Com espírito de missão não há medo de crescer
O bispo D. Stephen Lee presidiu, a 1 de Maio, à Eucaristia do Jubileu dos 25 anos da igreja de São José Operário. O último grande templo católico construído no território foi erigido, em 1999 pela diocese de Macau, para servir de ponte para os católicos da China continental. Confiada aos Missionários Combonianos do Coração de Jesus, a Paróquia perseverou, ao longo do último quarto de século, na missão de evangelizar na China, mas também criou no populoso Bairro Iao Hon uma comunidade dinâmica e vibrante, que olha para o futuro com um inegável sentido de missão. O padre Carlos Malásquez, MCCJ, pároco da igreja de São José Operário, em entrevista a’O CLARIM.
O CLARIM – A paróquia de São José Operário celebrou, a 1 de Maio, a Festa do seu padroeiro, este ano com motivos adicionais de júbilo, pois a igreja foi erguida há 25 anos. Como é que a efeméride foi comemorada?
PADRE CARLOS MALÁSQUEZ – Bem, na verdade, concebemos um plano de celebrações que se prolonga ao longo de todo um ano. Definimos um conjunto de actividades para celebrar este 25.º aniversário, mas obviamente o momento central foi vivido a 1 de Maio, com a celebração de uma Eucaristia, presidida pelo bispo de Macau, D. Stephen Lee. Depois disso, estivemos reunidos para uma refeição num restaurante. As celebrações do 25.º aniversário começaram em Outubro último e estendem-se até ao final deste ano. A ideia era promover diferentes actividades ao longo deste ano para assinalar a efeméride. A próxima está agendada para o final de Julho e início de Agosto. Vamos realizar uma peregrinação a Taiwan.
CL – Porquê Taiwan?
P.C.M. – Esta peregrinação realiza-se também ao abrigo da celebração dos 25 anos da nossa presença aqui. Desde o início, esta paróquia foi confiada à nossa Congregação, aos Missionários Combonianos do Coração de Jesus. Parte da nossa peregrinação a Taiwan tem também por objectivo visitar as paróquias nas quais missionários da nossa Congregação estão a servir. Vamos visitar outras igrejas e outras paróquias, mas um dos principais objectivos é tomar o pulso à presença dos missionários combonianos em Taiwan. Fixámo-nos primeiro em Macau, mas logo no início algumas das pessoas que vieram para cá connosco foram enviadas para Taiwan para aprender Mandarim, tendo em vista o trabalho que planeávamos conduzir na China continental. Depois, aos poucos, foram-nos confiadas algumas igrejas em Taiwan e por lá permanecemos até agora.
CL – Um dos objectivos da criação desta paróquia, há 25 anos, foi exactamente o de olhar para o outro lado da fronteira, com o objectivo de evangelizar na China. Considera que essa vocação foi alcançada e que a diocese de Macau conseguiu construir uma ponte para os católicos do Continente?
P.C.M. – De certo modo, sim! A pandemia de Covid-19 acabou por afectar esse esforço e desde então não conseguimos relançar esse trabalho de evangelização, em particular o trabalho que era feito a partir da nossa paróquia. Dois dos membros da nossa Congregação falam Mandarim e estão em contacto com pessoas da China continental. Nos anos antes da pandemia, eram uma espécie de ponte entre a nossa paróquia e essas pessoas na China. Pelo menos duas ou três vezes por ano, conseguíamos levar membros da nossa paróquia ao Continente, graças aos contactos e às ligações desses missionários combonianos, que visitavam a China com regularidade. Mas, como referi, com a pandemia surgiram restrições às movimentações transfronteiriças e tornou-se mais difícil obter visto de entrada e esses laços que existiam acabaram, de certo modo, por se desvanecer. O que estamos agora a tentar fazer, para além da Missa em Mandarim que celebramos todas os sábados, é procurar atrair pessoas da China continental que vieram recentemente trabalhar para Macau ou que já se fixaram há algum tempo no território. Muitas das pessoas que assistem às missas, tanto em Mandarim como em Cantonense, são originalmente do Continente, em particular da Província de Fujian.
CL – A paroquia de São José Operário foi, de resto, a primeira a proporcionar aos fiéis a celebração da Eucaristia em Mandarim…
P.C.M. – Sim, foi a primeira e, até ao momento, tanto quanto sei, continua a ser a única. Houve algumas tentativas da parte de outras paróquias durante algum tempo, mas depois acabaram por ser abandonadas. Por isso, neste momento, é a única paróquia que oferece a Eucaristia em Mandarim.
CL – Em termos de serviço pastoral, que desafios se colocam aos missionários combonianos que trabalham nesta paróquia. Esta é uma zona da cidade onde vivem sobretudo famílias menos abastadas e muitos idosos. A Paróquia e a Igreja Católica são uma presença importante para a população que reside nesta zona do Iao Hon?
P.C.M. – Acredito que sim. Obviamente, não podemos dizer que alcançámos todos os objectivos a que nos propusemos. É preciso uma vida inteira para isso, mas acredito que a nossa presença teve uma influência visível. Basta ver a participação das pessoas nas nossas celebrações, em particular na Missa em Cantonense. São muitas as famílias que fazem questão de assistir à Eucaristia. Pai, mãe, filhos, avós, vemos sempre pessoas a participar em família. No passado Domingo, tivemos o Baptismo de uma senhora de noventa anos de idade. Os seus filhos já tinham recebido o Baptismo e ela, como vivia nesta área da nossa paróquia, decidiu ser baptizada. Teve cinco filhos, mas três deles já faleceram. Os dois filhos que sobreviveram estiveram presentes, bem como alguns dos seus netos e outros familiares. Este é um caso excepcional, mas não faltam casos de outras pessoas que participam na Eucaristia na companhia dos filhos. Vemos muitas famílias que se reúnem com esse intuito. Gostávamos de poder fazer mais, mas a realidade é o que é. Também tentamos ajudar algumas pessoas mais necessitadas, mas muito daquilo que fazemos é através de um grupo que se especializou na prestação deste tipo de serviços. Este grupo entra em contacto em particular com idosos que vivem sozinhos e com alguns outros que têm necessidades especiais. A ajuda que lhes estamos a tentar fazer chegar é no sentido de permitir que possam usufruir dos benefícios que o Governo de Macau oferece. Muitos deles são residentes de Macau que desconhecem alguns dos benefícios que podem obter do Governo. Nós ajudamo-los a candidatarem-se a essas ajudas, a deslocarem-se a diferentes departamentos do Governo para que possam obter o apoio a que têm direito. Sempre que esse apoio não cobre certas necessidades, tentamos também ajudar um pouco, sobretudo em termos financeiros. Por vezes compramos cupões aos supermercados. Não lhes oferecemos dinheiro, mas compramos esses cupões e oferecemos-lhos para que possam adquirir alimentos sempre que necessitarem.
CL – Quantas pessoas é que a Paróquia ajuda com esse esforço? Tem uma ideia?
P.C.M. – Neste momento, oito famílias. Já foram mais no passado, mas o número está a cair, precisamente por causa do apoio e dos benefícios que o Governo oferece. Mantemo-nos vigilantes, no sentido de perceber se há mais pessoas que necessitam de apoio e quando é esse o caso oferecemos-lhes ajuda. Por agora, são oito as famílias que estamos a ajudar.
CL – Há ainda a Catequese. Quantas crianças estão inscritas este ano?
P.C.M. – Na Catequese temos actualmente 83 crianças.
CL – O número tem vindo a crescer? Ou nem por isso?
P.C.M. – Sim, sim. O número de crianças na Catequese continua a crescer. Todos os anos temos, em certa medida, de rejeitar alguns candidatos por não termos espaço. Na verdade, não se trata apenas de espaço, mas também de falta de catequistas. Por agora, é esse o número que conseguimos gerir: temos entre oitenta a 85 crianças. O número continua a aumentar, mas dadas as nossas limitações temos de impor alguns limites.
CL – Dizia que logo quando a igreja de São José Operário foi construída, a Diocese entregou-a à Congregação Comboniana. O trabalho que desenvolvem na Paróquia é o aspecto mais importante da presença dos missionários combonianos em Macau?
