O “mundo maravilhoso” da Internet
No universo fantástico e assustador da cibernética, em que algumas ferramentas globais de intercomunicação permitem, a elaborados informáticos, traçar perfis dos milhares de milhões dos seus utilizadores, utilizando sofisticados algoritmos que nos colocam ao alcance de todo o tipo de influências inseridas nas comunicações que chegam ao nosso conhecimento, a informação fácil e repentista, proporcionada por estes novos veículos de comunicação, obriga-nos a um esforço suplementar da procura da verdade.
Quando há pouco tempo alguns acontecimentos sociais de grande relevância, como foram os casos das campanhas para as eleições americanas, francesas, do “Brexit” e, mais recentemente, na divulgação de informação pública relativa ao referendo na Catalunha, revelaram a intromissão de agentes externos no conteúdo das mensagens publicadas, o mundo acordou para a existência de uma nova arma capaz de condicionar o comportamento dos cidadãos no interior das suas próprias sociedades.
As novas tecnologias, que tornaram obsoletos os algoritmos das nossas velhas máquinas de calcular, associadas ao “mundo maravilhoso” da Internet, permitiram ao homem produzir conexões em rede, destinadas a criar uma virtualização informacional capaz de moldar a opinião e o comportamento das pessoas. Agências de técnicos informáticos, sediados num qualquer país, permitem interferir na informação prestada aos cidadãos de um país terceiro.
Estava inventado um novo sistema de influência das decisões dos povos, colocando-os como interventores internos dos desígnios de outros.
Longe já vai o tempo em que a minha geração prolongava sessões nocturnas na pesquisa de textos, na leitura dos escritos e se envolvia em experiências empíricas, procurando respostas às suas interrogações e aos problemas do mundo. Esforço, é verdade, nem sempre compensado por bons resultados, mas indispensável à aquisição de conhecimentos…
Mas hoje tudo parece mais fácil, porque as respostas se encontram à distância de um “click”!
Mais rápido é! Mas será de facto mais verdadeira a conclusão?
Para todos aqueles que, pouco exigentes, anseiam por respostas em poucos segundos às suas dúvidas e inquietações e que, por vícios da sua aprendizagem, do imediatismo que lhes é exigido e por ignorância do inter-relacionamento entre todos os aspectos que convergem para uma aproximação à verdade, uma resposta imediata é conclusiva e esta fórmula técnica é um êxito inquestionável do progresso.
Para outros, que fazem da dúvida sistemática cartesiana um principio mas não um fim e que se interessam em conhecer e pesquisar as várias respostas que se podem colocar a uma mesma dúvida, a actual situação da informação é muito mais complexa. E essa complexidade não deriva tanto da metodologia e conhecimento necessário ao apuramento da veracidade de uma informação, mas é mais expressiva na competição temporal entre as respostas imediatas obtidas no ciberespaço e aquelas que se produzem na procura mais exaustiva do fidedigno. Por isso, as imediatas são interiorizadas rapidamente pelo conjunto da sociedade e as outras, porque mais tardias e menos difundidas, quando chegam ao conhecimento público são muitas vezes interpretadas como desvarios contraditórios do seu autor ou o resultado de interesses malévolos das suas fontes.
Cada geração tem os seus desafios e o direito à exaltação das suas descobertas científicas mas, a cibercultura, não tem de estar em oposição ao conhecimento, na medida em que este é indispensável à interpretação dos conteúdos do espaço virtual. É errado divinizar a informação contida na “net”, tal como é condenável prescindir da informação nela inserta, como um dos meios para atingir o apuramento da verdade. Dosear o raciocínio e o consequente comportamento, considerando que o mundo virtual não passa de uma aproximação, muitas vezes enganosa, ao mundo real, deve incentivar-nos a uma maior exigência do conhecimento e a não nos deixarmos sugestionar pela mais rápida informação que fica à nossa disposição.
Nos sistemas sociais, em que a democracia propicia alterações ou decisões da sua governação através da opinião popular, os emissores da informação propagada na Internet exercem uma enorme influência sobre as camadas populacionais menos esclarecidas. Daí o perigo e a enorme necessidade de viabilizar a publicitação do outras versões, aplicando uma lógica de contraste com as informações erradas ou tendenciosas que são divulgadas.
Deveriam ser anuladas as possibilidades de acesso a essa informação errónea? Não, ficaríamos reféns de uma outra “verdade”, que poderia ser usada abusivamente como a única credível. O contraditório é essencial!
A solução não parece passar por arranjos de software, mas sim por mais exigência de conhecimento público, a não ser que seja inventada tecnicamente a possibilidade de associar, a cada informação recebida, um conjunto de respostas diferentes da primeira. Criaria certamente muito embaraço aos leitores, mas obrigá-los-ia a pensar.
LUIS BARREIRA