Por que temos de nos confessar a um padre?
Quem lê os evangelhos sabe que Jesus tem três atitudes: anunciar o Reino, curar os doentes e perdoar os pecados. É frequente Jesus, ao curar os enfermos, dizer-lhes: «Foi a tua fé que te salvou, são-te perdoados os teus pecados» (Mt., 9,22; Lc., 7,50). Esta expressão de Jesus motivou críticas nos fariseus e até interrogações nas multidões que diziam: «Quem é este homem que perdoa pecados, uma vez que só Deus tem poder para perdoar?» (Lc., 5,21). Com o perdão, Jesus revelava mesmo que era o Filho de Deus. Porém, Jesus quis dar aos homens também esta missão, por isso a Pedro dizia: «Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja; tudo o que ligares na terra será ligado no céu; tudo o que desligares na terra será desligado no céu» (Mt., 16,18-19). As palavras “ligar” e “desligar” referem a relação com Deus que o pecado corta, mas que Pedro poderá restabelecer. É este o Mistério do Perdão confiado a Pedro. Mais tarde, no entardecer do Dia da Ressurreição, Jesus surpreendeu os discípulos reunidos no Cenáculo. Depois de eles confirmarem a sua Ressurreição, Jesus disse-lhes: «Recebei o Espírito Santo, aqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados; aqueles a quem os retiverdes ser-lhes-ão retidos» (Jo., 20,23). A Igreja, a partir da comunidade de Jerusalém, reconheceu a missão de perdoar pecados que Cristo confiou aos Apóstolos e estendeu aos presbíteros esse poder, exercido sempre em comunhão com o Bispo, sucessor dos Apóstolos.
A história do Sacramento do Perdão tem uma longa história. Nos primeiros três séculos apenas eram perdoados os pecados públicos, confessados na assembleia dos cristãos e perdoados pelo Bispo ou pelo seu representante. Nos séculos IV e V instituiu-se o sacramento individual. Estiveram desde o princípio quatro realidades: o penitente revelando as suas falhas sobretudo as graves; o presbítero com o poder que a Igreja lhe confere de perdoar em nome de Deus; o arrependimento para uma mudança de vida e, finalmente, a penitência especial – oração reparadora que revela a retoma da relação com Deus. Nos séculos seguintes, a reflexão teológica e pastoral consagrou a confissão individual feita por um cristão a um sacerdote para tal mandatado pelo Bispo. Esta prática, tendo ao longo dos séculos muitas formas de se celebrar foi finalmente consagrada pelo Concílio de Trento, tornando mais acessível o perdão de Deus. Finalmente, no Concílio Vaticano II, o Sacramento do Perdão recebeu um nome muito significativo – Sacramento da Reconciliação. Num diálogo de profunda intimidade com o sacerdote, o cristão reconcilia-se com Deus e com os irmãos, promovendo a sua total comunhão com a Igreja. Curiosamente, o Papa Francisco retomou na Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium” uma lindíssima definição do Sacramento do Perdão: “Não é uma câmara de tortura, é um maravilhoso encontro com a misericórdia de Deus” (“Evangelii Gaudium” nº 44). Este grande sacramento é um encontro de dois pecadores, o penitente e o sacerdote. Assim sendo, o sacerdote não condena ninguém. Acolhe, escuta, aconselha se necessário e concede o perdão de Deus. Ninguém julga ninguém. A misericórdia de Deus é para os dois, para o penitente e para o confessor.
O sacerdote não é um juiz. Recebeu de Cristo, pela Igreja e em comunhão com o seu Bispo, o poder de perdoar os pecados. O sacerdote deve revestir-se de uma profunda humildade, até porque quem lhe pede para o perdoar, às vezes, é menos pecador do que ele que perdoa. É isto o Mistério da Reconciliação. Muitas vezes há quem pergunte por que é que quem nos reconcilia com Deus, quem nos perdoa os pecados, é um sacerdote, que é um homem como nós. Simplesmente porque Jesus quis assim, ao confiar o perdão dos pecados aos Apóstolos e à Igreja, como maior dom do Espírito Santo. Por isto mesmo o Sacramento da Reconciliação não pode ser um peso; tem de ser fonte de alegria, porque numa relação aparentemente humana está o perdão de Deus.
Monsenhor Feytor Pinto
Família Cristã