A VIRTUDE TEOLÓGICA DA FÉ

Fé: a Virtude Fundamental (quarta parte)

4. A VIRTUDE TEOLÓGICA DA FÉ

A fé pode ser definida, em geral, como acreditar em algo de alguém em quem se confia. No nível divino e sobrenatural, é descrita como acreditar em Deus e no que Ele disse. A Fé Cristã é um dom de Deus que ninguém pode adquirir por si mesmo: Pois pela graça, vós fostes salvos pela fé, e isso não vem de vós mesmos; é dom de Deus (cf. Ef., 2, 8).

Mais precisamente, a fé é definida como a virtude teológica através da qual acreditamos firmemente no que Deus revelou e a Santa Igreja nos propõe como verdades nas quais devemos acreditar. São Tomás define a fé como um hábito da mente, pelo qual a vida eterna começa em nós, fazendo com que o intelecto assente no que não é aparente (cf. Hb., 1, 11).

Assim como a caridade e a esperança estão na vontade, a virtude da fé está no intelecto, pois está ligada ao conhecimento da verdade: um conhecimento – fundamentado na graça divina – da verdade revelada.

As verdades divinamente reveladas chegaram à Humanidade de duas formas: por escrito, na Sagrada Escritura, e oralmente, na Tradição, e são-nos apresentadas pelo magistério da Igreja, que preserva, explica e desenvolve de forma homogénea – com a ajuda da Teologia – as verdades reveladas por Deus.

O objecto da virtude da fé: todas – e somente – as verdades reveladas por Deus. O motivo ou razão da fé é a autoridade de Deus, que não pode enganar a si mesmo nem a nós. O conteúdo básico da fé: acreditar que Deus existe, que Ele me criou por amor, que Ele me propõe a sua amizade, que Ele quer levar-me para a felicidade perfeita ao seu lado. A fé tem um conteúdo e é pessoal, pois, caso contrário, seria apenas conhecimento sem vida (São Tomás de Aquino).

A fé é necessária para a salvação (cf. Mc., 16, 15-16). O cristão deve acreditar implicitamente em todas as verdades divinamente reveladas. Explicitamente, é necessário para a salvação acreditar que Deus existe e que Ele recompensa aqueles que O procuram (cf. Hb., 11, 6). Depois disso, a fé na Encarnação e na Trindade. Os moralistas explicam que o cristão é gravemente obrigado a conhecer e acreditar nos artigos do Credo, a receber os Sacramentos necessários para todos (Baptismo, Penitência e Eucaristia), a obedecer aos preceitos do Decálogo e, muito provavelmente, a conhecer o Pai Nosso (cf. N. Tettamanzi, Fe).

Adorável: A Palavra de Deus não é apenas uma fonte de verdade; é também uma fonte de vida (Alonso Schokel).

A virtude teologal da fé é a virtude fundamental. “A fé é uma orientação de toda a nossa existência. É uma opção fundamental que afecta todos os domínios da nossa existência. E não pode ser realizada, a menos que todas as energias da nossa existência se dediquem a mantê-la” (Bento XVI, “The Essential Pope Benedict XVI: His Central Writings and Speeches”, 2007). Palavras encantadoras de Thomas Merton: “Acima de tudo, a fé é a abertura do olho interior, o olho do coração, para ser preenchido com a presença da luz divina” (“The Pocket”, Thomas Merton, 2005).

A fé é uma graça divina, um dom de Deus. É um conhecimento certo porque Deus – em quem confio totalmente – é a Verdade, a Primeira Verdade, e não pode mentir. Por exemplo, acredito na presença real de Jesus na Sagrada Eucaristia, embora não veja: acredito no Filho de Deus, Jesus Cristo, e nas suas palavras. Para poder acreditar, então, é necessária a graça do Espírito Santo, o dom interior da graça divina: a fé é obra da graça, que é um dom de Deus. São Paulo: Ninguém pode dizer «Jesus é o Senhor», a não ser pelo Espírito Santo (1 Cor., 12, 3), que é o santificador. A graça é a graça divina, o dom de Deus com o qual se pode dar o salto da fé. São Tomás de Aquino: “Deus é aquele que causa a fé no crente, inclinando a sua vontade e iluminando a sua inteligência” (“De Veritate” n.º 27).

A fé é útil quando chega a cruz. Uma das dificuldades habituais na vivência da nossa fé cristã é a chamada noite escura da fé, de que falam os místicos, incluindo em particular São João da Cruz, Santa Teresa do Menino Jesus e Santa Teresa de Calcutá (Ortega Villaizán). Santa Teresa de Ávila diz-nos que esta vida é como “uma noite numa má estalagem” (“Caminho da Perfeição”, 40, 9). A menos que sejamos capazes de integrar os nossos sofrimentos e desgraças da vida – a cruz – no radar e na influência da caridade fiel e esperançosa, caminharemos tristes e a mancar quando a cruz chegar. Certamente, ela chegará mais cedo ou mais tarde, pois a cruz faz parte da vida. Mas a cruz não é a palavra principal da vida, o amor é: amor fiel e esperançoso. A cruz leva à nossa ressurreição com Deus. “Precisamos deixar a iniciativa nas mãos de Deus, trabalhando nas nossas almas, seja directamente na noite da aridez e do sofrimento, seja indirectamente através de eventos ou de outros homens” (Thomas Merton).

A fé é alegre, uma bênção maravilhosa. Sempre alegre (com alegria espiritual), embora haja um tempo para rir e um tempo para chorar. Como São Domingos: durante a noite, ele chorava em oração e fraternidade pelos pecadores e pelos pobres, e durante o dia ele se alegrava: nunca pedindo recompensa, ele apenas falava do Senhor! Quão alegres eram – mesmo quando perseguidos pela venda do Nome – os convertidos no início da pregação apostólica (cf. Actos 16, 29-34). E quão abençoada era Maria, porque acreditou (cf. Lc., 1, 45); abençoados – como nós – aqueles que não viram (o Senhor Ressuscitado) e acreditaram (cf. Jo., 20, 29). Não é de admirar: todos os santos – crentes firmes – são muito felizes, mesmo; ou talvez, principalmente, quando carregam uma cruz pesada. Lembro-me das palavras do profeta Habacuque (rezamo-las na oração da manhã de sexta-feira, segunda semana): «Ainda que a figueira não floresça, nem haja fruto nas videiras, (…) e não haja gado nos currais, eu me alegrarei no Senhor» (Hab., 3, 17-18). Somos peregrinos de esperança fiel. Santo Agostinho inspira-nos: «Canta enquanto caminhas e caminha como quem espera chegar».

A fé é luz. A visão da virtude da fé – a nossa luz – está na nossa jornada de vida, certa, mas obscura, não evidente: «Porque agora vemos como num espelho, de forma obscura» (1 Cor., 13, 12). “A fé ilumina a vida e a sociedade” (LF n.º 55). A nossa tarefa de fé: testemunhar o amor: caridade fiel e esperançosa.

Palavras para reflectir: “A fé ensina-nos a ver que cada homem e cada mulher representam uma bênção para mim, que a luz do rosto de Deus brilha sobre mim através dos rostos dos meus irmãos e irmãs” (LF n.º 54).

Pe. Fausto Gomez, OP

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