Regresso à Europa
O Circo da Fórmula 1 está de regresso a “casa” depois da sua digressão asiática no início de mais um Campeonato do Mundo da modalidade.
Lewis Hamilton, em grande forma e com muita sorte, venceu três das quatro corridas e tem um confortável avanço de 27 pontos sobre o seu companheiro da Mercedes Benz. Até aqui tudo bem. Será?
O domínio de Hamilton não é tão evidente como poderá parecer. Os dois Mercedes estão visivelmente mais fracos do que no ano passado. No Bahrain, por exemplo, os dois carros tiveram grandes problemas de travões, com Nico Rosberg a perder a segunda posição para o piloto da Ferrari Kimi Raikkonen. Segundo Toto Wolff, o director técnico da equipa alemã, ambos os carros estariam fora da luta por qualquer posição pois aos travões estavam em risco de colapso. Wolff foi peremptório ao afirmar que nenhum dos dois carros poderia efectuar mais uma volta completa.
No capítulo do motor, a Ferrari deu um passo de gigante desde o final da época passada e os carros encarnados da Scuderia são, apenas, um pouco menos rápidos do que os Mercedes, espreitando qualquer falha dos seus adversários para atacar. Sebastian Vettel já tem três pódios, incluindo a vitória na Malásia, e Raikkonen pôde aproveitar a falha mecânica de Rosberg no circuito do deserto do Bahrain.
A juntar às preocupações da equipa alemã está o facto de Hamilton ainda não ter finalizado um novo acordo com a Mercedes – se bem que desde a Malásia se diga que o acordo está 99,6% firmado – o que vem alimentando alguns rumores de uma possível “transferência” para Maranello a qualquer momento. Algo que embora tenha muitos prós, também tem imensos contras.
Um dos maiores atractivos para Hamilton seria o facto de poder tentar dar mais um passo no sentido de emular o lendário Fangio. O campeoníssimo argentino venceu cinco Campeonatos do Mundo, (1951 – 54, 55, 56 e 57), conduzindo em quatro equipas diferentes (Alfa Romeo, Maserati, Mercedes e Ferrari). Mas para tal Hamilton ainda teria de encontrar mais uma equipa competitiva para igualar El Maestro.
Hamilton iria, seguramente, substituir Raikkonen, e só poderia ser o segundo piloto da Scuderia, algo que não conseguimos imaginar. Já vimos como o britânico reage a pilotos competitivos na sua equipa, quando Fernando Alonso passou pela primeira vez na McLaren. Situação muito provável seria algo como a luta entre Ayrton Senna e Alain Prost na McLaren, em meados dos anos oitenta, início dos anos noventa do século passado. Pelo que conhecemos da equipa fundada por Enzo Ferrari, uma situação deste género não seria tolerada – ou Hamilton seria o primeiro piloto ou não se sentiria à vontade.
Falando de Vettel, depois do tratamento que recebeu durante os anos em que foi campeão, em flagrante detrimento dos seus companheiros de equipa, não conseguimos ver o tetra-campeão como segundo piloto de Hamilton (ou de qualquer outro piloto), e indisciplinas na Scuderia pagam-se caras. Que o diga René Arnoux, que acabou a época de 1985 ao volante de um Fórmula 3… em Macau!
Como referimos antes não conseguimos imaginar este cenário, pelo que os rumores só poderão ser fruto de uma campanha para aumentar a possibilidade de acordo nos 0,4% que o próprio Hamilton afirmou faltarem.
Entretanto, dois grandes da Fórmula 1, Jackie Stewart e Stirling Moss, têm opiniões diferentes em relação ao outro piloto da Mercedes, Nico Rosberg. Stirling Moss, que nunca foi campeão do mundo, mas foi quatro vezes vice-campeão, talvez falando com o saber da sua experiência como segundo piloto de Fangio na Mercedes, considera que Rosberg nunca vencerá o seu companheiro de equipa com um carro igual. Já Jackie Stewart acredita que Rosberg tem tudo para amadurecer e desfeitear o companheiro de equipa ainda este ano. Em quem acreditar?
Mas voltemos à realidade. O Circo regressa a Espanha, a um circuito sobejamente conhecido de todas as equipas, pois é ali que se efectuam os testes de Inverno na pré-temporada. O circuito é o mesmo de sempre, mas sempre diferente de cada vez que ali se chega, como disse uma vez Felipe Massa. A temperatura, a humidade e o asfalto sofrem sempre alterações, e se o traçado continua imutável, o circuito não é o mesmo.
Os carros com motor Renault, Red Bull, Toro Rosso e Lotus, esperam que os motores estejam melhor depois da fábrica francesa afirmar ter resolvido muitos dos problemas com que se tem debatido desde o início da temporada. O mesmo se espera para o “famoso” motor revolucionário da Honda, que está a sofrer os males da juventude e ainda poderá ter pela frente um longo caminho antes que os carros equipados com o motor japonês possam vir a ser competitivos.
Já as restantes equipas sofrem cada vez mais com a ausência de patrocinadores, algo que aflige toda a estrutura da Fórmula 1. A falta de retorno publicitário devido à redução de audiências a todos os níveis, começando na televisão e acabando nos circuitos, onde os espectadores são cada vez menos, vem dar razão a todos os que querem a Fórmula 1 de volta à Europa. Os circuitos e os Grandes Prémio carismáticos têm desaparecido, ou estão em vias de desaparecer, com uma desmedida expansão pelo mundo fora, onde até pode haver circuitos exóticos e muito dinheiro, mas que no fim só ajudam a aumentar as despesas de deslocação e a fuga das audiências, que num passado não muito distante acompanhavam o Circo em todas as provas europeias.
Barcelona é terreno de eleição para os Mercedes. Se não tiverem problemas de travões e ficarem de fora de acidentes e incidentes, deveremos voltar a ter uma “dobradinha” dos carros de Estugarda.
Manuel dos Santos