Papa critica «hipocrisia» da comunidade internacional
O Papa encontrou-se ontem com um grupo de vítimas da violência no Leste da República Democrática do Congo (RDC), tendo condenado a «exploração sangrenta e ilegal da riqueza» do País, com impactos na vida de milhões de pessoas. «A guerra desencadeada por uma insaciável ganância de matérias-primas e de dinheiro, que alimenta uma economia de guerra e que exige instabilidade e corrupção. Que escândalo, que hipocrisia: as pessoas são violadas e assassinadas, enquanto os negócios que provocam violências e mortes continuam a prosperar», disse, na Nunciatura Apostólica de Kinshasa. O encontro contou com a apresentação de testemunhos de vítimas de várias localidades do Leste da RDC, maior país da África subsaariana. «Fica-se chocado. E não há palavras; resta-nos apenas chorar, permanecendo em silêncio», confessou Francisco.
Nas últimas semanas, a região leste da RDC registou a morte de mais de duzentos civis e a fuga de mais de cinquenta mil pessoas nas províncias de Ituri e Kivu do Norte; mais de 1,5 milhões de pessoas permanecem na região, como deslocados internos.
«Bunia, Beni-Butembo, Goma, Masisi, Rutshuru, Bukavu, Uvira… são lugares que os meios de comunicação internacionais quase nunca mencionam: lá e noutros lugares, tantos irmãos e irmãs nossos, filhos da mesma humanidade, são reféns da arbitrariedade do mais forte, de quem tem na mão as armas mais potentes, armas que continuam a circular», denunciou o Papa.
Francisco e a sua comitiva ouviram o testemunho um adolescente que perdeu o irmão, viu o pai ser morto à sua frente e não voltou a ter notícias da sua mãe sequestrada, acompanhado por outro menino, que viveu nove meses raptado.
Os relatos, na primeira pessoa, testemunharam crimes de violação, canibalismo forçado, escravatura sexual e outros actos de crueldade extrema.
A RDC, com mais de cem milhões de habitantes, tem a maior população de deslocados internos da África, num total de 5,6 milhões de pessoas, e recebe 522 mil refugiados de países vizinhos.
Os depoimentos recordaram o ataque a um campo de deslocados, em Fevereiro de 2022, que matou 63 pessoas, incluindo 24 mulheres e dezassete crianças.
«As vossas lágrimas são as minhas lágrimas, a vossa dor é a minha dor. A cada família enlutada ou desalojada por causa de aldeias incendiadas e outros crimes de guerra, aos sobreviventes das violências sexuais, a cada criança e adulto ferido, digo: estou convosco, quero trazer-vos a carícia de Deus», afirmou Francisco.
O Papa assumiu a sua «indignação» perante estes conflitos, alimentados por tensões internas e interesses estrangeiros, que obrigam milhões de pessoas a abandonar suas casas e provocam «gravíssimas violações dos Direitos Humanos».
Hoje, 3 de Fevereiro, a visita papal estende-se até ao Sudão do Sul.
In ECCLESIA