VISITA DO SUMO PONTÍFICE FORTALECE A FÉ E A IGREJA CATÓLICA, DIZEM FIÉIS TAILANDESES
Num país marcadamente budista, o Catolicismo continua a ser visto como “a religião do Ocidente” e os católicos a sentirem-se como cidadãos de segunda. No entanto, a visita que o Papa Francisco cumpre por estes dias à Tailândia pode ajudar a mudar o panorama. O Santo Padre é o segundo Pontífice a visitar o antigo Reino do Sião, depois de João Paulo II em 1984. O historiador Miguel Castelo Branco só lamenta a inexactidão da efeméride que trouxe a Banguecoque o actual titular da Cátedra de São Pedro.
Uma ocasião grandiosa e histórica, que qualquer nação aguarda com alegria. É assim que Petros Theou Panthong se refere à visita que o Papa Francisco cumpre desde quarta-feira à Tailândia, numa deslocação ao continente asiático que leva também o Sumo Pontífice, a partir deste sábado, às cidades japonesas de Tóquio, Hiroxima e Nagasaki.
Na quinta-feira, o jovem seminarista madrugou para fazer a curta viagem de duas horas que separa o Seminário Maior Lux Mundi, o mais importante da Tailândia, e o centro de Banguecoque, onde Jorge Bergoglio esteve reunido, primeiro, com o Primeiro-Ministro Prayut Chan Ocha e depois com o Rei Maha Vajiralongkorn.
A visita do actual titular da Cátedra de São Pedro à Tailândia – a quarta ao continente asiático desde que iniciou o seu pontificado, em 2013 – faz culminar as celebrações dos 350 anos da introdução oficial do Catolicismo no antigo Sião, mas para Petros Panthong, mais do que celebrar o passado, a visita do Papa Francisco ajuda a projectar o futuro. «A comunidade católica da Tailândia está a celebrar 350 anos de Cristianismo no nosso país, Deus seja louvado», recorda Panthong. «Como sabe, a Tailândia é um país budista. Os católicos são uma pequena minoria. Esta deslocação do Sumo Pontífice vai fazer com que os católicos olhem para a sua própria fé com um vigor renovado. Talvez possa mesmo contribuir para que alguns budistas se convertam ao Catolicismo», assume o jovem seminarista, nascido numa diocese rural da Tailândia, em declarações a’O CLARIM.
A visita de Francisco à Tailândia e ao Japão serve também para que o Papa reforce os laços entre religiões, em dois países onde os católicos representam uma ínfima parte da população: 0,59 por cento dos 65 milhões de tailandeses e 0,42 por cento dos 126 milhões de japoneses.
Impreterivelmente budista, a Tailândia, considera o académico Miguel Castelo Branco, está longe de ser solo fértil para a disseminação da fé cristã. Para a maioria dos tailandeses, o Catolicismo é pouco mais do que um testemunho da espiritualidade ocidental com que o Sião foi confrontado após o estabelecimento dos portugueses em Ayutthaya, no início do século XVI. «Os budistas são quase insensíveis à propagação de outras fés, nomeadamente o Islão e o Cristianismo. Estas duas religiões universais conseguiram introduzir-se na Tailândia, mas não desenvolvem proselitismo e, se o fazem, nunca lograram resultados», reconhece Castelo Branco. «Os padres franceses não terão conseguido ao longo dos séculos qualquer conversão, pelo que o crescimento do Catolicismo decorre de uma herança familiar luso-descendente ou da conversão de comunidades étnicas não “thais” chegadas ao País», acrescenta o especialista em relações luso-siamesas.
Sobrinho do monsenhor Andrew Vissanu Thanya-anan, responsável pela coordenação da etapa tailandesa da deslocação do Papa ao continente asiático, Paul Rakboonyuang está convicto que a visita irá contribuir para o fortalecimento da fé e da Igreja Católica, num país onde a mensagem de Jesus Cristo – lembra – ainda é vista pela esmagadora maioria da população como a «religião do Ocidente». «Os católicos são uma pequena minoria neste país. E foram, a determinada altura, uma minoria perseguida. Em 1940, houve católicos martirizados porque se recusaram a abnegar a sua fé», recorda o jovem. «Actualmente há liberdade de religião, mas muitas pessoas ainda acreditam que os tailandeses devem ser budistas. Para eles, o Catolicismo é a religião do Ocidente. Não somos perseguidos, mas não prática somos cidadãos de segunda classe no nosso país», assegura.
Paul Rakboonyuang esteve presente na missa campal que o Papa João Paulo II celebrou na capital tailandesa e conserva memórias frágeis da visita que o Pontífice polaco fez ao País em 1984. Para ele, o actual líder da Igreja Católica tem a mesma grandeza moral de São João Paulo II. «O Papa Francisco goza de uma reputação de grande moralidade e não esconde o carinho, a empatia e a compaixão que nutre pelos que sofrem, seja qual for a sua raça ou religião. As posições que tem vindo a tomar em relação aos católicos divorciados ou às comunidades LGBT são muito respeitadas na Tailândia. É um Papa de que nos sentimos muito orgulhosos», remata.
Tanto os tailandeses, como os japoneses – católicos ou não – esperam fervorosamente que o Papa aborde uma outra questão na sua visita: o respeito pela vida, quer através da condenação do tráfico humano na Tailândia, quer pela defesa do fim da pena de morte no Japão.
Esta dimensão é, no entender do padre Luís Sequeira, uma das facetas mais importantes desta visita. O antigo Superior da Companhia de Jesus em Macau está convicto que o Pontífice esteja atento à realidade social da Tailândia e do Japão, e que vai deixar em ambas as nações uma mensagem de esperança. «No Japão há uma dimensão da perfeição que cai no perfeccionismo, mas que esquece muitas vezes a pessoa humana, da mesma forma que, na Tailândia, a dimensão da caridade vai para o outro extremo, o de um hedonismo em que a exploração da Humanidade está mais do que patente. Esta dimensão moral da nossa Humanidade, penso, que está implícita também na visita do Papa a estes países», sustenta.
E NO JAPÃO…
Um dos pontos altos da deslocação do Santo Padre ao Japão cumpre-se este Domingo, quando visitar o memorial dos 26 Mártires do Japão, em Nagasaki.
Além da agenda pastoral e política, o Papa Francisco tem um objectivo pessoal para cumprir nesta viagem. Na sua juventude, o jesuíta Jorge Bergoglio queria ser missionário no Japão. Um desejo que, se não fosse ter tido uma doença pulmonar, teria alterado o destino do Papa, que provavelmente nunca teria chegado a Pontífice da Igreja Católica. «Estou convicto que também há uma perspectiva muito pessoal do Santo Padre nesta deslocação ao Japão. Poderá contar seguramente a sua formação, o seu conhecimento, a sua própria espiritualidade como jesuíta. Estes elementos, cruciais para a evangelização, quase diria, estão-lhe no sangue», conclui o também ele jesuíta padre Luís Sequeira.
Marco Carvalho