neste caso o Cristianismo, Sartre assume-se como um incansável ateu militante, com um invejável apoio na sua capacidade de escrever, não obstante ter-se lamentado de na sua vida não ter conhecido cristãos bons e fiéis ao Catecismo, mas só uma leve cultura de “aparência”, o que o levou a afastar-se cada vez mais.

A mediocridade burguesa do cristianismo tíbio nestes tempos de afastamento da prática religiosa também foi determinante na vida de outro grande filósofo e escritor existencialista francês, Albert Camus, representante já de outra forma de ateísmo, neste caso indiferentista. Escritor, filósofo, romancista, dramaturgo, jornalista e ensaísta franco-argelino, Camus (1913-1960) lamentava-se de que a sua família fosse mais supersticiosa do que religiosa, ninguém ia à missa e limitavam-se ao baptismo e aos sacramentos no final da vida. Ateu e Prémio Nobel da Literatura em 1957, afirmou que “ nada pode desencorajar a ânsia de divindade que existe no coração do homem”, uma poderosa constatação de como a condição humana fica desertificada, mergulhada num absurdo indescritível, ausente e carente de Deus.

Estas considerações podem levar-nos a reflectir como o ateísmo se instalou na Europa, não por uma reflexão profunda, racional e intelectual, mas por motivos pessoais, adoptando conclusões que outros haviam construído e estabelecido como fidedignas.

As grandes figuras da filosofia ateia entre 1850 e 1950 nunca abordaram seriamente a existência de um Deus a partir da razão, mas sim de categorias hegelianas, por motivos intrinsecamente pessoais, ou por uma forma de poder seguir em frente com teorias políticas que ambicionavam implementar.

Este deus negado pelos ateus foi adoptado pela inteligência de então, mas é um deus-nada sem qualquer relação com o Cristianismo, não é o Deus da Bíblia, nem dos teólogos, nem de São Tomás de Aquino, nem um Deus de Amor, mas sim o deus de Hegel, ou ainda de Espinosa, um nada, com laivos panteístas e uma necessidade imperiosa de protagonismo intelectual por parte dos seus autores.

Também poderemos concluir que ser cristão não é uma hipótese, nem uma aparência, nem uma imagem sem conteúdo; não chega parecê-lo, ser Cristão implica sê-lo de verdade, procurar ser outro Cristo no meio do mundo, ser um exemplo, uma referência, pois a sociedade, mesmo não crente, procura no cristão um sentido de vida com fé, coerência e transparência.

Susana Mexia

 Professora

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