PADRE ALBERTO ROSSA, CMF, FUNDADOR DA PASTORAL BIBLE FOUNDATION

PADRE ALBERTO ROSSA, CMF, FUNDADOR DA PASTORAL BIBLE FOUNDATION

«Este ano vamos imprimir mais de um milhão de Bíblias na China»

Nascido na Argentina, o padre Alberto Rossa revolucionou há um quarto de século a forma como a Palavra de Deus chega às pessoas. A criação, nas Filipinas, em 1999, da Fundação para a Pastoral Bíblica ajudou a levar a mensagem da Bíblia a milhões de pessoas em regiões como a Ásia Oriental ou a América Latina. A organização, parte do universo dos Missionários Claretianos, já publicou milhões de exemplares da Bíblia e de outras publicações centradas no Evangelho em quase trinta línguas. O padre Alberto Rossa, em entrevista a’O CLARIM.

O CLARIM – Instituiu, há 25 anos, a Fundação para a Pastoral Bíblica. Como vê esta iniciativa, um quarto de século depois? Imaginava que pudesse crescer tanto como cresceu?

PADRE ALBERTO ROSSA – De modo algum. Comecei a partir do nada. De facto, entrei no mundo editorial há quarenta anos nas Filipinas, com diferentes publicações. Mas, depois, comecei a dedicar o meu tempo à tradução e publicação da Bíblia. Há 25 anos, em 1999, fundei a Pastoral Bible Foundation [Fundação para a Pastoral Bíblica] nas Filipinas. Pouco depois, vim para cá, para Macau. Passei dez anos em Macau e, agora, outros nove em Hong Kong. O nosso principal ministério é versar a Palavra de Deus numa linguagem que todos possam compreender, com comentários que possam reflectir ou conectar a vida de quem a lê com os textos sagrados. Publicamos a Bíblia em doze línguas diferentes. O nosso mais recente projecto é também um dos mais gratos. Estamos neste momento a imprimir o Antigo Testamento em Chinês. O Novo Testamento já foi publicado. O nosso objectivo é lançar no próximo ano uma nova tradução da Bíblia para Chinês moderno, directamente a partir das línguas originais. Estamos a fazer duas traduções diferentes: uma para a China continental, não apenas em caracteres simplificados, nas também na forma como falam. E estamos a fazer outra tradução em caracteres tradicionais. Já temos cerca de noventa por cento do trabalho terminado.

CL – Trata-se de uma tarefa titânica, tendo em conta que na região da Ásia Oriental o número de missionários claretianos não ultrapassa as três dezenas…

P.A.R. – Sim, somos muito poucos. Mas não se trata de apenas isto. Os nossos missionários estão nesta região, mas não estão apenas para este ministério. Este é somente um ministério mais entre a missão confiada aos claretianos. Conduzo praticamente sozinho essa tarefa com a ajuda de uma equipa de pessoas que estão na China e no estrangeiro. Estive há pouco com uma senhora que trabalha comigo há 33 anos. Também estamos a imprimir Bíblias para a América Latina. Enviamos para o Brasil meio milhão de exemplares todos os anos. Durante este ano vamos imprimir mais de um milhão de Bíblias na China. Da Bíblia e do “Diário Bíblico”. Para além disso, também publicamos em língua espanhola. Neste momento, estamos a trabalhar numa edição especial da Bíblia em Castelhano. Este trabalho está a ser conduzido com várias outras línguas, mas o nosso principal foco passa por terminar a nova edição da Bíblia em Chinês de que lhe falava.

CL – Não é propriamente fácil traduzir a Bíblia para Chinês. Quais são os principais desafios a que é necessário dar resposta?

