IGREJA DE SANTO ANTÓNIO

IGREJA DE SANTO ANTÓNIO

Um Testemunho de Fé e História em Macau

A igreja de Santo António, uma das mais antigas e emblemáticas de Macau, é um testemunho vivo da história religiosa e cultural da cidade. Conhecida em Chinês como “Fa Vong Tong” (Templo do Rei das Flores), esta igreja não é apenas um lugar de culto, mas também um símbolo da resiliência e devoção das comunidades que a ergueram e preservaram ao longo dos séculos.

ORIGEM E CONSTRUÇÃO PRIMORDIAL (1558-1638) – Erguida entre 1558 e 1560, a primitiva ermida de Santo António foi construída em bambu e madeira, materiais simples que reflectiam a precariedade das primeiras missões jesuítas em Macau, tal como a efemeridade dos assentamentos lusos no território, ainda provisórios. Este foi o primeiro edifício religioso construído no Porto Interior, marcando o local onde os padres da Companhia de Jesus se instalaram pela primeira vez. Situada a poucos metros do local onde a igreja actual se encontra, esta ermida de modestas origens tinha anexa uma residência, pobre e simples, dos primeiros jesuítas que andaram por Macau.

Em 1601, a igreja ganhou importância simbólica ao receber as relíquias e o Santíssimo Sacramento salvos do incêndio que consumiu a igreja da Madre de Deus, junto ao colégio professo de São Paulo, da Companhia de Jesus. No entanto, a construção original de madeira e palha não resistiu ao tempo e foi destruída por um incêndio em 1608. Reconstruída em pedra em 1638, data gravada na cruz de pedra que adorna o adro, a igreja passou a ter maior resistência e durabilidade, ganhando também em prestígio. A pedra que solidificou a igreja representa a solidez crescente da presença portuguesa no território, bem como a implantação da fé cristã.

TRANSFORMAÇÕES E RECONSTRUÇÕES (SÉCULO XIX) – A igreja foi vítima de diversos incêndios e tufões, que marcaram o seu destino e impulsionaram constantes reconstruções. Em 1809, um largo incêndio destruiu grande parte do edifício. A reconstrução começou no ano seguinte, resultando numa nova estrutura que viria a ser concluída entre 1809 e 1810.

Outro incêndio ocorreu em 1874, provocado pelo gigantesco tufão (甲戌風災) que ocorreu naquele ano em Macau, fogo esse que destruiu novamente a igreja, o cartório e a residência paroquial. Uma nova reconstrução iniciada em 1875 definiu o desenho que inspirou a sua forma actual.

MODERNIZAÇÃO E RESTAUROS (SÉCULO XX) – Mais um incêndio, em 1930, conduziu a novos trabalhos de recuperação, consolidando a aparência neoclássica que a igreja mantém até hoje. Em 1940, a fachada e a torre sineira foram renovadas, conferindo ao edifício uma unidade visual elegante e distinta. Outras intervenções, realizadas entre 1951 e 1953, ajustaram detalhes decorativos e estruturais, preservando sua integridade histórica.

CARACTERÍSTICAS ARQUITECTÓNICAS – A fachada neoclássica da igreja, simples e equilibrada, é coroada por um arrojado frontão clássico. O frontispício assimétrico incorpora uma torre sineira de três andares, que adiciona dinamismo à composição. As janelas do segundo nível, com arquitraves pintadas de verde, ampliam a percepção da largura do edifício.

O interior da igreja apresenta uma nave única com cobertura de madeira em perfil abaulado, estando decorada com vibrante policromia. A capela-mor, de planta rectangular, abriga altares laterais e uma imagem de Santo António segurando o Menino Jesus. Um destaque singular é a escultura de Santo André Kim Taegon, primeiro sacerdote católico coreano e mártir.

UM SÍMBOLO DE FÉ E COMUNIDADE – A igreja de Santo António é ainda um marco cultural e religioso de Macau. Durante séculos, foi o cenário predilecto para casamentos das comunidades portuguesa e macaense, a partir da inspiração no floral e promissor nome chinês “Fa Vong Tong” do templo. Para os católicos, Santo António de Lisboa e Pádua, orago com grande veneração nesta igreja, é também, tal como em Portugal e na Europa, o santo padroeiro dos casamentos, tal como o deus chinês Ut Lou.

Santo António, também patrono dos namorados, é ainda uma figura de devoção militar em Portugal e no império. Até ao “handover” de 1999, uma cerimónia anual celebrava a sua ligação ao Exército português, com procissões e honras tradicionais.

Assim, a igreja de Santo António é mais do que um edifício; é um testemunho vivo das histórias e tradições que moldaram Macau, sendo um monumento à fé, à resiliência e à profunda ligação entre culturas. A tradição e a história fundem-se neste espaço, que hoje integra a lista de monumentos históricos do “Centro Histórico de Macau”, Património Mundial da Humanidade da UNESCO.

Vítor Teixeira

Universidade Fernando Pessoa

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