Projecto “Macau GP Legends” corta a meta em Novembro

Mística retratada em acrílico.

O Grande Prémio de Macau, evento que conquistou há muito um lugar especial no panorama automobilístico internacional, é o tema central do projecto “MACAU GP LEGENDS”, da autoria do artista português João Saldanha, que será apresentado na RAEM por ocasião da 62º edição da singular prova desportiva. Aos leitores d’O CLARIM o artista explica a razão do projecto na primeira pessoa.

O que à primeira vista parece pouco óbvio, dado nunca ter visitado Macau, e apenas ter um contacto à distância através das ferramentas dos media que todos utilizamos, poderá enfim explicar-se pela ligação de um lisboeta, nascido em 1974, aos automóveis e às corridas; relação que encontra expressão maior na ilustração e pintura de automóveis clássicos e desportivos, contextualizados tanto pela sua componente estética e técnica da evolução do automóvel, como pela história do desporto motorizado feita de momentos especiais e apaixonantes.

 

PAIXÃO PELOS automóveis

Em Setembro de 1984 o Autódromo do Estoril recebia, pela primeira vez, o Grande Prémio de Portugal em Fórmula 1. Fui com o meu pai, tinha 10 anos. Nunca poderia imaginar que esse momento fosse tão revelador para a minha vida. Foi ali que começou a minha paixão pelos carros e pelas corridas.

Nesse primeiro ano nem chegámos a estar sentados em bancadas – na verdade elas nem existiam, nem eu precisava. A mim bastava-me estar no meio daqueles carros e do barulho ensurdecedor. A proximidade física com o lugar, sendo que morava em Cascais, e com as máquinas, tomou conta dos meus dias.

Um ano depois Ayrton Senna ganhava o seu primeiro Grande Prémio no Estoril e já eu tinha desenhado todos os modelos de Fórmula 1 da Ferrari que conseguira. Não me bastou ver os carros, tive de começar a desenhá-los.

A minha formação estética e artística progrediu muito por “culpa” dos carros e pelas belas “linhas italianas”. No liceu decidi seguir Artes.

Assim, e ainda por culpa destes primeiros desenhos, acabei naturalmente por me formar em Design de Equipamento pela Faculdade de Belas Artes de Lisboa.

Foi apenas depois de muitos anos em que experimentei diversas actividades profissionais, quase sempre ligadas ao design, mas também ao ensino, que senti a necessidade de voltar aos desenhos e aos carros. E foi assim que resolvi abraçar a actividade de ilustrador, de corpo inteiro, trabalhando para coleccionadores privados e expondo com regularidade em Portugal, perspectivando já oportunidades além fronteiras.

 

Porquê Macau?

Para além do facto de Macau ser uma referência para qualquer português, ligações familiares levaram-me recentemente a contactar mais de perto com esta realidade distante, sem no entanto ter alguma vez visitado o continente asiático. O Grande Prémio de Macau é um acontecimento único e os grandes nomes do automobilismo deixaram uma marca indelével ao competir no rápido e temível Circuito da Guia.

Depois de decidir embarcar nesta aventura pus em prática a minha curiosidade natural e o gosto pela documentação e rapidamente desenvolvi um fascínio por esta prova, seja porque alguns dos grandes pilotos da história do automobilismo começaram por se evidenciar ao competirem e – especialmente – após triunfarem em Macau, seja porque também reúne no mesmo evento várias categorias desportivas, como as motas ou a Fórmula 3.

Se Senna e Schumacher são os mais reconhecidos, Eduardo de Carvalho ou André Couto também são parte essencial do legado do Grande Prémio de Macau. Ao percorrer os mais de 60 anos de corridas é possível contar um capitulo único e muito particular da história do desporto automóvel, onde conviveram e convivem os automóveis de GT, os Fórmulas e as motas.

Contribui em muito para este fascínio o facto de ser uma corrida num circuito urbano em que as curvas e contracurvas, com secções muito rápidas e difíceis, se fazem pelo meio dos altos edifícios de uma cidade em constante crescimento.

O actual Campeão do Mundo de Fórmula 1, Lewis Hamilton, afirmou recentemente que considera o Circuito da Guia mais completo e mais emocionante que o mítico Circuito do Mónaco.

Por fim, o ambiente próprio de um pais da Ásia (corrida urbana com secções muito rápidas e perigosas) com as suas cores e texturas características do Oriente, o que torna este evento especial e que me motivou a cristalizar em pinturas originais.

Consequência natural da abordagem documental ao Grande Prémio de Macau é a possibilidade de, através das ilustrações, assistirmos à própria evolução de Macau, pela envolvência da pista que naturalmente enquadra os motivos principais: o automóvel e o piloto.

Assim, mais uma vez, são os carros que me guiam e orientam o caminho, levando-me pela primeira vez ao Oriente. É curioso pensar que assim como existiu em Cascais uma relação física entre o lugar e um evento mítico, como o Grande Prémio de Portugal, estou eu a caminho de um lugar igualmente histórico e lendário onde também é possível experimentar essa proximidade quase viciante com a emoção das corridas.

