PAPA REVELA PREOCUPAÇÃO COM UMA IGREJA “ADORMECIDA” E LANÇA DESAFIO PARA 2022

PAPA REVELA PREOCUPAÇÃO COM UMA IGREJA “ADORMECIDA” E LANÇA DESAFIO PARA 2022

Recriar a viagem da fé, no redescobrir o desejo por Deus

Na Solenidade da Epifania do Senhor, popularmente conhecida como “Dia de Reis”, o Papa Francisco, na homilia que proferiu na Basílica de São Pedro, tomou o exemplo dos Magos para exortar os fiéis a um novo entusiasmo nos caminhos da fé. Aqueles, que no seu conforto do mundo se desprenderam de tudo para seguir a estrela, caminharam firmes na fé que os levaria ao menino Deus, o qual se havia feito presente entre os homens. Durante a homilia, o Santo Padre enviou uma mensagem à Igreja Universal, com base na crise de fé que assola os católicos. Devemos «recriar a viagem da fé, no redescobrir o desejo por Deus», disse.

No Vaticano, o Papa Francisco deu início à homília, recuperando o episódio da viagem dos Magos a Belém, para nos interpelar a caminhar para Jesus: «Porque é Ele a estrela polar que ilumina os céus da vida e orienta os passos para a verdadeira alegria». Recorrendo ao exemplo destes enigmáticos homens, sublinhou que os seus olhos não estão voltados para a terra, mas são janelas abertas para o Céu. Com esta imagem, concluiu com as palavras de Bento XVI, por este proferidas na homilia de 6 de Janeiro de 2013: Os Magos eram «pessoas de coração inquieto(…); homens à espera, que não se contentavam com os seus rendimentos assegurados e com uma posição social (…); eram indagadores de Deus».

CULTIVAR O DESEJO

Francisco interroga-se: «esta saudável inquietação, que os levou a peregrinar, donde nasce?» E dá a resposta: «nasce do desejo. Eis o seu segredo interior: saber desejar. Meditemos nisto». Nesta linha de pensamento, explicou que “desejar” significa manter vivo o fogo que arde dentro de nós e nos impele a buscar mais além do imediato, mais além das coisas visíveis: «Porque a vida não é “toda aqui”, é também “noutro lugar”». No desejo de levar os fiéis a mergulharem no Mistério da Vida, deu como exemplo uma tela em branco que precisa ser colorida. Para o efeito, citou Van Gogh, que um dia «escreveu que a necessidade de Deus o impelia a sair de noite para pintar as estrelas».

Segundo Francisco, o desejo é o grande motor que nos molda: «Podemos dizer, sem exagerar, que nós somos aquilo que desejamos».

CRISE DA FÉ

O Papa apontou o desaparecimento do desejo em termos Deus na nossa vida e nas nossas sociedades como um dos sintomas da crise da fé. Assim, de forma a que cada um se avalie a si mesmo, sugeriu fazermos um exercício de introspecção: «Perguntemo-nos: “como está a viagem da minha fé?”. É uma pergunta que hoje nos podemos colocar.(…)Está estacionada ou está em caminho? A fé, para partir uma vez e outra, precisa ser deflagrada pelo detonador do desejo». Neste âmbito, o Pontífice recuperou o momento principal da viagem dos Magos: tendo chegado ao destino, viram o Menino e «prostrando-se adoraram-No» (Mateus 2:11). E explicou: «adoram. Lembremo-nos disto: a viagem da fé só encontra ímpeto e cumprimento na presença de Deus. Só se recuperarmos o gosto da adoração é que se renova o desejo. O desejo leva-te à adoração e a adoração renova em ti o desejo. Porque o desejo de Deus cresce apenas permanecendo diante de Deus». Daí que tenha pedido aos presentes para que não esqueçam a Adoração em silêncio: «a oração de adoração que é pouco comum entre nós: adorar, em silêncio».

Na “receita” espiritual que “prescreveu”, o Papa deixou o incentivo para que procedamos, dia-a-dia, como os Magos: «Teremos a certeza de que, mesmo nas noites mais escuras, brilha uma estrela. É a estrela do Senhor, que vem cuidar da nossa frágil humanidade». E acrescentou: «o mundo espera dos crentes um renovado ímpeto para o Céu».

O QUE É A FÉ?

Na Audiência Geral de 24 de Outubro de 2012, o Papa Bento XVI questionou os crentes, no âmbito do “Ano da Fé” (2012-2013): «Gostaria de meditar convosco sobre uma questão fundamental: o que é a fé? Ainda tem sentido a fé, num mundo em que ciência e técnica abriram horizontes até há pouco tempo impensáveis? O que significa “crer”, hoje?» – um “hoje” que para o Papa emérito, «juntamente com tantos sinais de bem, aumenta ao nosso redor um certo deserto espiritual».

Na mesma ocasião, acentuou que no actual contexto sobressaem algumas interrogações fundamentais, que são muito mais concretas do que parecem à primeira vista: «que sentido tem viver? Há um futuro para o homem, para nós e para as novas gerações? Para que rumo orientar as opções da nossa liberdade, para um êxito bom e feliz da vida? O que nos espera além do limiar da morte?».

Na sua resposta à fé, o Pontífice apontou-nos um caminho: «É um entregar-se confiante a um “Tu”, que é Deus, o qual me confere uma certeza diversa, mas não menos sólida do que aquela que me deriva do cálculo exacto ou da ciência. A fé não é simples assentimento intelectual do homem a verdades particulares sobre Deus; é um gesto mediante o qual me confio livremente a um Deus que é Pai e que me ama; é adesão a um “Tu” que me dá esperança e confiança.(…)Com a atitude da criança, a qual sabe bem que todas as suas dificuldades, todos os seus problemas estão salvaguardados no “tu” da mãe».

Contudo, Bento XVI recordou que o Mistério da Fé é um dom de Deus e um «acto profundamente livre e humano», tendo citado o ponto 154 do Catecismo da Igreja Católica: “O acto de fé só é possível pela graça e pelos auxílios interiores do Espírito Santo. Mas não é menos verdade que crer é um acto autenticamente humano. Não é contrário nem à liberdade nem à inteligência do homem”.

Em jeito de “trabalho de casa” com vista à uma nova peregrinação em busca da fé, lançou mais um desafio para as nossas vidas: Que façamos o nosso «êxodo, ou seja, um sair de nós mesmos, das nossas seguranças, dos nossos esquemas mentais, para nos confiarmos à acção de Deus que nos indica o seu caminho para alcançar a liberdade verdadeira, a nossa identidade humana, a alegria do coração, a paz com todos».

O “sim” que dirigimos a Deus, com a nossa mente e o nosso coração, professando que Jesus é o Senhor, é para Bento XVI um “sim” que transforma a vida. Nas suas palavras, esta entrega abre caminho «rumo a uma plenitude de significado, tornando-a[à vida]assim nova, rica de júbilo e de esperança confiável».

Miguel Augusto

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