VIOLETA DURAN, VICE-PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DO SANTO NIÑO DE CEBU EM MACAU

VIOLETA DURAN, VICE-PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DO SANTO NIÑO DE CEBU EM MACAU

«A devoção ao Santo Niño é parte da nossa vida»

É uma das maiores e mais coloridas manifestações de fé dos católicos filipinos, sendo em Macau, desde há 24 anos, uma mostra de vitalidade e união, motivada pela devoção secular ao Santo Niño. No Domingo, a comunidade filipina radicada na RAEM sai à rua para celebrar o Sinulog e renovar a sua fé. Violeta Duran, vice-presidente da Associação do Santo Niño de Cebu em Macau, explica, em entrevista a’O CLARIM, porque razão a devoção ao Menino Jesus é um aspecto central da religiosidade filipina.

O CLARIM – A Festa do Santo Niño de Cebu é uma das mais importantes celebrações religiosas e culturais nas Filipinas, e em Macau é um dos principais símbolos da presença filipina no território. O Santo Niño está onde quer que estejam os filipinos?

VIOLETA DURAN – Sim, sim. É verdade! É uma celebração que tem um grande significado para nós, filipinos, porque o Cristianismo nas Filipinas tem o Santo Niño na origem. Quando Fernão de Magalhães chegou às Filipinas, introduziu o Cristianismo. Foi Magalhães quem apresentou Jesus Cristo ao povo filipino, sob a forma do Menino Jesus. Magalhães ofereceu uma imagem do Menino Jesus à rainha Juana, que liderava uma das tribos que viviam na altura no arquipélago. As Filipinas ainda não existiam como existem hoje, mas, de qualquer forma, o primeiro Baptismo foi exactamente o da rainha Juana e, como gesto de agradecimento, Magalhães e um dos frades que acompanhavam a expedição ofereceram-lhe uma imagem do Menino Jesus, a que chamámos de Santo Niño. Ora, este gesto tem para nós um grande significado e, ao mesmo tempo, é muito tocante, porque o Santo Niño realizou desde então muitos milagres. O que quer que lhe peçamos, Ele corresponde. O Santo Niño é uma parte muito, muito importante de nós. A devoção ao Santo Niño é parte da nossa vida.

CL – Que importância tem esta celebração para a comunidade filipina radicada em Macau?

V.D. – Onde quer que haja um filipino, há também a devoção ao Santo Niño. Não acontece apenas em Macau. Como lhe dizia, é uma parte substancial da nossa existência. A devoção ao Santo Niño é, por outro lado, bastante natural, porque todos dependemos dele. Dependemos das graças que nos concede e, sinceramente, não acredito que pudéssemos existir sem Ele. O Santo Niño é Jesus Cristo. É o filho de Deus. A devoção que lhe temos é muito profunda.

CL – Associada à celebração do Santo Niño está sempre o Sinulog, que mais do que uma dança é uma oração. Não é muito habitual, no seio da Igreja Católica, usar a dança como uma forma de rezar a Deus…

V.D. – É parte da nossa tradição. Antes de Magalhães não éramos católicos. Tínhamos crenças animistas, costumávamos acreditar em espíritos e, à época, era habitual celebrar essas crenças através da dança. Conduzíamos essas danças como forma de oração. O mesmo acontecia, de resto, no tempo de Moisés. O Velho Testamento diz-nos que as pessoas realizavam certas danças quando pediam algo ao Senhor, mas também dançavam para lhe agradecer pelas graças concedidas. A dança é, desde cedo, uma expressão de oração, uma forma de acção de graças. Trouxemos esta prática para Macau, mas é algo que pode ser visto por todo o lado nas Filipinas. Esta dança é uma expressão de fé, uma forma de chegar ao Santo Niño e de lhe pedir que nos abranja com a sua graça. Não é meramente uma dança, é também uma oração. Por exemplo, quando erguemos a imagem do Santo Niño, estamos a erguer também os nossos corações ao nosso rei. Quando fazemos o gesto com o braço, aquilo que estamos a tentar dizer é que temos de adorar Jesus Cristo. Ele está nos nossos corações. Quando fazemos estes gestos estamos a convidar todos os que se associam às celebrações a adorar a imagem do Santo Niño, até porque tudo lhe pertence. Mesmo as nossas vidas.

CL – Quantas pessoas participam todos os anos nas celebrações do Santo Niño em Macau?

V.D. – Não sei dizer ao certo. O que lhe posso dizer é que envolve muitos filipinos. Acreditamos piamente que o Santo Niño é parte importante das nossas vidas. Não podemos viver sem o Santo Niño. Em Macau esta celebração arrancou há 24 anos, com a minha família…

CL – Com a sua família? De que forma?

V.D. – Sim, com a minha família. O meu falecido pai costumava celebrar em casa, com a família e amigos. Depois, chegaram três sacerdotes em missão e sugeriram que esta celebração fosse conduzida em público. Muitos devotos do Santo Niño mobilizaram-se e reuniram-se para conduzir juntos a celebração e essa é a melhor forma de celebrar. Acreditamos que nos devemos reunir para louvar e bem-dizer o Santo Niño.

CL – Essa primeira celebração decorreu há 24 anos. Desde então, o Santo Niño já se tornou parte de Macau…

V.D. – Sim, parece-me que sim. Acho que se tornou parte de Macau, no sentido em que as autoridades locais nos deram uma oportunidade para revelarmos publicamente as nossas crenças e tradições. É um sinal de que nos querem ajudar e querem que nos sintamos como parte de Macau. Sentimos que também pertencemos a Macau. Podemos dar a conhecer a nossa cultura e as nossas tradições. O Senhor Santo Niño é parte relevante da nossa cultura e das nossas tradições, mas é fundamentalmente um pilar muito forte da nossa fé.

CL – É a primeira vez que a Festa do Santo Niño é celebrada no território em todo o seu esplendor depois do fim da pandemia de Covid-19, que foi um período bastante difícil para a comunidade filipina. No Domingo, a celebração do Santo Niño vai ser ainda mais especial?

V.D. – Vai ser, sem dúvida, ainda mais forte que nos outros anos, no sentido de que a pandemia nos confrontou com muitas dificuldades e, durante esse período, só Deus nos ajudou. Acreditamos que foi a graça de Deus que permitiu que permanecêssemos em Macau. É curioso que os primeiros casos de Covid-19 foram detectados em Novembro de 2019, mas em Macau as primeiras medidas só foram tomadas depois do Sinulog, depois da Festa do Santo Niño. Uma vez que o vírus já circulava, não deixa de ser significativo que a pandemia só tenha sido declarada depois das celebrações do Santo Niño.

CL – As celebrações do Santo Niño constituem um momento de unidade para a comunidade filipina radicada em Macau, uma vez que provêem de realidades muito distintas entre si?

V.D. – Sim. É um momento em que nos unimos em torno da fé a Jesus Cristo e da devoção ao Santo Niño. Esta união é algo que nos ajuda em mais do que um sentido. Primeiro, porque nos permite matar as saudades que sentimos de casa. Segundo, porque celebrar o Santo Niño e o Sinulog ajuda-nos bastante, tanto do ponto de vista emocional como do ponto de vista psicológico. Todos temos família nas Filipinas e a família é uma realidade de que sentimos muita falta. Sentimos falta do nosso país e o Santo Niño é um aspecto fundamental das Filipinas. Esta devoção não deixa ninguém indiferente.

Marco Carvalho

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *