História do Calendário

O Ano Novo.

Amanhã é a véspera de Ano Novo, Ocidental, entenda-se. Cumpre-se no calendário mais um ano, 2015, vem aí, claro, 2016. Passou o Natal, também importante no calendário. Refira-se, porque é importante para entendermos esta dinâmica, que o Natal é (foi) a 25 de Dezembro. Sim, todos sabemos, mas foi sempre assim? Porquê 25 de Dezembro? Quase que é o Solstício de Inverno (21), mas é celebrado por ser, desde o séc. IV, desde a primeira referência em 354, num calendário civil. Os cristãos optaram por 25 por oposição à festa pagã do Natalis Solis Invictis (Nascimento do Sol Invicto), muito em voga nos sécs. III e IV, um monoteísmo solar. O “sol da justiça” (Malaquias 3,20) era o sol dos cristãos, ou seja, Jesus, cuja Natividade foi sendo “colada” a esta data de 25 de Dezembro, como forma de suplantar e santificar a data. Como celebração também se tornou importante, como a Epifania o era no Oriente, a 6 de Janeiro. Os séculos seguintes imporiam a data de 25 de Dezembro como o dia do Natal do Senhor, assim ficando até aos dias de hoje.

Tudo é também uma questão de calendário. Mas o que é um calendário, afinal? É um sistema para contagem e agrupamento de dias (em meses e anos), de acordo com as necessidades civis e religiosas. O termo tem origem no Latim “calendarium”, ou “livro de registo”, que deriva de “calendae”. Uma calenda era pois o primeiro dia de um mês entre os romanos. A contagem do tempo é operada em dias. Um dia é uma unidade/período de tempo entre dois eventos equivalentes, sucessivos, entre duas ocorrências do nascer do Sol, por exemplo, naquilo que é um dia solar (24 horas). Um mês lunar é o período de tempo entre duas lunações (duas luas novas consecutivas), cujo valor aproximado é de 29 dias, 12 horas, 44 minutos e 2,9 segundos (pode variar entre 29 dias e 4 h e 29 dias e 22 h aproximadamente). O ano solar é o período de tempo que completa um ciclo de estações (Primavera, Verão, Outono e Inverno), tendo a duração média de c. 365 dias, 5 horas, 48 minutos e 47 segundos. A cada quatro anos, as horas extra acumuladas são reunidas no dia 29 de Fevereiro, formando o ano bissexto, ou seja, o ano com 366 dias. Os calendários mais antigos baseavam-se em meses lunares (calendários lunares) ou no ano solar (calendário solar) para efeitos de contagem do tempo.

No Ocidente, no mundo cristão, é importante recordar o calendário Juliano, assim denominado em honra de Júlio César, que o impôs com a ajuda do astrónomo Sosígenes. No calendário juliano, os romanos usavam meses lunares (início em cada lua nova). No primeiro dia da lua nova, chamado dia das calendas (calendae), um dos pontífices convocava o povo ao Capitólio para informar as celebrações religiosas daquele mês. O pontífice mencionava um por um os dias que transcorreriam até as nonas, repetindo em voz alta a palavra “calo”, eu chamo. Daí “calenda”. Existiam também os Idos e as já citadas Nonas (o nono dia antes dos Idos). Nos meses de 31 dias, os Idos eram no dia 15 do mês, nos meses mais pequenos, os Idos eram no dia 13 do mês. As Nonas caíam assim entre os dias 5 e 7 de cada mês.

O calendário juliano foi implantado por Júlio César, em 46 a.C., reformulando o antigo calendário romano (incerto, com 355 dias, em 12 meses, com muitos desajustes). Augusto, primeiro imperador romano, modificou-o em 8 d.C.. As denominações dos meses ainda sofreriam mudanças ao longo do Império Romano. O calendário juliano, com as modificações feitas por Augusto, continua em uso entre os cristãos ortodoxos em vários países. Na essência, caracteriza-se pelo facto dos anos bissextos ocorrerem sempre de quatro em quatro anos, enquanto no calendário gregoriano não são bissextos os anos seculares excepto os múltiplos de 400, o que hoje acumula uma diferença para o calendário gregoriano de 13 dias. Assim, hoje dia 30 de Dezembro de 2015 no calendário gregoriano corresponde ao dia 17 de Dezembro de 2015 no calendário juliano.

