Seguindo o Papa em Manila
A história da equipa d’O CLARIM – «Não se preocupe padre, Ele ainda está aqui», disse o comissário de bordo acalmando-me enquanto me preparava para sair do avião. Naturalmente que se referia ao Papa. O avião do Santo Padre vindo do Sri Lanka tinha aterrado às 5:45 da tarde, e o nosso voo (como tantos outros) tinha sido atrasado por razões de segurança. Depois de termos aterrado, ficámos numa longa fila de aeronaves que se encontravam à espera de serem autorizadas a seguirem para os seus terminais. Ninguém reclamou deste facto!
Tínhamos decidido fazer a cobertura da visita Papal apenas em fins de Dezembro, quando falámos com o chefe da Comissão de Imprensa da comissão organizadora (da visita do Papa às Filipinas), o bispo D. Mylo Hubert Vergara, que se encontrava em Macau para uma reunião das Conferências da Federação dos Bispos Asiáticos. Ele encorajou-nos a efectuar a nossa credenciação como jornalistas através da Internet. O processo era simples. Deu para verificar que as pessoas da Comissão Organizadora estavam a fazer um bom trabalho, metódico e profissional. Mesmo assim não recebemos as nossas credenciais antes de sairmos para as Filipinas. O que mais tarde veio a provar-se uma bênção.
No dia seguinte, sexta-feira, decidimos ver como poderíamos conseguir os nossos passes de Imprensa.
Fomos até á catedral de Manila, onde o Papa Francisco, na altura, celebrava missa em conjunto com os bispos, padres e irmãs presentes. Enquanto “furávamos” o nosso caminho através da espessa mole humana que rodeava a catedral, vimos muitas pessoas que seguiam a missa pela televisão. Muitas pessoas amontoavam-se em frente de aparelhos de TV, colocados nas montras de pequenas lojas e restaurantes, e seguiam a missa com muita atenção, especialmente durante a homilia do Santo Padre. Pensei que apenas um combate de Manny Pacquiao poderia atrair esta atenção.
Depois de termos perguntado a várias pessoas, fomos enviados para o Diamond Hotel onde as conferências de Imprensa diárias tinham lugar. Tivemos que fazer grande parte do trajecto a pé, porque o trânsito tinha sido bloqueado na zona. Pelo caminho, passámos por vários monitores de TV gigantes, à volta dos quais se encontravam muitas pessoas, para verem o Papa. Esbarrámos com Tomasz Sajewicz, o correspondente-chefe da Rádio Polaca, que de bom grado partilhou connosco algumas das suas opiniões. Finalmente, conseguimos um táxi, mais ou menos a meio do caminho para o hotel. O motorista também estava a seguir o Papa pelo rádio! De facto, nessa tarde, depois da reunião com as famílias, enquanto nos sentávamos num restaurante para jantarmos, vimos uma família numa mesa próxima da nossa que falava sobre as palavras do Papa. O meu pensamento foi: “uau!”. Alguns membros da Imprensa estrangeira tinham referido que fora apenas mais um encontro emocional momentâneo. Mas estavam errados. As pessoas seguiam objectivamente o que o Papa tinha para dizer.
Assim que chegámos ao hotel fomos informados que os procedimentos de segurança tinham provocado um atraso no processamento dos Passes de Identificação, mas que poderíamos levantá-los durante a tarde. Como disse antes, este facto foi providencial, porque o chefe da secção inglesa da Rádio Vaticano, Seán-Patrick Lovett, também estava por ali, e de boa vontade ficou connosco durante algum tempo. Durante a nossa conversa com Seán, alguém conhecido passou por perto. Era John Allen, da Crux, um membro da “Boston Globe Media”. Allen também trabalha para a CNN no Vaticano. E também nos forneceu algumas notícias privadas. Ainda vimos mais uma pessoa qualificada a falar das relações China-Vaticano; tudo isto apenas numa única tarde.
Um das coisas que me espantou nesta visita apostólica foi a cobertura total do acontecimento pela televisão. Qualquer pessoa que em casa assistisse pela televisão, ou pela Internet, ou nos monitores gigantes instalados em lugares relevantes e ao longo das ruas que faziam parte do roteiro do cortejo papal, podiam segui-lo desde o momento em que Ele saía dos portões da Nunciatura, onde estava hospedado, durante todo o percurso até ao local do próximo acontecimento, sem o perder de vista. Não havia necessidade de tentar adivinhar onde Ele estava. Penso que este foi um dos factores que ajudaram a prevenir movimentos súbitos descontrolados da multidão. Este facto necessitou de uma coordenação massiva e da reunião de imensos recursos para realizar o maior acontecimento de sempre nas Filipinas. Apesar de tudo, os filipinos podem trabalhar em conjunto. Foi um grandioso milagre criado pelo Papa Francisco.
Mas ainda houve um segundo milagre. No dia anterior à missa de Domingo, em Luneta, as pessoas começaram a deslocar-se para o local pelas 7 horas da tarde. Nós saímos de casa às 3 da manhã seguinte. E já havia um grande engarrafamento no trânsito! Afortunadamente conseguimos estacionar o carro suficientemente perto. Foi a primeira vez que vi os meus conterrâneos a andar com um ar de real urgência, para um encontro que teria lugar dez horas mais tarde! Este foi o segundo dos milagres.
