Rota dos 500 Anos

Natal é em Suffisant

Uma semana se passou no ancoradouro de Spanish Waters, aqui em Curaçao, sem que muito tenha sido feito no que respeita a preparativos para as próximas etapas.

O veleiro, que aparentava estar em boas condições, revelou problemas no motor, que de uma forma ou de outra eram já esperados, pois o mesmo aconteceu em 2016. Tal obrigou-nos a fazer o percurso entre a capital de Curaçao, Willemstad, e a lagoa de Spanish Waters – são cerca de dez milhas – sempre à vela contra o vento.

Assim que saímos do canal que dá acesso à marina, e entrámos em mar aberto, o motor aqueceu e “morreu”. Restou-nos hastear as velas e seguir em frente. Felizmente estava acompanhado, o que tornou tudo mais simples. A viagem deveria ter demorado pouco mais de uma hora, mas durou quase meio-dia. Por sorte, assim que entrámos no acesso à lagoa, o motor resolveu trabalhar outra vez. No entanto, apenas funcionou ao ralenti. Assim que acelerava, aquecia de novo!

De resto, voltei a lembrar-me que nas Caraíbas tudo decorre a um ritmo muito próprio. Chamam-lhe “island time”. Só passado quase uma semana de ter ancorado, consegui – finalmente – que um mecânico visse o motor. Veredicto: um vedante da cabeça do motor está partido e entrou água salgada nos pistons. Como por aqui tudo se faz devagar, depois de feita a encomenda ainda hão de vir as peças de Inglaterra – não fosse este um motor Perkins – e proceder-se-á à abertura e fecho do motor, o que levará uns bons dias. Se o trabalho ficar bem executado, temos motor para mais uns bons meses.

Problemas mecânicos à parte, tudo o resto está dentro do planeado. O Dee está habitável e com um ar bastante “respeitável”, tanto no interior como no exterior, pronto para receber o resto da tripulação em Dezembro. Se as condições técnicas e meteorológicas o permitirem, seguiremos todos rumo a Norte.

Entretanto, como tenho gozado algum tempo livre, venho colocando a conversa em dia com a comunidade luso-descendente. Como já referi várias vezes, ainda são alguns milhares de portugueses.

Dificilmente passa um dia em que não se vejam os tais descendentes dos primeiros madeirenses que aqui aportaram na década de trinta para trabalharem na refinaria da Shell. Além de ocuparem posições importantes no Governo, estão ligados a uma série de profissões. O mais recente que conheci trabalha na Napa Autoparts, uma conhecida cadeia americana de peças para automóveis. No meu melhor Espanhol, ou “portunhol”, perguntei-lhe o que queria, uma vez que estava a olhar para mim. Ele, fixando-me bem, respondeu-me em Português, sem que eu tivesse dado a entender que era lusitano. Fiquei depois a saber que era neto de um senhor da família Rodrigues, que conhecemos em 2016, aquando da nossa primeira passagem pela ilha.

Ainda relativamente à data principal do mês que se aproxima, o Natal, será a paróquia de Suffisant a conduzir as festividades, dado ser nesta paróquia que se encontra a mais famosa igreja da ilha, a de Nossa Senhora de Fátima. No passado dia 25 de Novembro celebrou-se o Cristo Rei, um acontecimento que aqui assume um papel muito importante e que contou com uma grande participação popular. Infelizmente apenas soube do evento depois deste se ter realizado. Certamente iremos ter a oportunidade de participar noutros, visto a congregação ser bastante activa.

Estou à espera da confirmação do pároco de Suffisant para uma entrevista em torno da comunidade católica da ilha de Curaçao, suas tradições, anseios e planos futuros. Antecipo que irá ser uma conversa bastante agradável e interessante. Pelo que me disseram, este padre gosta muito de dar a conhecer todo o trabalho que vem sendo realizado com o apoio de toda a comunidade.

De resto, nos últimos dias tem soprado muito vento. Não estando o motor a funcionar há sempre uma certa apreensão em saber se o veleiro está bem ancorado.

Claro está que nem tudo é mau, pois o vento faz com que as noites sejam amenas e sem mosquitos. Na marina onde estive anteriormente já desesperava com tanto mosquito e com o calor que não dava tréguas de dia e de noite.

Aqui bem perto, tenho a companhia de um senhor de 74 anos, suíço, que veleja sozinho e que havia conhecido na marina. Entretanto já foi embora, mas prometeu voltar dentro de dias. Neste tipo de circunstância fazem-se amizades muito rapidamente. A vida no mar torna as pessoas muito dependentes uma das outras. Por várias vezes saio da minha zona de conforto para ajudar pessoas de barcos à minha volta, assim como outros já o fizeram comigo sempre que foi necessário.

João Santos Gomes

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