Possibilidade de independência é quase zero.
Convidado a analisar as próximas eleições do Conselho Legislativo (LegCo) da RAEHK, John Mok sustenta que a possibilidade de independência da antiga colónia britânica é quase zero, mas teme que aumente o descontentamento social e as clivagens entre a população e o “establishment”. A’O CLARIM, o membro do Grupo de Direitos Humanos da Comissão de Justiça e Paz da Diocese de Hong Kong falou do que está em jogo para os pró-democratas, para os localistas, para CY Leung e para o Governo Central.
O CLARIM – O que está em jogo nas eleições do LegCo a 4 de Setembro?
JOHN MOK – Penso que o assunto mais crítico é saber se a oposição, principalmente os pró-democratas, vai conseguir manter uma minoria crítica necessária para não aprovar as principais propostas de leis e de alterações constitucionais [à Lei Básica] que possam violar os Direitos Humanos. Por exemplo, se o Governo quiser passar uma reforma política anti-democrática, precisa de dois terços da maioria (47). É, pois, crucial que a oposição obtenha, pelo menos, um terço dos assentos (24). Como a oposição é hoje muito facciosa, temo que desta vez não consiga manter a minoria crítica.
CL – De que forma se comportará o “establishment” nestas eleições?
J.M. – A eleição do Chefe do Executivo, pelo “pequeno círculo”, decorrerá em Março do próximo ano. Acredita-se que o actual governante, CY Leung, esteja ansioso por ser reeleito. Contudo, é bastante impopular e tem muitos potenciais adversários – um deles é o actual secretário das Finanças, John Tsang. Alguns candidatos às eleições do LegCo, tanto da oposição, como favoráveis ao “establishment”, fazem do slogan “anti-CY Leung” o elemento chave das suas plataformas eleitorais. CY Leung vai inevitavelmente seguir de perto as eleições e dará o seu melhor para se certificar que os resultados não o tornam menos favorável aos olhos de Pequim.
CL – E os localistas?
J.M. – É, sem dúvida, a primeira vez que os candidatos com claras plataformas eleitorais localistas participam numa eleição geral. No entanto, alguns foram impedidos de concorrer pelo “Registration and Electoral Office”, por serem a favor da independência de Hong Kong. O mais notável de todos é Edward Leung, do “Hong Kong Indigenous”, que venceu com mais de 66 mil votos a eleição suplementar realizada nos Novos Territórios de Este, em Fevereiro. A triagem política dos candidatos é um golpe, não só no Estado de Direito, como também na legitimidade das próprias eleições. Para os localistas este incidente serve como prova viva de que são marginalizados, por isso a necessidade de maior luta radical.
CL – Irão ganhar terreno no LegCo?
J.M. – Alguns localistas moderados – por exemplo, candidatos do “Youngspiration” – podem ter hipóteses de conquistar um ou dois assentos. Se for o caso, as suas vozes poderão ser ouvidas durante a legislatura. Todavia, como os candidatos mais proeminentes foram excluídos, as vozes mais militantes e mais radicais não se vão expressar através dos canais institucionais. Isto faz com que possam acontecer com maior probabilidade futuros distúrbios baseados em ideologias localistas.
CL – Que futuro para os pró-democratas?
J.M. – Como há uma triagem política dos candidatos a legitimidade desta e de futuras eleições podem ser questionáveis. Os pró-democratas vão enfrentar um dilema mais forte na decisão de participar, ou não, em futuras eleições: se o fizerem, vão abandonar certos princípios morais; se não o fizerem, vão perder mais terreno para o campo “pró-establishment”.
CL – Muitos cidadãos de Hong Kong defendem que o território deve tornar-se independente da República Popular da China. Que percepção tem do problema?
J.M. – Não diria que “muitos” cidadãos de Hong Kong defendem a independência do território, mas é verdade que o apoio está a aumentar, especialmente entre os jovens. De acordo com um recente inquérito levado a cabo pelo Centro de Comunicação e Pesquisa da Opinião Pública da Universidade Chinesa [de Hong Kong], 17 por cento dos inquiridos apoiam a independência total após 2047. Tendo em conta que a situação de Hong Kong está a deteriorar-se rapidamente – é disso exemplo o caso dos cinco livreiros desaparecidos – é compreensível que alguns queiram a independência para corrigir o errado. A opressão produz resistência e a homogeneização forçada gera separatismo. Apesar da possibilidade de independência ser quase zero, posso dizer que não é nula. E o activismo irá amadurecer nos próximos anos.
CL – Qual é o posicionamento de Pequim em termos políticos?
J.M. – Pequim irá continuar com a sua política de homogeneizar Hong Kong para reforçar o Estado unitário. Os seus colaboradores em Hong Kong vão, portanto, rejeitar e condenar qualquer apelo a uma maior auto-determinação e autonomia e, claro, a uma maior independência. Haverá mais e mais infiltração em todos os aspectos da vida, especialmente na educação e nos Órgãos de Comunicação Social. Para Pequim é favorável manter a política “Um país, dois sistemas económicos”, mas não “Um país, dois sistemas políticos”.
PEDRO DANIEL OLIVEIRA