Governo tem medo dos interesses instalados.
Abordar assuntos pouco debatidos na RAEM foi o objectivo do convite ao cardeal D. Joseph Zen para vir ao território falar sobre as relações sino-vaticanas, assume Paul Chan Wai Chi. Em entrevista a’O CLARIM, o antigo deputado sustenta que o Governo não resolve determinados problemas que afectam a população porque tem medo dos interesses instalados. A candidatura à Assembleia Legislativa pela Associação de Novo Macau e a importância da língua portuguesa foram outros dos temas abordados pelo director do Observatório de Macau.
O CLARIM – Organizou no passado Domingo um seminário que contou com a participação do cardeal Joseph Zen, de Hong Kong. Qual foi o objectivo?
PAUL CHAN WAI CHI – Em Novembro último participei numa palestra em Hong Kong sobre as relações sino-vaticanas. Julgo que é uma boa forma de sabermos mais sobre o assunto porque geralmente não há muito debate sobre determinados tópicos nesta diocese [de Macau]. Assim, pensou-se em organizar um evento de modo a convidar os fiéis a conhecer melhor este tipo de assuntos.
CL – O cardeal Zen é uma personalidade que tem causado alguma controvérsia em Hong Kong. Porquê o convite?
P.C.W.C. – Dado que o assunto [das relações entre a China e o Vaticano] é bastante controverso, e como o cardeal John Tong [bispo da diocese de Hong Kong] tem tendência para abordá-lo através da escrita, por via de cartas apostólicas ou de mensagens, o cardeal Zen está mais inclinado a interagir, falando com as pessoas de modo a partilhar as suas ideias. Daí que também tivesse constituído uma boa oportunidade para o convidar a falar sobre o tema em Macau.
CL – Qual o futuro das relações entre a China e o Vaticano?
P.C.W.C. – Tal como disse no seminário, julgo pessoalmente que não devo estar pessimista, nem optimista, porque [o que acontecer] é mais fruto de um plano de Deus. Contudo, é necessário haver um esforço durante todo este processo e saber o que é bom.
CL – Pode a “questão de Taiwan” ter alguma influência?
P.C.W.C. – Penso que Taiwan compreende plenamente o que está em preparação e qual será o futuro das relações sino-vaticanas. Por outro lado, não é apropriado misturar política com as relações sino-vaticanas. O facto do Vaticano reconhecer Taiwan, ou a China, já é um assunto político. Por isso, não é apropriado falar-se de questões políticas neste tipo de relações.
CL – Foi deputado entre 2009 e 2013. Vai ser candidato às legislativas do corrente ano?
P.C.W.C. – Quero encorajar a população de Macau a estar envolvida na política. Eu próprio vou candidatar-me a um assento na Assembleia Legislativa.
CL – Por qual plataforma política e em que lugar da lista?
P.C.W.C. – Será pela Associação de Novo Macau. Quanto ao lugar, deixo que os responsáveis decidam.
CL – Que expectativas tem para as legislativas?
P.C.W.C. – Espero que as pessoas de Macau possam ter mais interesse pela política, em vez de não quererem saber ou de serem demasiado sensíveis em relação ao tema.
CL – E que avaliação faz à prestação do actual Governo da RAEM?
P.C.W.C. – Este Governo tem feito um trabalho muito bom a nível económico, mas peca por falta de inovação. Por exemplo, os activos ainda continuam nas mãos dos monopólios.
CL – Qual é a área mais crítica do Governo?
P.C.W.C. – É o conservadorismo. Por exemplo, quanto ao problema da habitação, o Governo tem o devido equipamento para fazer muito melhor, mas não tem feito o necessário. O Governo não actua sobre determinados problemas porque tem medo dos interesses que lucram com esses problemas.
CL – O sistema e as oligarquias continuam a minar a sociedade de Macau. Concorda?
P.C.W.C. – O relacionamento na sociedade em Macau é muito próximo e os recursos estão nas mãos de algumas pessoas que por sua vez alteram a sociedade. É realmente necessário haver o crescimento cívico de toda a sociedade. Tudo depende se queremos ou não a mudança. E se nós, enquanto “gentes de Macau”, estamos satisfeitos com as nove mil patacas que todos os anos recebemos do Governo. Como pessoa experiente e como católico, julgo que tenho a responsabilidade de contribuir para uma sociedade mais justa e com melhor justiça. Devemos viver num mundo e num lugar novo, em vez de estarmos encurralados. Tal como fez o doutor Sun Yat-sen em Hong Kong e Macau, onde apoiou várias causas para melhorar a vida das pessoas.
CL – A língua portuguesa ainda é importante ou irá desaparecer com o tempo?
P.C.W.C. – Uma das principais características de Macau é o cruzamento entre as culturas portuguesa e chinesa. Por isso, a cultura portuguesa tem grande influência e impacto em Macau. É preciso apoiar [a língua portuguesa] para uso futuro.
CL – É director do Observatório de Macau, em língua chinesa. Quer falar um pouco do projecto?
P.C.W.C. – Foi um grupo de fiéis que começou com o jornal, que ao longo dos anos já preencheu o requisito de ter o subsídio do Governo, mas que é independente em termos económicos e financeiros. [A publicação] conta com o apoio de fiéis e de algumas pessoas da sociedade. A grande diferença entre o Observatório e O CLARIM é que nós somos independentes da diocese de Macau.
PEDRO DANIEL OLIVEIRA
com Jasmin Yiu