As longas orelhas do Coelho para uma melhor escuta e uma cura mais profunda
«E percorria Jesus toda a Galileia, ensinando nas sinagogas, pregando o evangelho do Reino e curando todas as enfermidades e males entre o povo»(Mt., 4, 23).
Ao iniciarmos o Ano Novo Lunar do Coelho, o Evangelho deste Domingo narra a poderosa inauguração do ministério público de Jesus (Mateus 4, 12-23): «O povo que jazia nas trevas viu uma grande luz; e aos que estavam detidos na região e sombra da morte, a luz raiou». Também nós desejamos começar este novo ano com um raio de esperança, depois de todos os desafios que encontrámos nos últimos doze meses.
Este Domingo é dedicado à Palavra de Deus. Com o alvorecer do Ano Novo, precisamos da Palavra de Deus para nos tranquilizar e nos guiar para um futuro imprevisível. Além disso, sendo este o Ano do Coelho, animal de orelhas compridas e audição aguçada, não podemos deixar de pedir ao Senhor a Graça para sermos ouvintes atentos da Sua Palavra, que não é simplesmente um texto antigo ou uma sabedoria do passado, mas uma Pessoa – Cristo, vivo e activo na Igreja e no mundo, a falar nos nossos corações, bem como através dos eventos que circundam as nossas vidas.
Os momentos de crise são momentos privilegiados para ouvir a voz de Cristo que nos chama, como fez com os primeiros discípulos: «Segue-me!», podemos ler no Evangelho. Pedro e André foram convidados a encontrar o propósito das suas vidas ao servirem os outros, estabelecendo um relacionamento vivo com Jesus. A dureza do trabalho na pesca e, sobretudo, as redes vazias, relatadas noutros Evangelhos, ajudaram-nos a atender o convite de Jesus. Uma citação famosa de C.S. Lewis diz: “Podemos ignorar até mesmo o prazer. Mas a dor insiste em ser atendida. Deus sussurra-nos nos nossos prazeres, fala na nossa consciência, mas grita nas nossas dores: é o seu megafone para despertar um mundo surdo” (“O Problema da Dor”).
Infelizmente, nos últimos anos, aprendemos que muitas vezes nem mesmo aquele megafone é suficiente para chamar a nossa atenção para Deus. Originalmente, esperávamos que as lições de moral ensinadas pela pandemia nos ajudassem a tornar-nos pessoas melhores e a construirmos um mundo melhor; e, de facto, inúmeros irmãos e irmãs, tanto na Igreja quanto na sociedade, demonstraram amor e cuidado altruístas em muitas situações críticas. Por outro lado, face à disciplina da adopção de medidas restritivas para proteger os outros e à necessidade de solidariedade para com os mais desfavorecidos da sociedade, muitas vezes temos visto o pior do egoísmo humano. A pandemia revelou verdadeiramente o que temos nos nossos corações e onde estão as nossas prioridades.
Por isso, no último versículo do Evangelho deste Domingo, lemos que além de «ensinar e pregar», Jesus curou as nossas doenças e enfermidades. O ensino e a proclamação da Palavra de Deus são terapêuticos: faz com que as nossas doenças corporais e espirituais sejam expostas e tratadas para que sejam curadas.
Aqueles de nós que viram a infame segunda linha vermelha aparecer nos testes RAT e experimentaram sintomas graves de Covid sabem bem como uma doença pode ser debilitante. Nos últimos meses, os efeitos sociais da pandemia também foram sentidos na sociedade em geral: hospitais, lojas e redes de abastecimento foram interrompidos por um elevado número de infecções. As minhas orações vão para aqueles que não puderam estar com familiares que morreram sozinhos em hospitais ou em lares de idosos, devido a rígidos regulamentos de isolamento. De facto, precisamos de cura corporal e social.
Ao mesmo tempo, precisamos ser mais sensíveis às “doenças da alma” e aos seus sintomas, porque os nossos corações e mentes também precisam ser curados. Não é por acaso que a Igreja chama às poderosas forças negativas escondidas por detrás de muitas das nossas escolhas egoístas de “pecados capitais”: orgulho, avareza, inveja, ira, luxúria, gula e preguiça. Estes, se não forem atendidos, podem arruinar a vida de alguém e das pessoas ao nosso redor. Sejamos honestos: estas “doenças da alma” desempenharam um papel importante em muitos dos desastres pessoais e sociais causados pela pandemia. Agora é hora de enfrentar estas mazelas internas de forma mais directa, sem culpar apenas as forças externas como a causa dos nossos problemas.
Começamos o Ano Novo do Coelho com esperança num mundo aberto pós-Covid. Jesus acompanha-nos, ao ensinar-nos e ao proclamar as Boas Novas do amor de Deus e o Seu poder de cura, também para que neste novo ano possamos fazer escolhas mais saudáveis, não só para nós, mas também para as nossas famílias e a sociedade em geral. Se usarmos bem nossa audição interior e nos tornarmos ouvintes cuidadosos – uma espécie de “coelhos espirituais!” –, uma vez curados, também nós podemos tornar-nos como Jesus: professores e divulgadores de um futuro de esperança, assim como agentes de cura para um mundo em recuperação.
Pe. Paolo Consonni, MCCJ