Ultrapassando todos os desejos

Sem mais choros

Na semana passada vimos que o inferno é fecharmo-nos definitivamente na nossa própria prisão, não permitindo assim a presença de nada nem ninguém junto a nós. O contrário disso é abrirmo-nos, deixarmos que sejamos preenchidos pela Fonte de tudo o que é verdadeiro, bom e bonito. A isso chamamos Paraíso.

Teólogos de entre vós poderão contestar esta definição, mas quando expliquei o que era o Paraíso às crianças disse-lhes que o Paraíso é alegria infinita – podiam brincar ao que quisessem durante o tempo que quisessem, e que as suas mãezinhas não lhes diriam “é tempo de ir para casa”. Simplesmente porque já estavam em Casa. E que eles seriam simplesmente inundados com alegria. Imaginemos um parque temático que se estenda até ao infinito. Fantástico! Eu penso que todos os santos no Paraíso possam estar a dizer todos a mesma coisa: “Nunca pensei que poderia ser tão bom!”.

Felicidade infinita e sem limites é algo que nunca poderá acontecer aqui na Terra. Nunca poderemos ter uma felicidade pura e imaculada aqui. Haverá sempre um laivo de tristeza em cada momento de alegria terrena. E a felicidade terrena nunca dura muito. São, como disse São Josémaria, como os fogos de artifício, que brilham e se extinguem – «mal começaram, e já estão acabados» (Caminho 753). Quando ainda era arcebispo de Buenos Aires, o cardeal D. Bergoglio (hoje o Papa Francisco) disse uma vez aos seus fiéis: «Se um político vos prometer o caminho do Paraíso, digam-lhe para se ir confessar».

O Paraíso não é exercício de publicidade barata. Aquele que o nos prometeu tem um bom registo de cumprir as suas promessas. Ele disse que morreria por nós, e realmente morreu por nós. Ele disse que ressuscitaria, e ressuscitou. Ele disse que todos quantos acolhessem a sua palavra encontrariam a vida eterna e, podem apostar, que encontrarão.

As palavras terrenas são insuficientes para descreverem o Paraíso. Quando duas pessoas falam sobre o Paraíso é como se um cego tentasse dizer a outro cego que cor é o “encarnado”. Ou como se um surdo a tentar explicar a outro surdo o sentido da palavra “polifonia”. As palavras simplesmente não têm o alcance necessário.

O “Catecismo da Igreja Católica” afirma que o Paraíso «está para lá da compreensão e de qualquer descrição».

«Nenhum olho viu, nem ouvido ouviu, nem o coração humano concebeu o que Deus preparou para aqueles que o amam» (Coríntios 2:9).

Mas existe uma explicação concisa que gosto de utilizar e de meditar sobre o seu significado. Essa definição resulta de citações em dois livros da Bíblia. O Livro de Isaías (25:8) diz: «Ele eliminará a morte para sempre, e o Senhor DEUS limpará as lágrimas de todas as caras, e acabará com os agravos do seu povo em toda a Terra. Pois foi isso que o Senhor disse». E o livro da Revelação (21:4-5) usa praticamente as mesmas palavras: «Ele limpará cada lágrima dos seus olhos, e a morte não existirá mais, nem haverá mais lamentações, nem choros, nem dor, porque as coisas anteriores ter-se-ão esvaído. E Ele, o que se senta no Trono, disse: “Reparem, refiz todas as coisas”».

Acabam-se os choros! “Lágrimas” são situações que nos aborrecem, ou incomodam, causam-nos desconforto, tristeza, nervos, deprimem-nos, tornam-nos insatisfeitos, frustram-nos. Lágrimas são dores, mal estar, lamentos. Tudo isso serão coisas de um passado distante (e eu poderei dizer adeus ao meu problema de colesterol!).

O Papa Bento XVI, na sua Encíclica Spe Salvi, descreve o Paraíso como «o supremo momento de satisfação, assim como mergulhar num oceano de amor infinito, um momento no qual – o antes e o depois – já não existem, no qual, simplesmente, somos totalmente preenchidos de felicidade. Foi assim que Jesus se exprimiu no Evangelho de S. João: “Vê-los-ei de novo e os vossos corações rejubilarão, e ninguém tirar-vos-á a vossa felicidade” (16:22)».

S. Tomás de Aquino disse que isso ultrapassa o desejo humano, está para além de todas as expectativas do Homem. No Paraíso passamos de uma descoberta para outra, de surpresa em surpresa, a aventura total que nunca terá fim. Estar no Paraíso é estar com Deus, o Pai de todos os pais (Efesos 3:14-15). Se fores uma mãe ou pai, tenho a certeza de que quando o aniversário do vosso filho ou filha se avizinha vós gostaríeis de lhes proporcionar a melhor surpresa que os vossos ordenados pudessem comportar. Deus é infinitamente mais Pai e Mãe que todos os pais e mães juntos. Ele não tem problemas orçamentais. Ele é infinitamente magnânimo e prodigiosamente imaginativo nos seus presentes. Ele preparou delícias que manterão as suas crianças extremamente maravilhadas por toda a eternidade, que – como Peter Kreeft escreveu – nunca haverá tempo para o aborrecimento (de acordo com “Tudo o Que Sempre Quis Saber Sobre o Paraíso”).

Isso explica porque Jesus agradece a Deus, sempre que falava com Ele: «Agradeço-te, Pai».

Lição de Moral? O Paraíso vale todas as dificuldades… oh se vale. S. Paulo diz aos Romanos (8:18): «Considero que os sofrimentos dos momentos presentes não valem nem a comparação com a Glória que está para nos ser revelada».

E como nos qualificamos para entrar aí? O Catecismo pede-nos um requisito muito simples: «Aqueles que morrem na graça e amizade de Deus estão perfeitamente purificados para viver eternamente em Cristo».

Morrer na Graça de Deus significa estar consciente de não ter nenhum pecado mortal ou grave (cada pecado mortal é um “não” absoluto para Deus. É por essa razão que precisamos de nos confessar regular e frequentemente).

A Purificação consegue-se através de desilusões, circunstâncias desagradáveis, Cruzes que encontramos na nossa vida e que oferecemos a Deus (em lugar de nos ficarmos a lamentar do sucedido). Os Santos estavam profundamente conscientes do valor dessas “coisas más que acontecem a pessoas boas”. Isso explica a sua constante alegria mesmo no meio dos sofrimentos.

Nós também podemos escolher ser purificados no Purgatório (sobre o qual falaremos da próxima vez), mas, porquê esperar tanto?

É assim tão bom pensar no Paraíso, a todo o momento? Os atletas pensam sempre nas medalhas que desejam ganhar. Pessoas que se separam dos seus entes queridos pensam constantemente na pessoa de quem sentem saudades. Deus, nosso Pai, está tão desejoso de nos ver de volta a casa, que nós devíamos ter sempre saudades do Paraíso.

Pe. José Mario Mandía

jmomandia@gmail.com

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