Infiltração anticlerical e ideológica no ensino: quando uma geração começa a perverter outra
Conta-se uma antiga lenda acerca de um artesão muito habilidoso da Flandres a quem foram encomendadas duas estátuas, uma de cariz de religioso e outra de um herói da pátria. Ele aceitou a proposta confiando nas suas capacidades e na nobreza dos materiais que possuía. Habituado a embelezar jardins e palácios, não encontrou nenhum molde que se assemelhasse ao pedido. Mas pensou em utilizar a matriz de um cavalo, pensando que o trabalho e os materiais pudessem assemelhá-lo aos ilustres personagens pedidos. Encheu a forma de precioso bronze, mas, apesar dos apesares, a aparência final era de um cavalo. Experimentou a nobreza da prata, e desastre, em vão via surgir diante dos olhos outro cavalo. Por fim, achou que o ouro mais fino permitir-lhe-ia trabalhar os materiais para chegar ao herói e ao santo. Usou o mesmo molde de um cavalo, e cavalo foi o resultado final… Não adiantava mudar a matéria, se os moldes eram sempre os mesmos. Produziriam sempre o mesmo resultado. Com semelhante história, monsenhor Jean-Joseph Gaume, teólogo e ensaísta francês, alertava na segunda metade do século XIX para os moldes da nova educação republicana, que visava horizontalizar todos e moldar as crianças e adolescentes a um mesmo espírito anticlerical e laico. Qualquer que fosse a massa e a proveniência dos educandos, os mesmos livros e os mesmos programas, o mesmo ensino e os mesmos conteúdos visavam moldar uma nova humanidade, programada por aqueles mesmos que na sombra e nas trevas tramavam contra o trono e o altar. Sabemos que eles não se contentavam com regicídios e perseguições religiosas. Afonso Costa, por exemplo, ao pretender que em poucas gerações desaparecesse a fé em Portugal e surgissem homens e mulheres laicos até à medula, investia na educação para o laicismo. Tais moldes educativos fariam aparecer os iluminados que confiassem tão somente nas novas ciências, devotados ao novo regime, alienados em matéria religiosa.
Se não fossem os acontecimentos de Fátima, Papas corajosos e mártires cristãos, dois grandes Concílios e a educação de avós e pais para filhos e netos, além de uma multidão de religiosos, mosteiros e paróquias a educarem para a Fé, talvez muitos dos planos maquiavélicos tivessem ido mais longe no ateísmo e na irreligião. E estivéssemos pior do que estamos hoje, passado mais de um século. Entretanto, os planos não mudaram. A educação continua a seguir moldes anticlericais, muitas vezes com recurso a mentiras ou parcialidade histórica e filosófica, tal como comprovou a doutora Esther Mucznick que realizou uma pesquisa para a Comissão da Liberdade Religiosa que provou, entre outras coisas, estarem os manuais utilizados nas escolas cheios de conteúdos erróneos ou tendenciosos para criticar a Igreja Católica. E sendo a autora deste estudo uma judia, não podem acusá-la de parcialidade. Bastaria perguntar a qualquer jovem sem instrução religiosa o que ele pensa da fé ou da Igreja, e ele facilmente lembrará a inquisição e a dita reforma protestante, os abusos e gastos dos Papas da Renascença e aqueles que se metiam a mandar nos Reis, as perseguições aos judeus, os jesuítas e a velha mentira que estariam por detrás da tentativa de regicídio que permitiu ao tão elogiado Marquês de Pombal quase exterminá-los, a eles e alguns nobres, em fogueiras e torturas que superaram qualquer período da Inquisição em Portugal. Talvez um ou outro fale da idade das trevas, a tal Idade Média, onde a Igreja dominava as mentes. Tempos obscuros. Por fim, citarão as últimas notícias de um padre pedófilo, e este ou aquele professor que tem desviado os seus temas para umas tertúlias que acabam por denegrir a Igreja e os malandros dos padres. O tema pega sempre fogo em sala de aula. Em nenhum momento os alunos são formados ou informados que tudo o que somos e conquistámos, historicamente, devemos à fé de conquistadores e navegadores; livros de filósofos e matemáticos, entre tantos outros, chegaram até eles porque foram conservados e multiplicados em mosteiros; em matéria de direitos e igualdades fundamentais nenhum país não cristão chegou tão longe quanto o Ocidente à luz da cruz; não aprendem, enfim, que a educação, as escolas e universidades surgiram da Igreja, tal como os hospitais e as obras sócio-caritativas… até mesmo os monumentos que atraem tantos turistas vieram de tempos ditos das trevas, tempos em que a filosofia do Evangelho regia as nações.
Tempo houve em que a filosofia do Evangelho governava os Estados. Nessa época, a influência da sabedoria cristã e a sua virtude divina penetravam as leis, as instituições, os costumes dos povos, todas as categorias e todas as relações da sociedade civil. Então a religião instituída por Jesus Cristo, solidamente estabelecida no grau de dignidade que lhe é devido, em toda parte era florescente, graças ao favor dos príncipes e à proteção legítima dos magistrados. Então o sacerdócio e o império estavam ligados em si por uma feliz concórdia e pela permuta amistosa de bons ofícios. Organizada assim, a sociedade civil deu frutos superiores a toda expectativa, frutos cuja memória subsiste e subsistirá, consignada como está em inúmeros documentos que artifício algum dos adversários poderá corromper ou obscurecer (Leão XIII, Immortale Dei, nº 28).
