Evangélicos no Top.
Os HMB foram os portugueses que actuaram, na passada sexta-feira, no 19º Festival da Lusofonia. Foi em 2007 que tudo começou, quando Joel incentivou Héber a criarem uma banda onde pudessem inserir os temas que não cabiam no seu projecto de música evangélica. A fórmula dos HMB transporta-nos para a música Soul que nasce da mistura da energia Gospel com as melodias do Rhythm and Blues. A alma está lá!
«O que nos uniu foram as raízes que temos da Igreja Cristã. A maior parte da banda pertence à Igreja Evangélica. Foi aí que se deu o nosso encontro, num evento de cariz cristão. Conheci o Joel Silva e o Daniel. Eu e o Joel Xavier pertencíamos à mesma igreja; ainda hoje a frequentamos», disse Héber Marques.
Conhecem-se há mais de quinze anos, são amigos, tocam juntos e partilham a mesma fé. Apesar da sua vida artística, continuam a frequentar a Igreja e a participar em projectos de música evangélica.
Para Héber a formação evangélica foi muito importante no seu crescimento. Todas as bases da sua vida vêm desta educação o que acaba por influenciar a música que compõem.
«A Igreja Evangélica está muito ligada à música, com instrumentos, com músicos, não necessariamente cantada. Isto acaba por criar uma sensibilidade maior em relação à música, o que nos influenciou muito no nosso crescimento», começou por explicar Joel Xavier.
Héber Marques é um dos maiores artistas evangélicos portugueses; conta já com três trabalhos editados e, apesar de neste momento estar mais dedicado ao projecto HMB, continua envolvido em projectos ligados à Igreja.
Joel Xavier considera que «a música é um meio de cativar as pessoas e nomeadamente os jovens para irem à igreja, mas não é uma forma de fazer com que as pessoas fiquem na Igreja. Ela não deve ser utilizada para ancorar as pessoas, mas é perfeitamente normal que sejam atraídas pela música e pela forma como é tocada e cantada. Para ficar na Igreja, para perceber e sentir o que é Deus ou a fé, precisam da Palavra, da oração, de perceber a Palavra de Deus».
«Qualquer dom, em última análise, deve-nos fazer apontar para Deus, para o que a maioria de nós acredita ser o criador de todas as coisas. É natural que um dom tão forte e universal como a música tenha esse sentido de chamar as pessoas e aproximar as pessoas de Deus», reflectiu Joel Silva.
As letras dos HMB falam sobre o amor e sobre a alegria de estar vivo; tentam acima de tudo passar uma mensagem positiva da vida.
«Não nos esforçamos para que a nossa mensagem seja positiva, acho que nos esforçamos mais para que não seja negativa. Ou seja, no nosso processo criativo julgamos muito as nossas letras, sobretudo na perspectiva da nossa formação cristã. Sempre que achamos que alguma coisa na nossa consciência, naquilo que estamos a escrever, não é muito coerente com a nossa fé, acabamos por nos “censurar”. É um processo natural», disse Joel Xavier, acrescentando: «Alguns de nós têm a oportunidade de tocar na igreja. É o sítio certo para falarmos sobre Deus e a nossa fé. Nas letras dos HMB isso não é tão nítido, mas não sentimos que tenha de ser. Falamos da vida em geral, de situações que surgem».
Para Héber «não é uma coisa sempre intencional, mas com o passar do tempo é algo que nos distingue. A nossa mensagem é para que as pessoas vivam a vida de uma forma verdadeira. Queremos que as pessoas sejam livres e honestas na sua forma de viver. Na verdade, desejamos que as pessoas passem bons momentos. A música é um veículo muito forte, pode ser usada em várias áreas, com muitas finalidades, e nós usamo-la para que as pessoas estejam connosco naquele momento em que estamos em palco, que vivam as coisas que nós queremos transmitir: o sorriso na cara, a boa disposição, a alegria, e que levem isso com elas. Queremos que as pessoas sejam mais leves».