P.A.R. – Não, não é fácil. Antes de qualquer outra coisa, temos de recorrer às línguas originais. Ou seja, temos de trabalhar com académicos chineses que compreendem e conseguem ler Hebreu e Grego. Depois de estes académicos terminarem um rascunho das traduções, o texto é submetido a uma equipa de editores chineses, situados na China e no exterior. Eles revêem o trabalho, lêem a tradução e depois tentam aplicar a toada literária que os chineses atribuem aos textos. Esta equipa, responsável pela edição, reenvia o texto para os tradutores originais e diz-lhes: “a tradução até pode ser aceitável, mas nós não compreendemos bem o texto em Chinês”. A tradução circula desta forma até que uma versão – que satisfaça ambas as partes – seja alcançada. Depois disto, contactamos a Conferência Episcopal, para pedir permissão para imprimir. Fomos recentemente alvo de uma importante bênção, porque há meia dúzia de dias foi-nos concedida autorização por parte das autoridades chineses, por parte de um Governo local na China, para imprimir parte da Bíblia e é exactamente isso que vamos fazer. Este é um dos desafios. Os outros desafios são partilhados com línguas como Português, Espanhol ou Inglês. Temos, por vezes, mais de vinte ou trinta Bíblias católicas, mas em Chinês temos apenas uma para os católicos, que foi publicada há sessenta anos. Ora, esta Bíblia está redigida num Chinês muito difícil, que as pessoas não compreendem verdadeiramente. Resumidamente, queremos cobrir uma área muito específica. Há três áreas no que toca ao ministério bíblico: uma é para académicos, traduções que os especialistas podem estudar e desenvolver de uma forma científica. É um texto muito difícil de compreender por parte das pessoas comuns. Há uma outra tradução da Bíblia, focada na Liturgia. E há depois uma terceira tradução, que apelidámos de pastoral, direccionada para todos. O nosso critério é exactamente esse: que um rapaz ou uma rapariga chinesa, de quinze anos, possa ler e compreender a Bíblia. Fazemos uso de uma linguagem simples, ainda que sem desvirtuar o original.

CL – Publicam também o “Daily Gospel” e edições comentadas da Bíblia. É algo bastante essencial para uma população que, de uma forma geral, não conhece aspectos básicos sobre a vida de Jesus, por exemplo…

P.A.R. – Exactamente. Essa foi uma das razões pelas quais eu comecei a publicar, em 1985, o “Diário Bíblico”. A partir de então começámos a publicar com regularidade o “Diário Bíblico” e o “Evangelho Diário”. Os dois títulos são publicados em 28 línguas. Todos os anos publicamos mais de um milhão de cópias. Além do mais, outras editoras, em particular de natureza católica, copiaram a ideia – Que Deus as abençoe! – e, neste momento, estamos a transmitir estas leituras diárias a um sem fim de pessoas. Agora, o [padre] Jijo está a fazer o mesmo, mas destinado às crianças. Por outro lado, ao longo dos últimos seis, sete anos, dediquei oitenta por cento do tempo à missão de evangelizar no mundo virtual. Publiquei mais de dois mil e 500 vídeos sobre o Evangelho, em cinco línguas. As pessoas deixaram de poder dizer que não têm acesso aos textos bíblicos. São muitos os jovens que preferem o telemóvel…

CL – É esse o futuro da Igreja? Durante séculos, a própria ideia de Igreja estava intimamente ligada a um edifício onde as pessoas se dirigiam para rezar a Deus. Este conceito alterou-se…

P.A.R. – Obviamente! As pessoas são a Igreja. Também trabalho numa paróquia, em Hong Kong, e apercebo-me que os catequistas, com imensa boa-vontade, estão a ensinar a catequese às crianças, mas o que lhes digo é que não estão verdadeiramente a transmitir a essência de Deus: “Vocês estão a ensinar doutrina; estão a ensinar dogmas. Esqueçam tudo isso. Têm de os ensinar a amar a Deus de forma incondicional primeiro”. Têm de os deixar sentir que Deus chega até eles. E só mais tarde é que lhes ensinamos os dogmas e moral e outras coisas. É uma mudança na forma como abordamos as pessoas. É necessário muito tempo, muita insistência, e exige da Igreja uma nova abordagem bíblica. A Igreja pediu que todas as actividades pastorais sejam animadas e conduzidas, tendo por base a Bíblia. Tudo aquilo que a Igreja oferece tem de ser alicerçado e centrado na palavra de Deus, em particular no Evangelho. E esse é o grande desafio, não apenas para os sacerdotes, mas também para catequistas e professores. É necessário que tudo tenha raízes no Evangelho. É essa a minha missão.

Marco Carvalho

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