Por que razão teve a Europa o século XX que teve?

Por que razão teve a Europa o século XX que teve?

Por que razão um século que começou com previsões confiantes sobre uma humanidade em aperfeiçoamento, a caminho de novas realizações civilizacionais, produziu na Europa, no espaço de quatro décadas, duas guerras mundiais, três sistemas totalitários, uma Guerra Fria que quase se transformou numa catástrofe global, mares de sangue, montanhas de corpos, Auschwitz e o Gulag? Que aconteceu? Porquê?

Alexandre Soljenitsine, quando recebeu o prémio Templeton numa conferência em 1983, expôs a sua visão histórica do problema europeu: “As falhas da consciência humana, privada da sua dimensão divina, têm sido o factor determinante em todos os grandes crimes cometidos neste século. O primeiro foi a Primeira Guerra Mundial, e os nossos principais problemas actuais têm a ver com ela. A Primeira Guerra Mundial aconteceu numa época em que a europa – rica, a nadar em abundância – caiu numa fúria automutiladora que ainda não enfraqueceu e que, provavelmente, nunca enfraquecerá. A única explicação possível está no eclipse mental que afectou os líderes da Europa devido à perda de consciência de um Poder Supremo acima deles… Só a perda dessa instituição, que vem de Deus, pode ter permitido que o Ocidente tenha aceite calmamente, depois da Primeira Guerra Mundial, a agonia prolongada da Rússia, esventrada por um bando de canibais… O ocidente não percebeu que este foi, de facto, o início de um longo e desastroso processo para todo o mundo”1.

O triunfo do secularismo, da descristianização da Europa Ocidental, o mito duma sociedade laica e livre, aliados ao forte implementar dum humanismo ateu, criaram a ideia de que o homem moderno teria de ser radicalmente secular.

“Muitos veteranos da revolução de 1968, agora instalados nos parlamentos europeus, nas universidades, nos gabinetes e nos meios de comunicação social, continuaram a lutar por rasurar o Cristianismo, nomeadamente a nível da integração europeia. Mas espantosamente estes adultos incrédulos, assistiram estupefactos ao sucesso estrondoso da Jornadas Mundiais de Juventude, em plenas férias de verão, em Paris no ano 1997, em que cerca de 500 mil jovens participaram numa semana de reuniões, conversas e serviços religiosos, ouvindo o Papa João Paulo II, que não se cansou de lhes dizer que a santidade é possível na modernidade, a fé católica pode alimentar a sociedade livre (liberté), a dignidade humana (égalité) e a solidariedade (fraternité)”1.

Mas a História tem cambiantes inesperados, e à medida que muitos cristãos se afastavam da prática da cristã, milhões de outros mantinham viva a antiga tradição europeia de peregrinação a Fátima, a Lourdes, a Czestochowa, a Assis e muitos outros lugares de culto. Também novos movimentos renovadores da Igreja foram surgindo, como a comunidade ecuménica de Taizé, em França, o movimento católico Focolares, que ajudaram em silêncio a manter o Cristianismo vivo para lá da Cortina de Ferro, Comunhão e Libertação, Comunidade de Santo Egídio, Regnum Christi e muitos outros empenhados em levar a Europa a redescobrir as suas origens cristãs.

São tempos de esperança em que agora vivemos, o drama do humanismo ateu conduziu a uma total falta de humanismo. Um mundo secularizado é um mundo sem janelas, portas ou claraboias: um mundo claustrofóbico, em última análise sufocante. Uma cultura secularista, onde já não existem referências ao transcendente, põem em causa a liberdade e a democracia, destroem a dignidade do Ser Humano reduzindo-o a algo que não tem dimensão divina.

O humanismo cristão, uma nova compreensão da condição humana, será o caminho de salvação dum Ocidente abalado e corroído por estratégias de enfraquecimento no afastamento de Deus e de Cristo.

Uma cultura, uma civilização é tão grande quanto os ideais religiosos que a animem; a magnitude dos feitos culturais de um povo é determinada pelo alcance das suas aspirações espirituais, da grandeza da sua fé e da certeza de Deus na vida do Homem e na condução do rumo da História da Humanidade pelo Criador que jamais a abandonará.

Podem soprar ventos e tempestades, mas não estamos abandonados na barca. Porém urge pedir ajuda ao Senhor, porque não queremos perecer e sozinhos não nos salvaremos.

 1O CUBO E A CATEDRAL, de George Weigel

Susana Mexia 

Professora

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