O Livro dos Papas
Já vimos anteriormente (GUARDIÕES DAS CHAVES n.º 4) que, ao longo dos séculos, alguns Padres da Igreja forneceram um registo da lista dos Papas até ao seu tempo. Mas não temos apenas a lista dos nomes; temos também as biografias dos Papas durante esses séculos. A fonte reconhecida das respectivas biografias, especialmente dos primeiros quinze séculos do Cristianismo, é o Liber Pontificalis.
Conhecido nos primeiros manuscritos existentes como Liber episcopalis in quo continentur ata beatorum pontificum Urbis Romae (“Livro episcopal em que estão contidos os actos dos bem-aventurados pontífices da Cidade de Roma”) e, mais tarde, como Gesta ou Chronica pontificum, o Liber Pontificalis (“Livro Pontifício” ou “Livro dos Papas”) é uma colecção de biografias de Papas desde São Pedro até ao Século XV. Foi a partir do Século XII que passou a chamar-se Liber Pontificalis e foi considerado o padrão na documentação dos sucessores de Pedro (cf. Levillain, Philippe. 2002. “The Papacy: An Encyclopedia”. Routledge, p. 941).
O projecto foi iniciado por vários autores anónimos, no Século III, que começaram a elaborar uma lista dos Bispos de Roma. Entre os Séculos VI e IX, e entre cerca do ano mil e 100 e o Século XV, transformou-se numa série biográfica em várias fases. Quando foi ampliada, no Século VI, foram acrescentados mais pormenores, como o nome de nascimento do Papa, o nome do pai, o local de nascimento, a profissão antes da elevação, a duração do pontificado, algumas notas históricas, os principais pronunciamentos e decretos teológicos, os marcos administrativos, as ordenações, a data da morte, o local de sepultura e a duração da sede vacante que se seguiu (cf. Levillain, Philippe. 2002. “The Papacy: An Encyclopedia”. Routledge, p. 941).
Durante a Idade Média muitas pessoas consideraram São Jerónimo como o autor de todas as biografias até ao Papa Dâmaso I (366-383), que nomeou Jerónimo como secretário. Outras fontes atribuem os primeiros trabalhos a vários autores, como Hegesipo (escritor cristão que lutou contra os gnósticos e o heresiarca Marcião), Santo Irineu de Lyon e Eusébio de Cesareia (o primeiro historiador da Igreja).
No Século XVI, Onofrio Panvinio (frade agostiniano, historiador e antiquário) atribuiu as biografias posteriores a Dâmaso, até ao Papa Nicolau I (858-867), a Anastasius (Anastácio) Bibliothecarius (c. 810 – c. 878), bibliotecário e arquivista-chefe da Igreja de Roma. Os estudiosos continuaram a citar Anastácio como o autor dessa parte das biografias até ao Século XVII, embora tal tenha sido contestado por estudiosos como César Barónio, Ciampini, Schelstrate e outros (cf. Herbermann, Charles, edição 1913. “Liber Pontificalis” in Catholic Encyclopedia. New York: Robert Appleton Company).
Em 1887, Louis Marie Olivier Duchesne, padre francês, filólogo, professor e historiador crítico do Cristianismo, da liturgia e das instituições católicas romanas, publicou a primeira edição crítica completa do Liber Pontificalis. Argumentou que a compilação das biografias foi gradual e não sistemática. Segundo ele, era impossível determinar com certeza a autoria das biografias, salvo algumas excepções. Pensa, no entanto, que a parte que vai do primeiro Papa até Félix III (483-492) foi feita por um único autor, contemporâneo do Papa Anastácio II (496-498). Baseou a sua afirmação no Catalogus Liberianus, que lista os Bispos de Roma desde Pedro até Libério (falecido em 366). Fornece pormenores adicionais, como a duração de cada pontificado e o nome do Imperador durante os períodos em causa. O Catalogus Liberianus baseia-se na lista feita por Hipólito de Roma e no Catálogo Leonino. Este último documento já não existe.
A lista completa dos Papas até à actualidade e as respectivas biografias encontram-se no Anuário Pontifício, a publicação anual da Cúria Romana, na secção intitulada Sommi Pontefici Romani (“Os Sumo Pontífices Romanos”).
Pe. José Mario Mandía