Relativamente ao papel do Gospel no actual panorama musical português, Joel Xavier referiu que «a comunidade evangélica em Portugal é pequena» e que «a música evangélica ou mesmo cristã tem pouca expressão». Na opinião do baixista, «há poucos cristãos, no sentido de quem vive a Palavra, quer conhecer Deus e vive a sua fé. Isto faz com que os nossos meios sejam pequenos. Portanto, no panorama da música portuguesa, o Gospel é uma espécie de estilo de música gira, das pessoas da Igreja. Não é visto tanto como uma questão de louvor sério a Deus, o que acaba por transmitir o desconhecimento que as pessoas em geral têm do que nós fazemos quando cantamos e tocamos na igreja».
Este raciocínio é completado por Joel Silva: «Se falarmos de Gospel como música de igreja, de louvor e de adoração, acho que em Portugal não tem uma grande expressão. Mas se falarmos de bandas que são constituídas por pessoas cristãs, nunca houve um momento na música portuguesa em que houvesse tantas bandas e tantos artistas diferentes que vêm de um “background” cristão, e essa visão da vida e interpretação cristã reflecte-se nas músicas que fazem. Dependendo de como o definem, o Gospel pode ter esta dualidade de visões, em que realmente não há muita coisa a acontecer, mas ao mesmo tempo há muitos artistas declaradamente cristãos, que influenciam muito a música portuguesa».
Héber vai mais longe: «Cada vez há menos preconceito e as pessoas estão cada vez mais abertas a novas formas de pensar, o que dá espaço para que o Evangelho seja ouvido. Antigamente os artistas escondiam a sua fé, hoje é uma coisa mais natural e mais aceite».
Questionados sobre o modo como lidam com o reconhecimento público, tendo em conta a sua formação evangélica, Joel Xavier respondeu: «Todos nós temos boa formação, temos pessoas nas nossas vidas que nos dizem a verdade, sítios onde somos valorizados fora da música, e todos somos pessoas mais ou menos razoáveis. Tal acaba por nos fazer lidar de uma forma muito saudável com o reconhecimento. Sendo nós cristãos, percebemos que tudo vem de Deus, todas as coisas boas que nos acontecem na vida, dentro ou fora da banda. Sem Deus nada acontecia, por isso aprendemos a cultivar a gratidão, o que nos faz continuar simples e nos ajuda a não nos deslumbrarmos muito com o que tem acontecido nos últimos tempos». Por outro lado, continuou, «toda a equipa que trabalha connosco é fundamental para que nos mantenhamos realistas e com os pés assentes na terra, o que nos ajuda a manter um espírito equilibrado. Também os pastores das nossas igrejas são interventivos em relação a isso. Eles próprios, se for necessário, não têm problemas em dizer alguma coisa que nós, enquanto artistas, estejamos a fazer bem ou mal. Dentro e fora da área musical há muitas pessoas na nossa vida que nos ajudam a manter e cultivar o espírito de humildade».
RADIOGRAFIA
Héber Marques na voz, Joel Silva na bateria, Daniel Lima nos teclados, Fred Martinho na guitarra e Joel Xavier no baixo formam os HMB.
Héber nasceu e cresceu em Cascais, é filho de angolanos e neto de cabo-verdianos. Joel Xavier nasceu em Angola, foi para Portugal ainda pequeno, viveu entre a Moita e Cascais, e actualmente reside em Linda-a-Velha. Fred nasceu em Lisboa e viveu entre Algés e Miraflores. Joel Silva nasceu em Vila-Franca-de-Xira e mora em Alverca. Daniel nasceu em Oeiras e cresceu no Barreiro.
Amigos há já alguns anos, tocavam juntos em outros projetos. Em 2007 decidiram formar os HMB onde encontraram o equilíbrio perfeito para desenvolver o gosto pela Soul e pelo R&B, este último ganho pela afinidade com as suas origens Gospel.
Os grandes nomes dos anos 60 e 70, como Al Green e Bill Withers, e os mais recentes D’Angelo e ErykahBadu, são algumas das referências que inspiram a sonoridade da banda.
Em 2012 lançaram o primeiro álbum intitulado “HMB”, em 2014 foi a vez de “Sente”, e mais recentemente, em Junho deste ano, o terceiro álbum, “Live at the National Theatre of Namibia (Ao Vivo)”.
ANA MARQUES