 

O Projecto “MACAU GP LEGENDS”

O projecto “MACAU GP LEGENDS” ganhou forma depois de um período de pesquisa, que naturalmente abarcou uma grande quantidade de informação (tanta quantos os anos de história desta corridas) e que finalmente se está a materializar numa série de pinturas em acrílico sobre tela, que reflectem momentos que para mim representam a herança fantástica que o Grande Prémio de Macau já deixou na história do desporto automóvel.

A apresentação terá lugar na RAEM, em Novembro, por ocasião da 62ª edição do GPM, estando o espaço da exposição ainda por definir, podendo inclusivamente ser itinerante, com passagem por locais emblemáticos da cidade. Mais informações em facebook.com/classiccarilustration

Para a Casa de Portugal está prevista a realização de dois workshops de Ilustração: um primeiro curso, entre 3 e 17 de Novembro, todas as terças e quintas-feiras, entre as 14:30 e as 17:30; e um segundo curso, nos dias 6, 7, 13 e 14 de Novembro, todas as sextas-feiras (das 18:30 às 21:30) e sábados (das 10:30 às 13:30).

 

AS TELAS

Eduardo Carvalho – 1954

É o ponto de partida do projecto e da história do Grande Prémio de Macau.

O português local Eduardo de Carvalho, aos comandos de um Triumph TR2, foi o primeiro vencedor, numa prova disputada a 31 de Outubro de 1954.

É possível ver na ilustração as construções características de Macau, onde o bambu serve de principal matéria-prima.

 

Hans Stuck – 1983

O alemão Hans-Joachim Stuck, piloto de Fórmula 1 entre os anos de 1974 e 1979, e vencedor do Campeonato Alemão de Turismos, correu várias vezes no Circuito da Guia, onde venceu por duas vezes, em 1980 e 1983, sempre em BMW.

A publicidade passa a ser, sobretudo a partir dos anos 80, uma marca distintiva muito forte e impressiva do Grande Prémio de Macau.

 

Ayrton Senna – 1983

Sem dúvida uma lenda do Grande Prémio de Macau, o piloto brasileiro Ayrton Senna da Silva aceitou participar na primeira corrida de Fórmula 3 no Circuito da Guia, já depois de ter ganho o Campeonato Britânico de Fórmula 3.

Tendo chegado na véspera do primeiro dia de treinos e desconhecendo por completo a pista, Senna conseguiu, mesmo assim, conquistar a pole-position, à frente de Roberto Guerrero, um piloto bem mais conhecedor do Circuito da Guia. Senna acabaria por se impor desde a primeira volta, relegando Guerrero para a segunda posição.

A curva do Hotel Lisboa é um dos marcos do Circuito da Guia com as suas típicas gaiolas.

 

Kevin Schwantz – 1988

O americano Kevin Schwantz correu na corrida de motos do Grande Prémio de Macau com a sua Suzuki, normalmente utilizada no Campeonato do Mundo de 500 cc. Schwantz venceu as duas mangas com relativo à vontade, e em 1993 acabaria por se sagrar Campeão do Mundo de 500 cc. Ficará para sempre na memória os cavalinhos com que brindava a assistência em plena corrida.

 

Michael Schumacher – 1990

O alemão Michael Schumacher acabara de vencer o Campeonato de Fórmula 3 do seu país e tinha como principal rival o finlandês Mikka Hakkinen. Tudo se iria decidir nas últimas voltas da segunda corrida, num dos episódios mais dramáticos da história do Grande Prémio de Macau: Schumacher liderava na penúltima volta mas tinha Hakkinnen colado na sua traseira. O finlândes arriscou a ultrapassagem mas acabou por embater em Schumacher, deitando tudo a perder. Viu o triunfo ir para o alemão, que mesmo com a asa traseira partida conseguiu chegar ao fim no primeiro lugar.

 

André Couto – 2000

André Couto tornou-se, em 2000, no primeiro – e até agora único – piloto local a ganhar o Grande Prémio de Macau de Fórmula 3. Depois de ter terminado a manga de qualificação em segundo lugar, na corrida decisiva não deixou escapar a vitória, naquele que foi um dos momentos mais importantes e emocionantes da sua carreira automobilística.

As cores dos correctores de Macau são já uma marca desta prova, mas também um sério aviso aos pilotos.

 

António Félix da Costa – 2012

Em 2012 apenas foram admitidos no Grande Prémio de Fórmula 3 pilotos que nesse ano tivessem competido num qualquer campeonato de Fórmula 3. Félix da Costa já tinha ascendido à World Series by Renault, o que o obrigou a fazer uma corrida extra num campeonato inglês secundário, que venceu com facilidade. Em Macau, onde já tinha competido em 2010 e 2011, com um sexto lugar como melhor resultado, começou por registar o melhor tempo nos treinos de qualificação e acabou mesmo por dominar as duas corridas tornando-se, assim, no primeiro piloto a correr com licença de Portugal – desde Eduardo de Carvalho, no longínquo ano de 1954 – a ganhar o Grande Prémio de Macau.

João Saldanha 

Designer

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