Santíssima Trindade: Casa do Amor
Neste Domingo celebramos a Solenidade da Santíssima Trindade. Podemos dizer que a Trindade é a Casa do amor. Pelo seu transbordamento, o mundo torna-se morada divina e o Ser Humano é criado como o seu hóspede de maior dignidade. Contudo, devido à sua natural limitação e por ter livremente pecado, ele viveu parcialmente distante da comunhão trinitária. Mesmo assim, Deus não o abandonou, manifestando-lhe a Sua graça de diferentes formas até a redenção ser plenamente realizada na vida salvífica de Jesus Cristo.
No Evangelho de hoje, Jesus promete que Ele enviará o Espírito Santo para ensinar-nos toda a verdade. Isto mostra que não podemos ter acesso à plenitude da verdade e nem conhecer profundamente a nós mesmos sem o auxílio da Trindade. Tal deve-se ao facto do Ser Humano não ser auto-referido. A criação e a sua existência são incompreensíveis sem a Trindade: “o mistério em grau mais elevado, o mistério por excelência” (cardeal D. Joseph Ratzinger). Fundamentando-se na Escritura e na Tradição da Igreja, este mistério pode ser chamado de “amor”. Como quem ama deve amar algo ou alguém, a própria lógica do amor exige que – na vida divina – haja pluralidade, autoridade, comunicação, reciprocidade, ou seja, não se trata apenas de um dom de si mesmo, como um espelho que reflecte a sua própria imagem, mas antes de um dom em si que, tal como o vidro, permite que o raio de luz a atravesse.
A relação trinitária orientada pelo amor, que une as pessoas divinas abarcando-as completamente em movimento de reciprocidade, em que nenhuma delas guarda nada para si, é tradicionalmente conhecida como “pericoresis” (pericorese): Casa do Amor. Apesar do termo não ser comum, a relação entre as pessoas divinas pode ser comparada à acolhida e dinamicidade de uma casa, a Casa do Amor. A partir desta realidade, é possível compreender que o Pai é determinado por si mesmo e pela relação com o Filho e o Espírito Santo: o Filho e o Espírito, por seu lado, são determinados pelo Pai e caracterizados pela sua relação com Ele (J. Moltmann). Apesar das três Pessoas trinitárias serem diferentes, Elas são inseparáveis.
Sendo pessoal e unificador, o amor divino – eterno, infinito, perfeito – não é fechado e egoísta, mas torna-se visível. Prova disso é a capacidade de criação e dinamicidade do Espírito Santo que leva a Casa do Amor a sair de Si. É Ele quem suscita outras diferenças. Em outras palavras, Ele é “abertura da comunhão divina para aquilo que não é divino (…) é o êxtase de Deus para o seu outro: a criatura” (Bruno Forte). Assim, Deus, que interage amorosamente de forma imanente (interior), é fonte de vida compartilhada, que não se fecha em si mesmo. Esse acto de partilha e transbordamento do amor divino dá-se no acto da criação. Os Padres da Igreja chegam a afirmar que esta obra trinitária da criação pode ser vista no desejo e iniciativa do Pai, sendo realizada pelo Filho e tendo o seu dinamismo e beleza como obra do Espírito Santo. Analogicamente é como se o Pai fosse o arquitecto, o Filho o executor, pedreiro, e o Espírito Santo o designer.
A obra Trinitária continua presente na História. No Antigo Testamento vemos a acção mais especifica do Pai enviando e suscitando a missão dos profetas. No início do Novo Testamento o Filho torna-se humano para redimir a Humanidade e trazer a revelação plena de Deus. Após a Sua Ascenção, em Pentecostes, tal como celebrámos no último Domingo, iniciamos o tempo do Espírito Santo, onde a Igreja é enviada ao mundo com a missão de evangelizar e proteger a depósito da fé, revelado na Sua plenitude pelo Filho.
Tudo faz sentido na nossa vida, ao verificarmos que a nossa salvação também se dará com a acção das três Pessoas divinas. Nós viemos do Pai e voltaremos para o Pai. Daí que tenhamos como modelo perfeito o Filho. Naturalmente, segui-Lo e tornar-nos como Ele é algo exigente. Para isso temos o Espírito Santo, amor entre o Pai e o Filho, que através dos Seus dons e carismas nos conduzirá para o conhecimento de toda a verdade e nos sustentará nos momentos mais desafiadores.
Rezemos para que nos tornemos como vidro e permitamos que o Espírito Santo de Deus entre nos nossos corações; e aí ilumine o Amor de Deus que já está dentro de nós.
Pe. Daniel Ribeiro, SCJ