SEGUIR A JESUS: Renúncia, Desapego, Cruz
Falar hoje na necessidade de uma vida ascética é geralmente considerado antiquado e medieval. Com o devido respeito para com outras opiniões, estou firmemente convencido de que uma vida bastante consumista e muito confortável contribui para uma vida cristã medíocre. Daí a nossa necessidade numa vida ascética de abnegação, desapego, simples – jejum e cruz – e de oração.
Falar da dimensão ascética da nossa vida é falar da nossa vida espiritual/moral, que antes se denominava como “vida ascética e mística”. O asceta conduz à vida mística, à íntima união amorosa com Deus, à santidade a que todos os cristãos são chamados. Isso leva, com certeza, à felicidade, aqui e no além.
Palavras sábias do filósofo Sócrates: “Como podemos chamar um homem de livre quando os seus prazeres o dominam?”. Para não se deixar levar pelas suas paixões e vícios, o Ser Humano precisa da ascese. Os cristãos, em particular, são convidados a seguir o caminho de Jesus, que disse: «Se alguém a mim quiser seguir, negue-se a si mesmo, tome cada dia a sua cruz e siga-me» (Lc., 9, 23; Mt., 16, 24; Mc., 8, 34).
“NEGUE-SE” –A abnegação é um elemento necessário do nosso comportamento enquanto seguidores de Jesus. São Paulo afirmou: «Todos os que competem nos jogos se submetem a um treinamento rigoroso (…). Esmurro o meu próprio corpo e faço dele meu escravo, para que, depois de haver pregado aos outros, eu mesmo não venha a ser reprovado» (1 Cor., 9, 25-27). Jesus explicou: «Em verdade, em verdade vos asseguro: todo aquele que pratica o pecado é escravo do pecado» (Jo., 8, 34).
A pessoa humana deve negar a si mesma. O que significa esta frase? “Pedro negou uma vez ao seu Senhor, ou seja, disse em relação a Jesus: «Eu não conheço este homem». Negar a nós mesmos é dizer: ‘Eu não me conheço’. É ignorar a própria existência de nós mesmos. É tratar o eu como se não existisse. Normalmente, tratamos de nós mesmos, como se o eu fosse, de longe, a coisa mais importante do mundo. Se quisermos seguir a Jesus, devemos esquecer que o eu existe” (W. Barclay). Meios úteis: desapego e um estilo de vida simples – jejum e cruz.
SER DESAPEGADO E VIVER DE FORMA SIMPLES –Para Eckhart, ser desapegado significa “viver entre as coisas, mas não nas coisas”. Daí a importância de uma vida ascética. Os “auxiliares” da vida ascética são as penitências tradicionais do cristão, ou seja, a oração que leva ao jejum, e o jejum que leva à esmola. Jejuar hoje? Sim. Se bem feito, é útil desapegar-se das coisas desnecessárias que pesam sobre a nossa alma e compartilhar algo com os pobres. Mas tal como a mortificação, o desapego e a renúncia, o jejum é um meio e não um fim: um meio para a aquisição das virtudes e a erradicação dos vícios. De facto, “o jejum… é exercido adequadamente para adquirirmos pureza de coração e corpo; para que as picadas da carne possam ser entorpecidas e a mente pacificada e reconciliada com o Criador”. No entanto, o jejum “quando é feito inoportunamente, arruína a alma” (Cassiano, Conferências). Numa palavra, o jejum, a mortificação e o ascetismo são bons meios se nos ajudam a amar – a amar mais.
Necessidade de um estilo de vida simples. Vamos «viver de maneira sensata, justa e piedosa» (Tito 2, 12). Para combater a atitude egoísta e consumista, o Patriarca Bartolomeu recomenda o ascetismo, ou seja, “aprender a dar, e não simplesmente renunciar. É um modo de amar, de passar pouco a pouco do que eu quero àquilo de que o mundo de Deus precisa. É libertação do medo, da avidez, da dependência” (Papa Francisco, Laudato Si’, 9).
A pessoa ética, o cristão, precisa viver um estilo de vida simples, que pratique e promova valores e virtudes genuínos. Entre os grandes valores encontrados nas religiões estão “a renúncia, o desapego, a humildade, a simplicidade e o silêncio” (São João Paulo II, Ecclesia in Asia, 23). Simplicidade: a essência da simplicidade, diz-nos a teóloga Leslie Hardin, “um foco no reino de Deus”: primeiro é o reino (Mt., 6, 33). A simplicidade ajuda-nos a alcançar a harmonia em nós mesmos: “O corpo sob o espírito e o espírito sob Deus” (Santo Agostinho).
TOME A SUA CRUZ DIARIAMENTE –A cruz de Cristo é uma fonte inesgotável de meditação contínua. Não é de admirar que para os santos – os verdadeiramente felizes –, quando vem a cruz, é o Senhor que vem! Assim, os santos não apenas carregaram a sua cruz pessoal com paciência e alegria, mas também ajudaram outros a carregarem as suas cruzes. Não vamos “dar” cruzes aos outros, mas ajudá-los a carregar compassivamente a sua pesada cruz.
Os santos gostam de contemplar Jesus na Cruz: Cristo, na cruz de São Damião, pediu a Francisco de Assis que restaurasse a Sua Igreja. São Tomás de Aquino, para quem a cruz é o exemplo de todas as virtudes, ouviu de Jesus crucificado na cruz estas palavras: “Tu escreveste bem de mim. O que vós quereis de mim?”. Depois desta visão, São Tomás parou de escrever e classificou tudo o que havia escrito como sendo “palha”. São João da Cruz ouviu, de uma pintura de Cristo carregando a cruz, que na ocasião contemplava, estas palavras: “Tu fizeste muito por mim, o que quereis de mim?”. O incomparável místico respondeu: Apenas sofrer e ser desprezado por vossa causa! Portanto, Kempis aconselha-nos: “Pratiquem mortificações diárias para que se possam aproximar espiritualmente do vosso salvador crucificado” (Imitação de Cristo).
SEGUIR A CRISTO –Por que negarmos a nós mesmos? Para quê um estilo de vida simples e desapegado? Para quê carregar a cruz pacientemente? Porque tudo isto nos ajuda imensamente a seguirmos verdadeiramente e com alegria a Cristo – a sermos felizes!
Seguir Jesus implica renunciarmos a nós mesmos. Exige que assumamos a nossa cruz pessoal: as provações e trabalhos quotidianos, as possíveis doenças, os fracassos, a morte na família… Implica, sobretudo, amar a Deus, a nós mesmos, ao próximo e à criação de Deus. Finalmente, sempre rezamos pela conversão contínua por meio da penitência. A oração ajuda-nos a encontrar e a seguir Jesus, que continua a dizer-nos: «Eu estarei permanentemente convosco, até ao fim dos tempos» (Mt., 28, 20).
Pe. Fausto Gomez, OP