O terceiro milagre foi o facto de que todos esperaram nas filas sem reclamarem, e sem tentarem passar à frente das outras pessoas. Bem, pensei que a visita estava a transformar uma nação inteira. Que dádiva! Agora só podemos esperar poder pôr em prática tudo isto no dia-a-dia.
O próprio cardeal D. Tagle, arcebispo de Manila, admitiu este facto, ao dizer: «Este acontecimento é realmente um acto de comunhão e solidariedade. É um milagre em si próprio. Todos nós neste momento estamos transbordantes de reconhecimento a Deus. Fomos capazes de mostrar ao Mundo que é possível. Comunicação, cooperação e colaboração não são apenas conceitos; podem ser postos em acção».
Naturalmente que houve pequenos problemas. Um deles foi a distribuição da Comunhão durante a missa de Domingo. Pequenos vídeos mostraram os fiéis a entregar a Hóstia Sagrada às pessoas que se encontravam atrás deles. De certeza que se poderá encontrar um método melhor para na próxima vez se assegurar que o devido respeito seja concedido ao Divino Sacramento.
Em Manila, mais de seis milhões de pessoas enfrentaram o vento e a chuva, e talvez perto de um milhão em Leyte continuaram a rezar no meio de um tufão – isto é um facto a ter em conta e uma memória que merece ser acarinhada.
PEQUENAS HISTÓRIAS,
FAZEM UMA GRANDE HISTÓRIA
Antolin Adlawan, um homem de 66 anos, caminhou durante 36 dias, desde a província de Bukidnon até Leyte, tendo passado o Natal e o Ano Novo na estrada, dormindo onde podia, apenas para poder ver o Santo Padre. Ainda enfrentou uma tempestade tropical que causou inundações e deslizamentos de terras nas regiões de Visayas e Mindanao em Dezembro do ano passado. O seu único descanso foi rezar a Bíblia. E qual a razão deste acto de fé? Para dar Graças a Deus por manter viva a sua filha de 27 anos. Ela ainda era um bebé quando lhe foi diagnosticada leucemia.
O Santo Padre utilizou três diferentes “papamóvel”. Em Manila, uma Isuzu D-Max feita e personalizada nas Filipinas e um “jeepney” estilizado (nota do tradutor: “jeepney” = transporte típico filipino, criado a partir dos jeeps militares americanos deixados nas Filipinas no final da Segunda Guerra Mundial). Em Leyte, o Papa utilizou o “papamóvel” da sua visita à Coreia do Sul. Aparentemente, o Papa gostou tanto da Isuzu D-Max, que foi decidido enviá-la para o Vaticano, para que o possa usar também na Europa. Edgard Cabagon, director da empresa “Isuzu Makati Gencars inc.”, a companhia que construiu o “papamóvel”, comentou: «É um trabalho de amor». Adiantou também que as pessoas que trabalharam no veículo deram o melhor delas próprias.
E ainda temos as pequenas histórias de como o Papa acarinhou as pessoas à sua volta.
O Papa solicitou a Tippy Tambunting, o chefe pasteleiro para a comitiva, na Nunciatura, que preparasse um bolo de aniversário para a repórter do Vaticano, Valentina Alazraki, uma jornalista mexicana que faz a cobertura do Vaticano, que comemorava o seu aniversário durante o voo de regresso a Roma. O Papa disse a Tippy que não pusesse velas e que escrevesse a mensagem de parabéns no bolo, em Espanhol.
Uma outra pessoa que trabalhou na Nunciatura reparou que o Papa estava sempre a sorrir, mesmo sabendo que Ele se sentia muito cansado. Também sublinharam que o Papa queria que todos comessem juntos.
A tripulação do voo que o levou de regresso a Roma verificou o quanto o Papa é simples e inocente, e tão acessível. Não quis qualquer tratamento, ou refeições especiais. «Comeu o que nós comemos», disse um dos tripulantes.
Dan Lichauco, o designer do altar de Leyte disse ter preparado um impermeável especial para o Santo Padre, mas Ele quis usar o mesmo tipo de impermeáveis que todas as pessoas estavam a usar.
Algumas pessoas no exterior dos portões da Nunciatura foram autorizadas a entrar no recinto com as suas crianças. O Papa ofereceu um terço a cada uma delas. E, antes do Papa se retirar, pediu que trouxessem as suas famílias para que os pudesse abençoar.
O Papa Francisco manifestou o desejo de estar presente nas exéquias de Kristel Mae Padasas, a voluntária que faleceu num estranho acidente que aconteceu pouco depois do fim da missa em Tacloban no sábado anterior, mas teve que se resignar a não ir, porque esse facto levantaria problemas de segurança. Assim, Ele não pôde estar presente.
Quando perguntaram a uma senhora o que ela mais gostava no Papa, disse: «O seu sorriso. Vem do fundo do coração».
No voo de regresso a Roma, o Santo Padre disse que uma das coisas que mais o comoveu foi o sorriso das pessoas: «Uma alegria que não é artificial. Não era um sorriso falso. Não. Não! Era um sorriso que estava ali, verdadeiro».
Era um sorriso que vinha do coração. Talvez este facto explique a aproximação entre o Papa e as pessoas. O seu coração falou a outros corações.
Pe. José Mario Mandía
Em Manila (Filipinas)
(Tradução: António R. Martins)