AGNES WONG

AGNES WONG, DIRECTORA DO CENTRO DE CULTURA E ARTES PERFORMATIVAS CARDEAL NEWMAN DE MACAU

«A ideia de que o “coração ao coração fala” é a forma mais directa e sincera de comunicação»

“O coração ao coração fala”. O lema do Cardeal D. John Henry Newman, canonizado em Outubro de 2019, dá o mote não só à primeira grande exposição organizada pelo centro cultural homónimo, mas também ao próprio modus operandida mais recente aposta da diocese de Macau. O novo espaço foi formalmente inaugurado no início do mês com o propósito de servir de plataforma ao diálogo e a uma maior compreensão mútua entre as diferentes comunidades e credos que têm Macau como casa. Agnes Wong, directora do Centro de Cultura e Artes Performativas Cardeal Newman de Macau, em entrevista a’O CLARIM.

CL– Este é um projecto relativamente recente, que corresponde a uma forte aposta por parte da diocese de Macau. De onde surgiu a ideia para criar o Centro de Cultura e Artes Performativas Cardeal Newman de Macau?

AGNES WONG– O Centro de Cultura e Artes Performativas Cardeal Newman de Macau é um espaço cultural e artístico que pertence à diocese de Macau e que tem por objectivo dar a conhecer a arte e as performances artísticas criadas por pessoas de Macau. Outro dos propósitos do Centro é de aproximar as pessoas através da arte e de performances artísticas, com o propósito de concretizar o mote do Cardeal Newman, de que “o coração ao coração fala”. Tem ainda por objectivo reunir, através da arte, pessoas com diferentes percursos, de diferentes fés e de diferentes quadrantes da sociedade com o intuito de alcançar uma maior compreensão mútua. Temos a esperança de que este centro de artes possa providenciar uma plataforma para que as pessoas de Macau troquem diferentes ideias do ponto de vista cultural e contribua para que algumas lacunas em termos de comunicação sejam superadas. Ao mesmo tempo, através das actividades que organiza, espera ajudar a construir vínculos de confiança, de amizade, de amor e de respeito mútuo na nossa comunidade.

CL– O Centro ostenta o nome de John Henry Newman. Por que razão este santo inglês foi escolhido como seu patrono?

A.W.– Baptizámos o nosso Centro com o nome do Cardeal Newman porque este santo inglês demonstrou, ao longo da vida, uma fé, um carácter e uma capacidade de entendimento excepcional. É alguém que continua a ter grande influência hoje em dia. Foi um teólogo, filósofo, educador e Doutor da Igreja, tendo sido canonizado a 9 de Outubro de 2019. Era, originalmente, um membro do clero anglicano, mas acabou por se converter ao Catolicismo. A sua sabedoria era profunda, sendo alguém muito influente. O nosso bispo, D. Stephen Lee, admira o Cardeal Newman por causa da sua virtude. Pessoalmente, devo dizer que o seu lema – “o coração ao coração fala” – é algo que me atrai profundamente. Lembro-me de uma conversa que tive com o padre Lau Wai Kit em que ele me dizia que admirava a devoção à fé do Cardeal Newman. O que me parece é que as pessoas necessitam que lhes falem ao coração. A ideia de que o coração fala ao coração também é muito útil em termos de evangelização. Apesar de o Cardeal Newman ter vivido em tempos muito diferentes, o seu lema é muito pragmático e realista, e mostra-nos a beleza da fé em toda a sua plenitude. E através do recurso à arte podemos expressar toda essa beleza na perfeição.

CL– O Centro foi formalmente inaugurado no início do ano com uma exposição que vai buscar inspiração exactamente ao lema adoptado por São John Henry Newman, “Cor ad Cord Loquitor”…

A.W.– A exposição reúne 35 trabalhos de 23 artistas, entre os quais cinco escultores. Criaram peças tendo por base o lema “o coração ao coração fala”. Cada artista tem as suas próprias experiências, as suas próprias capacidades, as suas próprias paixões. O que lhes pedimos foi que concebessem a sua própria interpretação do lema. Entre estes artistas estão representantes de diferentes credos ou mesmo ateus, o que faz com que os trabalhos sejam muito diversos. Dessa forma todos podemos aprender com o ponto de vista dos outros. É esse o objectivo da nossa exposição.

CL– Em termos de actividades, para além de exposições, que outras iniciativas culturais tenciona o Centro Newman promover?

A.W.– O Centro Newman vai acolher não só exposições de arte, mas também seminários, acções de formação e grupos de estudo. Por outro lado, vamos ainda promover o lançamento de novos livros em parceria com outros grupos e associações de Macau. Também vamos patrocinar o lançamento de novas obras. Esperamos, em 2021, poder organizar alguns concertos e projectar alguns filmes no nosso auditório, mas ainda não definimos uma data para estas actividades.

CL– O que está previsto para os próximos meses?

A.W.– Depois desta exposição? Temos o Ano Novo Lunar quase à porta e convidámos um mestre de caligrafia muito famoso, Choi Chuen-hing, para escrever votos de Ano Novo para os cidadãos de Macau. Logo após o Ano Novo, vamos promover uma exposição de caligrafia. Depois destas duas iniciativas, tencionamos definir e anunciar o plano de actividades para o novo ano. Esperamos que as pessoas possam estar receptivas aos nossos projectos.

CL– O Centro está situado numa belíssimo edifício de grande valor patrimonial, extraordinariamente bem conservado. Este edifício é, por si só, uma boa razão para visitar as instalações?

A.W.– Absolutamente! Merece, sem dúvida, uma visita. O edifício foi construído em 1926. Ou seja, tem 94 anos. É um privilégio poder fazer uso de um edifício como este. A casa, que tem algumas características das mansões victorianas, pertence à Diocese e está cheia de detalhes arquitectónicos maravilhosos. Para além da influência ocidental, ostenta ainda influências da escola de arquitectura de “Linglam”. É um exemplo belíssimo da fusão de estilos ocidentais e orientais. No entanto, o seu significado histórico é ainda mais rico e mais profundo. Só de olhar para ele, percebemos que é uma obra de síntese entre o Oriente e o Ocidente. Em 1944, para celebrar a vida de John Kam-Yuen Mak, um jovem particularmente generoso e piedoso, a mansão foi baptizada como edifício Kam-Yuen. Com o passar do tempo, parece-me que o edifício completa a sua missão e o seu propósito. Este ano, dedicamos este edifício a outro santo – o cardeal John Henry Newman – e baptizámos o edifício com o seu nome. É uma admirável coincidência que estas duas personalidades se chamem John, mas é obra e graça da vontade de Deus.

CL– De que outras formas se manifesta a dimensão católica do Centro? A ideia é usar as instalações também para iniciativas de carácter religioso?

A.W.– Com a abertura do novo Centro, queremos deixar bem patente a ideia de que “o coração ao coração fala” é a forma mais directa e sincera de comunicação. Este tipo de comunicação leva à compreensão mútua, ao amor mútuo, à confiança e apoio. Esperamos que todos os cidadãos de Macau e não apenas os cristãos possam temporariamente encontrar conforto quando nos visitam. Esperamos que se possam livrar das pressões a que estão sujeitos e possam comungar connosco da alegria da arte. O nosso Centro vai continuar a oferecer diferentes tipos de actividades, incluindo iniciativas religiosas e outros projectos benéficos para o corpo, a mente e o espírito de quem vive em Macau.

Marco Carvalho

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