Teologia, Uma Dentada de Cada Vez (21)

Há diferentes significados nas Escrituras?

 

“Na Sagrada Escritura, Deus fala ao homem à maneira dos homens. Portanto, para bem interpretar a Escritura, é necessário prestar atenção (1) ao que os autores realmente quiseram dizer, e (2) àquilo que aprouve a Deus manifestar-nos pelas palavras dos autores” (Catecismo da Igreja Católica, nº 109). A linguagem humana corrente envolve normalmente diferentes significados. Podemos esperar o mesmo da Sagrada Escritura. Como é que podemos estar seguros do significado ou sentido das passagens da Bíblia?

O ponto nº 115 do CIC diz-nos: “Segundo uma antiga tradição, podemos distinguir dois sentidos da Escritura: (1) o sentido literal e (2) o sentido espiritual, subdividindo-se este último em sentido (2a) anagórico, (2b) moral e (2c) anagógico”.

(1) O sentido literal “é expresso pelas palavras da Escritura e descoberto pela exegese, segundo as regras da interpretação correcta – ‘Omnes sensus (sc. Sacrae Scripturae) fundentur super litteralem’ – ‘Todos os sentidos (da Sagrada Escritura) fundamentam-se no literal’ (São Tomás de Aquino)” (CIC, nº 116).

Exegese? O que é? Exegese (em Grego, “exegeisthai”, interpretar ou explicar) é o esforço para interpretar ou explicar a Sagrada Escritura. Todos os que fazem esse trabalho são chamados de “exegetas”.

E quanto ao (2) sentido espiritual?

“Graças à unidade do desígnio de Deus, não só o texto da Escritura, mas também as realidades e acontecimentos de que fala podem ser sinais” (CIC, nº 117). Pessoas, coisas e eventos podem simbolizar realidades futuras de três formas:

Pelo (2a) sentido anagórico “podemos adquirir uma compreensão mais profunda dos acontecimentos, reconhecendo o seu significado em Cristo: por exemplo, a travessia do Mar Vermelho é um sinal da vitória de Cristo e, assim, do Baptismo” (I Coríntios 10:2). Na realidade, se fizermos um estudo aprofundado do Antigo Testamento, descobriremos muitas coisas, pessoas e acontecimentos da fé católica. Podemos recorrer ao Antigo Testamento para provar que a Igreja Católica é a religião que Deus preparou e estabeleceu.

(2b) Sentido moral – Os acontecimentos referidos na Escritura podem conduzir-nos a um comportamento justo. Foram escritos «para nossa instrução (I Coríntios 10:11; Hebreus 3:1 / 4:11)» (CIC, nº 117). A Bíblia não nos transmite apenas ideias para nossa compreensão. Ela move-nos para a acção. Diz-nos o que devemos fazer.

(2c) Sentido anagógico – Podemos ver realidades e acontecimentos no seu significado eterno, o qual nos conduz (em Grego, “anagoge”) em direcção à nossa Pátria. Assim, «a Igreja terrestre é sinal da Jerusalém celeste (Revelação 21:1 / 22:5)» (CIC, nº 117). A Bíblia relembra-nos constantemente que a nossa morada não é desde mundo fugaz, mas da vida após a morte.

Os exegetas têm que ter estes significados em conta, ao explicarem a Sagrada Escritura. O CIC (nº 119), ao citar a “Dei Verbum” (“Palavra de Deus”), refere: “Cabe aos exegetas trabalhar, de harmonia com estas regras, por entenderem e exporem mais profundamente o sentido da Sagrada Escritura, para que, mercê deste estudo, de algum modo preparatório, amadureçam o juízo da Igreja. Com efeito, tudo quanto diz respeito à interpretação da Escritura está sujeito ao juízo último da Igreja, que tem o divino mandato e o ministério de guardar e interpretar a Palavra de Deus” (“Dei Verbum”, 12, nº 3).

O Catecismo da Igreja Católica adiciona algumas palavras de Santo Agostinho: “Ego vero Evangelio non crederem, nisi me catholicae Ecclesiae commoveret auctoritas” – “Quanto a mim, não acreditaria no Evangelho se não me movesse a isso a autoridade da Igreja Católica” (Santo Agostinho, “Contra epistolam Manichaei” – “Contra a Carta de Maquiavel”).

Pe. José Mario Mandía

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