O calendário juliano foi modificado em 1582, pelo Papa Gregório XIII (24 de Fevereiro, pela bula Inter gravissimas), sendo substituído pelo calendário gregoriano, tendo sido adoptado de imediato por Espanha, Itália, Portugal, Polónia e, posteriormente, por todos os países ocidentais. Não foi uma mudança em simultâneo, logo não houve harmonização. O calendário juliano estabelecia um ano bissexto em cada quatro anos, fazendo com que cada ano tivesse 365,25 dias, em vez dos 365,242189 que tem na realidade. Por isso, há um desfasamento de mais de 11 minutos por ano, pelo que em 1582, por exemplo, antes da sua reforma pelo Papa Gregório XIII o calendário civil levava um atraso de 10 dias em relação ao calendário astronómico. De facto, no calendário juliano existiu sempre um desfasamento entre o ano do calendário e o ano natural, em consequência do movimento de elipse que a Terra faz ao redor do Sol. No século XV, por exemplo, o calendário juliano já estava atrasado cerca de uma semana em relação ao Sol. O Equinócio da Primavera no Hemisfério Norte caía, por exemplo, por volta de 12 de Março, em vez do dia 21. Em 1545-63, o Concílio de Trento determinou a realização de alterações no calendário da Igreja.

Após décadas de estudos e cálculos astronómicos, o Papa Gregório XIII instituiu o novo calendário, em 1582, para adequar a data da Páscoa ao Equinócio da Primavera no Hemisfério Norte. Este ajuste implicou a supressão de 10 dias do mês de Outubro daquele ano: do dia 4 de Outubro de 1582, saltou-se então para o dia 15 de Outubro. Além disso, os dias bissextos que caíssem nos anos centenários (aqueles terminados em 00, como 1700, por exemplo) passariam a ser ignorados, a menos que fossem divisíveis de modo exacto por 400 (como 1600 e 2000). Essa regra suprimia três anos bissextos a cada quatro séculos, deixando o calendário gregoriano suficientemente preciso e eliminando o atraso de três dias a cada 400 anos, que ocorria no calendário juliano. Apesar do ajuste nos anos bissextos, o ano do calendário gregoriano ainda tem cerca de 26 segundos a mais que o período orbital da Terra. Esta discrepância, no entanto, só acumula um dia a mais a cada 3323 anos. Os países de maioria protestante recusaram a alteração. As regiões protestantes da Alemanha e dos Países Baixos só adoptaram o novo calendário em 1700, a Grã-Bretanha só em 1752. O astrónomo Johannes Kepler comentou mesmo que esses países preferiam «ficar em desacordo com o Sol a ficar de acordo com o Papa». Os países ortodoxos adoptaram o calendário gregoriano somente no início do século XX. A antiga União Soviética só implantou o novo calendário em 1918. Daí que a designada “Revolução de Outubro”, de 1917, sucedeu na verdade em Novembro, segundo o calendário gregoriano, que é o calendário cada vez mais universal.

O primeiro dia do ano: no calendário romano antigo era a 1 de Março. No calendário juliano, passa a ser o dia 1 de Janeiro, o dia de Jano, deus das “entradas, das portas e dos começos”. Jano era o deus bifronte: uma cara olhava para a frente, outra para trás, como o mês de Janeiro. Uma tradição que se manteria no calendário juliano e depois continuada pelo gregoriano, até hoje, mas com um significado religioso, que a Idade Média estimulou. Feliz Ano Novo para todos, com Paz e Bem!

Vítor Teixeira 

Universidade Católica Portuguesa

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