15º DOMINGO COMUM – Ano A – 16 de Julho

15º DOMINGO COMUM – Ano A – 16 de Julho

Semear e cultivar. A espiritualidade saudável pode mudar o mundo

“Ouça! Um semeador saiu para semear. E enquanto ele semeava, algumas sementes caíam à beira do caminho… outras sementes caíam em terreno pedregoso… outras sementes caíam entre espinhos… uns sessenta, uns trinta” (cf. Mt., 13, 3-9).

A parábola do semeador, que será proclamada neste Domingo (Mt., 13, 1-23), relaciona agricultura com espiritualidade. Vivia-se numa sociedade predominantemente rural e Jesus recorreu a imagens que poderiam ser facilmente compreendidas por quem O ouvia. Mas o simbolismo desta parábola é verdadeiramente universal e relevante, mesmo no nosso tempo tecnológico.

Dou-vos um exemplo para ilustrar o meu ponto de vista: Quando o Império Romano entrou em colapso (Século V d.C.), a Europa entrou num período de anarquia e guerra. As chamadas “tribos bárbaras” do Nordeste invadiam facilmente pelas brechas das fracas defesas do Império, destruindo e desestruturando a vida social, económica e cultural. Práticas agrícolas prolongadas e insustentáveis empobreceram a terra, muitas das quais tiveram de ser abandonadas ficando por cultivar. A enorme herança cultural da civilização grega e latina estava prestes a perder-se para sempre.

Foi durante esta fase que a vida monástica começou a florescer, especialmente a Ordem Beneditina. Ao contrário da crença popular, os monges não escaparam aos males resultantes de um mundo decadente e caótico, apenas porque gozavam, em privado, de bem-estar espiritual. Pelo contrário, seguindo o princípio “ora et labora” (oração e trabalho), os monges tentaram fazer bom uso dos recursos espirituais e materiais à sua disposição, para o bem das pessoas em seu redor. Ao fazê-lo, desempenharam um papel crítico para a sobrevivência da civilização ocidental.

Estas comunidades monásticas não eram apenas centros espirituais, mas também potências de actividade intelectual, agrícola, educacional e caritativa.

Ao desenvolverem novos métodos agrícolas, os monges desbravaram grandes extensões de terra, tornando-as férteis e acessíveis, ao mesmo tempo que transmitiam esses conhecimentos à população em geral, que se inspirava no grande respeito e honra que os monges demonstravam ter pelo trabalho manual. Rotação de culturas, irrigação, cervejeiras, queijarias, reflorestamento, agricultura orgânica e fitoterapia, entre muitas outras, foram algumas tecnologias desenvolvidas nos mosteiros e que ainda hoje se encontram em funcionamento.

Na Encíclica Spe salvi, o Papa Bento XVI recorreu à vida exemplar destes monges para explicar como o esforço que fazemos para aprofundar a nossa vida espiritual, claramente orientada para além do mundo actual, tem também o potencial de transformar o nosso ambiente de vida.

O “cultivo do solo” é uma boa metáfora para ilustrar a conexão frutífera entre espiritualidade e trabalho: “O terreno bravio de um bosque torna-se fértil, precisamente quando, ao mesmo tempo, se deitam abaixo as árvores da soberba, se extirpa o que de bravio cresce nas almas e se prepara assim o terreno onde possa prosperar pão para o corpo e para a alma. Por acaso, olhando precisamente a história actual, não se constata novamente que nenhuma estruturação positiva do mundo é possível nos lugares onde as almas se brutalizam?” (Spe Salvi, 15).

A parábola do semeador lembra-nos que enquanto gastamos muitas das nossas energias e recursos para nos tornarmos seres mais produtivos e melhorarmos o nosso padrão de vida, ao mesmo tempo precisamos de nos esforçar para “cultivar o solo da nossa alma”, para que nos possamos tornar mais receptivos à Palavra de Deus e produzir melhores frutos: estes frutos são o sinal de que o Reino de Deus está presente e cresce internamente e externamente. Esta “lavra espiritual” começa com a oração (especialmente a Lectio Divina), mas deve necessariamente envolver a abertura dos nossos pensamentos e sentimentos, do nosso carácter e talentos e dos nossos desejos e decisões, à acção transformadora de Deus. Somente este trabalho interior/pessoal pode constituir a base para uma mudança social mais ampla.

O exemplo dos monges ensina-nos que a espiritualidade não é uma actividade opcional que se acrescenta às tarefas quotidianas “materiais” mais úteis, mas é o que dá sentido e motivação ao nosso trabalho e torna-o ainda mais eficaz. Se “cultivarmos os nossos corações” e aumentarmos a quantidade de “boa terra”, na qual a Palavra de Deus pode criar raízes e germinar, então veremos os frutos do nosso esforço espiritual nas nossas famílias, profissões, relacionamentos e, esperançosamente, igualmente nas nossas sociedades.

Jesus é um semeador incansável e generoso. Ele nunca deixa de semear a Sua Misericórdia e Amor na vida de cada pessoa, mesmo que os nossos corações estejam sempre “em obras” e precisem de um cultivo constante. Pedras e espinhos, na forma de emoções descontroladas, distracções ou atitudes egocêntricas, devem ser tratados quase diariamente. Mas Jesus acredita na nossa capacidade de trabalhar pacientemente para que possamos dar ao Evangelho um lugar para criar raízes, crescer e produzir frutos a nível pessoal e comunitário. E no processo, como os monges daquela época, para tornar a Terra mais habitável!

Pe. Paolo Consonni, MCCJ

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