«Somos bastante diferentes porque não separamos os muçulmanos, ortodoxos e protestantes».
A irmã Lishan Michael está há dois anos em Macau. Ainda com as lembranças do seu país frescas na memória, fala do importante papel desempenhado pela Igreja Católica na Etiópia, no que respeita à ajuda aos mais desfavorecidos e ao trabalho em conjunto com o Governo etíope para o fortalecimento da paz. A religiosa das Franciscanas Missionárias de Nossa Senhora desmistifica a ideia do País ser totalmente pobre e enaltece as relações pacíficas entre católicos e muçulmanos, sem esquecer a ajuda prestada pelos portugueses na protecção do Cristianismo em Terras do Preste João, no século XVI. Quanto a Macau, fala da experiência de aprender a língua de Camões.
O CLARIM – Ainda hoje, quando se fala da Etiópia, pensa-se num país muito pobre. Todavia, são vários os indicadores a revelar que se trata de uma economia em expansão. Qual das duas realidades é a mais correcta?
IRMÃ LISHAN MICHAEL – Antes era muito pobre, mas agora é um país desenvolvido se falarmos das grandes cidades, e não só da capital Addis Abeba. No entanto, ainda há pobreza nas áreas rurais.
CL – Em que medida a Igreja Católica tem contribuído para uma nova Etiópia?
I.L.M. – O papel da Igreja é muito importante nas áreas rurais. Ajuda os pobres que não têm nada, orando por eles e encorajando-os. Não é somente para que mantenham a sua fé, pois é também para tudo mais. Às vezes dá-lhes dinheiro e outras vezes constrói-lhes casas. Trabalha ainda com o Governo para o fortalecimento da paz e para dar melhor qualidade de vida às pessoas. Como se trata de um país pacífico e em desenvolvimento, a Igreja pode trabalhar para o povo.
CL – Embora a maioria da população seja cristã, os católicos estão em minoria. Ainda assim de que forma se diferenciam dos demais em termos de tradições e cultos?
I.L.M. – Somos bastante diferentes porque não separamos os muçulmanos, ortodoxos e protestantes. A Igreja Católica trata todos da mesma forma, independentemente da corrente cristã ou da religião que professam. O País é pacífico em termos religiosos. Os muçulmanos são muito pacíficos. Tratam os católicos da mesma forma como os tratamos. No entanto, há alguns problemas, especialmente com alguns ortodoxos que estão contra a religião católica.
CL – O seu país faz fronteira com vários Estados muçulmanos. Como têm as autoridades etíopes lidado com o flagelo do terrorismo?
I.L.M. – Tivemos algumas dificuldades no passado, mas agora somos um país pacífico. Há alguns problemas na Somália e no Quénia, mas são muito longe da Etiópia.
CL – O CLARIM sentiu bastante dificuldade em encontrar um religioso ou religiosa de África a trabalhar em Macau. Poder-se-á dizer que este continente está aquém do minimamente desejado também nas missões?
I.L.M. – Sim… Sim! Na verdade, nem sei a razão. Também me questiono. Talvez por ser um continente com muitas pessoas pobres que precisam de ajuda.
CL – Está há quantos anos em Macau? E por que veio?
I.L.M. – Estou cá há dois anos e fui enviada pela minha superiora na Etiópia para servir com as irmãs da minha congregação. Nunca tinha ouvido falar antes [deste território]. Nem sabia onde ficava no mapa. O meu espanto foi grande quando a minha superiora me falou de Macau.
CL – Em que consiste o seu trabalho no dia-a-dia?
I.L.M. – Como religiosas, trabalhamos na Etiópia em hospitais, igrejas, escolas e visitamos os doentes. Em Macau é mais ou menos igual. No meu caso ainda não comecei verdadeiramente a trabalhar. Estou na fase de preparação devido a questões linguísticas, pois ainda estou a aprender Português. No entanto, ajudo as irmãs [da congregação] que trabalham a nível paroquial ou vão ao hospital [visitar os doentes].
CL – Referiu que está a aprender Português. É uma língua difícil?
I.L.M. – Sim, é difícil! Anteriormente não tinha tido contacto com a língua portuguesa. É bastante difícil, especialmente a estrutura das frases. Agora estou a melhorar. Falo o básico: bom dia, boa tarde. Se alguém falar eu consigo entender. É mais fácil ouvir do que falar. Também consigo escrever, embora seja difícil.
CL – Tem conhecimento do papel desempenhado pelos portugueses na protecção do Cristianismo na Abissínia do século XVI?
I.L.M. – Sei um pouco de História. Está relacionada com a tentativa dos muçulmanos, que queriam islamizar o nosso território. Os portugueses impediram que isso acontecesse, prestando ajuda militar.
CL – Depois de Macau onde gostaria de continuar a sua missão evangelizadora?
I.L.M. – Quando tinha 25 anos vi as irmãs [da congregação] a trabalhar numa escola em Harar, onde eu vivia. Fiquei agradada e pedi para me juntar a elas. Entrei imediatamente na congregação e depois de concluir os meus estudos continuei com a parte espiritual. Na Etiópia temos doze comunidades [da congregação]. Destas, estive em oito comunidades, entre as quais a de Addis Abeba e de Nazret. Fui depois enviada para Macau, onde já estou há dois anos. Quanto ao futuro, não sei. Só Deus sabe (sorrisos).
PEDRO DANIEL OLIVEIRA
pedrodanielhk@hotmail.com