Ao ler este artigo, muitos são aqueles que vão achar tudo isto um exagero, que a escola é laica e que apenas forma espíritos liberais, que a educação religiosa é para ser feita nas igrejas. Ou que o autor do artigo pouco sabe acerca do que se passa nos estabelecimentos de ensino, onde alguns professores até são católicos e vão à missa… Bom, responder-lhes-ia que a escola segue os tais manuais e programas, e já citei a opinião da autora judia que estudou esses livros. Eles são a prova concreta de uma educação tendenciosa. Ademais, os professores católicos não falam da sua fé para não ferirem a escola laica. Têm respeito humano. Bastaria contar que no Ensino Secundário tive um professor que era padre. Nunca se identificou. Os alunos descobriram quando outro professor, em tom de troça, revelou. Enquanto isso, os anticlericais não têm escrúpulos em levar a irreligião à sala de aula… A reforçar a minha posição está uma reunião, recente, de sacerdotes do centro de Portugal, onde se constatou que muitas crianças estavam a desistir da catequese e a perder a fé por causa de um ou outro professor que não está entre os que vão à missa (espero…) e que utilizavam as aulas para negar a existência de Deus e criticar a Igreja e os padres. Vários foram os participantes da reunião que apresentaram o mesmo problema nas suas paróquias. Os catequizandos andam a perder a fé nas escolas e, mais tarde, nas universidades. São também numerosos os pais que se dão conta disso mesmo e testemunham-nos este problema. Como se as instituições de ensino público não tivessem que respeitar o pluralismo e a fé dos homens. Transformaram-se em centros confessionais do ateísmo e do anticlericalismo, com ou sem culpa, pois o problema é que os professores foram educados nos mesmos moldes anticlericais com que agora educam (mesmo os que vão à Igreja). Uma forma de irreligião que implica que a escola deixe de ser laica para inculcar ideais positivistas e confessionais do ateísmo.
Outros erros moldam os futuros cidadãos, os educandos que futuramente educarão. Santo Agostinho, na sua obra acerca do Livre Arbítrio, era da tese que o erro não se ensina. Por isso, troco o termo educação por perversão. Perversões lavam o cérebro dos alunos, mesmo os mais pequenos. Envolvem as ideologias com que o Estado quer condicionar as mentes e os partidos extremistas com assento parlamentar e poder querem manipular as consciências. As ideologias, de género, feministas, laicistas, que envolvem a presente cultura de morte, contra a família, marxistas, maoistas e leninistas, que eram prato forte nas Faculdades de Ciências Sociais e Humanas e dominavam grupos e agremiações universitárias, debates e conferências nesses meios de novos prosélitos da esquerda radical, invadem agora os estabelecimentos de ensino dos mais novos, começando pelos que ainda gatinham. Não se pode esconder o Sol com a peneira. Várias instituições têm provado esta doutrinação com recurso aos próprios programas escolares. E um grupo parlamentar português levou mesmo ao Constitucional um pedido de averiguação acerca disto. Alguns países vivem condicionados há anos por uma educação que tem deformado e condicionado as mentes, prejudicando o próprio ensino e os “rankings” educativos. Na América do Sul começam agora a despertar e a exigir escolas sem partido. Um pai proveniente destes meios contava-me que veio para a Europa com a família ao saber que o filho, que tinha acabado de entrar na escolinha, chegava a casa a perguntar quem era Marx, de quem o seu professor tanto falava. Para lá caminhamos no Portugal de ideologias radicais com assento parlamentar e influência governativa. Simples, pegue no livro dos seus filhos e veja quantas críticas à Igreja e quantos alertas oportunos para o Nazismo no contexto da 2ª Guerra Mundial… Mas, onde estão entretanto as atrocidades do Comunismo que mataram muitos mais? Só no Holodomor, na Ucrânia Soviética, pereceram quase doze milhões. Um silêncio total, muito estranho, nas nossas escolas. Para não falar nos milhões da China de Mao Tsé-Tung, e no Camboja do Khmer Vermelho. A estimativa chega aos setenta milhões. E isto sem os números da fome, violência e repressão na Coreia do Norte, países da África, Cuba, Venezuela… Os manuais até falam da Guerra Colonial em África, mas silenciam as consequentes guerras civis entre radicais de esquerda que disputavam o poder e que ainda hoje governam instavelmente nações que estão entre as mais pobres do mundo e cujo minério foi entregue a outros países e não ao seu povo. Silenciamos que os armamentos empregues contra os portugueses eram russos, e que muitos mortos encontrados em batalha não eram negros, mas morenos e loiros. Mercenários comunistas do Leste e de Cuba que agradecem ao 25 de Abril, a Revolução que os ajudou a assumir as rédeas desses países africanos. Preparar os países para o seu direito à Independência deveria ser uma entrega do poder à soberania dos seus povos, e não ao perigoso colonialismo ideológico de esquerda.
Futuramente, não tenhamos dúvida que os extremistas que querem reescrever a história comecem a condenar veementemente o Colonialismo. Talvez não o façam plenamente enquanto a memória viva dos heróis que lá lutaram, e dos portugueses que lá trabalharam, esteja tão presente entre nós como fisicamente eles ainda estão. Entretanto, continuarão a silenciar a podridão das suas próprias ideologias, um silêncio por demais eloquente na educação, por tratarem-se de atrocidades e genocídios históricos que nunca se deveriam apagar da memória. Condenamos, e muito bem, a extrema-direita, e damos assento parlamentar à extrema-esquerda que cada vez mais cresce em votos. Não haverá um problema educativo em tudo isto?
Pe. José Victorino de Andrade
Sacerdote ao serviço do Santuário de Fátima