P.C.M. – Na diocese de Macau, sim! Mas a nossa presença em Macau, nesta paróquia, como referia há pouco, também nos ajuda na missão de chegar aos católicos da China continental. Como lhe dizia, na nossa comunidade, somos neste momento quatro membros e dois deles estão mais envolvidos nos trabalhos da Paróquia e os dois restantes trabalham sobretudo com os católicos do Continente. Todos os quatro vivem aqui, na Paróquia, e acabam por conduzir também trabalho de natureza paroquial. Como lhe disse, os dois que falam Mandarim ajudam-nos com a Missa em Mandarim. Estão sempre envolvidos, ainda que tenham uma ligação mais próxima com a comunidade católica que fala Mandarim e com outros grupos. Por vezes, quando se deparam com algumas pessoas que mostram interesse em ser preparados para o Catecumenato, eles ensinam essas pessoas em Mandarim, para que eventualmente possam ser baptizadas. Normalmente, todos os anos temos pelo menos um falante de Mandarim que recebe os Sacramentos da iniciação. Para além do trabalho que desenvolvem na China continental, são eles também que preparam os candidatos ao Catecumenato.
CL – Podemos então concluir que a decisão tomada pela diocese de Macau, há 25 anos, de construir uma igreja nesta parte da cidade está hoje mais do que justificada…
P.C.M. – Acredito que sim. Penso que a nossa presença aqui, em particular para nós, os missionários combonianos, tem um grande significado. Temos visto um grande crescimento, não apenas em termos quantitativos, mas também nos que se afirmam como convictamente católicos. Num dos últimos encontros que tive com alguns dos membros da nossa comunidade, deparei-me com aquilo que foi para mim uma grande surpresa, até porque foi algo que foi trazido por eles para o debate. Já no passado tinha havido alguma especulação entre nós, os sacerdotes, mas não estava à espera que fossem eles a colocar essa questão sobre a mesa. E que questão é essa? A determinada altura, alguém puxou a conversa para a Zona A, que está a ser construída, e foram os próprios membros e líderes do grupo que fizeram questão de dizer: «– A Zona A é para a nossa paróquia. Temos de para lá ir em missão». Como dizia, foi para mim uma surpresa que esta preocupação tenha sido abordada por eles. Entre os missionários combonianos já havíamos abordado essa possibilidade, apesar de não sabermos ao certo a que paróquia vai pertencer ou se o Senhor Bispo poderá ou não confiar esta nova zona à Paróquia. Mas tem todo um outro significado ouvir as pessoas expressarem esse desejo de serviço, esse desejo de missão. Pessoalmente, parece-me que não é nada mais, nada menos, que o fruto da nossa presença aqui, de instilarmos às pessoas esse espírito missionário e essa identidade como católicos, como povo de Deus. É muito bonito ouvir este tipo de coisas da boca das pessoas.
CL – A decisão, como dizia, ainda não foi tomada pela Diocese, mas para si e para a Missão Comboniana seria um bom desafio, este de ver a Paróquia crescer?
P.C.M. – Seria, obviamente, um desafio, mas tendo-me deparado com esta reacção, tendo partido a iniciativa das próprias pessoas, acredito que possa contar com eles para levar essa missão a bom porto. Não é um trabalho que iremos conduzir sozinhos. Sei que podemos contar com eles e com a ajuda deles e, como tal, acredito que esse alargamento é algo viável. No início, quando aqui chegámos, há mais de 25 anos, ainda a igreja não tinha sido construída; começámos por trabalhar numa loja, naquela zona do Centro Pastoral. A comunidade tem vindo a crescer lentamente, mas com firmeza desde então. Que os nossos paroquianos se mostrem disponíveis para fazer o mesmo na Zona A, se a Diocese decidir confiar aquela área ao nosso cuidado, é por si só uma graça. É uma graça que a iniciativa tenha partido das pessoas, que se tenham disponibilizado para esse desígnio e para essa missão. Da nossa parte, da parte dos missionários combonianos, talvez seja necessário investir um pouco mais em termos de recursos humanos, mas ao mesmo tempo é bom saber que podemos contar com as pessoas. Elas estão disponíveis para ajudar e para nós isso é uma grande vantagem.
Marco Carvalho