«Temos de ir ao encontro das audiências, onde quer que elas estejam»
O acordo assinado no início da semana entre a Eternal World Television Network (EWTN) e a TV Cabo Macau permite que o maior grupo católico de Comunicação Social do mundo esteja a transmitir, pela primeira vez, em território da China. O responsável pelas estratégias de marketing da empresa para a região da Ásia-Pacífico mostra-se entusiasmado com a possibilidade da Palavra de Deus dispor agora de uma plataforma privilegiada para chegar aos lares e quartos de hotel do território. A EWTN quer, no entanto, mais e propõe-se maximizar a presença noutras plataformas, nomeadamente nas redes sociais. A Eternal World Television Network – sustenta Edwin Lopez – tem a responsabilidade de ir ao encontro das audiências, onde quer que elas estejam.
O CLARIM– É a primeira vez que a EWTN transmite para território chinês. Macau tem, ainda, um estatuto político diferente e não é propriamente a China continental. O objectivo da EWTN é, de alguma forma, chegar à República Popular da China?
EDWIN LOPEZ– Sempre olhámos para o globo na perspectiva de uma Igreja universal e nunca deixámos que a geografia ou mesmo que as diferenças políticas se afirmassem como uma limitação. A nossa missão é, de facto, fazer com que os católicos ajam como católicos. Ainda que exista um único católico lá fora, sentimos que o nosso dever é o de sermos capazes de alcançar esse católico, seja através da televisão por cabo, da imprensa, da rádio ou mesmo das redes sociais. O nosso propósito é o de nutrir, alimentar a sua fé católica. É essa a nossa esperança, é esse o nosso objectivo. De que forma é que podemos fazer o que nos propomos? Diria que depende da Divina Providência.
CL– O Governo da República Popular da China e a Santa Sé assinaram um acordo, em Setembro último, que visa a normalização das relações entre ambos os Estados. O início das transmissões em Macau tem algo que ver com este acordo?
E.L.– Não, nada. Foi uma coincidência que se tenha materializado neste momento, numa altura em que o Vaticano e a China estendem a mão um ao outro. Trata-se apenas de uma coincidência. O acordo foi assinado em Setembro do ano passado, mas a possibilidade da ETWN poder vir a transmitir em Macau começou a ser equacionada no início de 2018. Começámos a discutir esta possibilidade nessa altura, mas foi algo que nunca pensámos que pudesse vir a acontecer. É assim que a ETWN tem vindo a trabalhar ao longo dos últimos 38 anos. Confiamos e dependemos da Divina Providência. A nossa fundadora sempre disse que “a não ser que estejamos disponíveis para actuar de forma ridícula, Deus não agirá de forma miraculosa”. É um pensamento bonito, não é? Nesta região da Ásia-Pacífico somos apenas seis, mas temos muitos voluntários e conseguimos garantir a cobertura de uma série de países. Estamos completamente atónitos com a forma como tudo se está a desenrolar. Não sei se as pessoas comuns entendem que se trata tudo de uma obra de fé. A fé é exactamente isto. Quando se trabalha com coragem, além das fronteiras da nossa vida de conforto, quando a dúvida bate à porta e os tempos são tenebrosos, quando as trevas nos rodeiam, é aí que a fé floresce. A EWTN é uma história de fé, da força da Divina Providência. Como é que se tornou a maior televisão católica do mundo? Divina Providência!
CL– Que importância tem, hoje em dia, a tele-evangelização? O seu país, as Filipinas, tem uma enorme população católica, mas as condições geográficas não são as melhores. Trata-se de um arquipélago com milhares de ilhas, muitas delas remotas. A televisão é uma boa forma de disseminar a palavra de Deus?
E.L.– Trata-se de uma pergunta interessante. De facto, sempre foi muito tentador procurar alcançar os outros através da apresentação de conteúdos que sejam agradáveis, através de entretenimento ou de música. Mas sabemos muito bem que quando as pessoas se deparam com um cancro, quando a família se está a dissolver, quando um filho cai nas malhas da droga, nesse momento não é entretenimento que as pessoas procuram. Nesse momento, as pessoas procuram outra coisa que não o prazer. Procuram sobretudo respostas. A nossa missão é a de garantir que estamos aqui, que estamos se possível em todo o lado, que usemos todas as plataformas que estão ao nosso alcance com o propósito de assegurar que lhes podemos dar as respostas que procuram. Ao final do dia, qualquer que seja a quantidade de dinheiro que se possui, se uma tragédia afectar uma família, essa família vai procurar respostas. Acreditamos que podemos dar essas respostas. O nosso trabalho não é o de ser como a HBO ou a ESPN; não é o de fazer rir as pessoas ou o de as entreter. Não. O nosso ramo não é o do entretenimento. Há um momento em que as pessoas não se interessam pelo que transmitimos. Mas assim que são atingidas por um problema que não pode ser resolvido, nem com prazer, nem com entretenimento e nem com dinheiro, sabemos que procurarão algo mais e sabemos que podemos dar a resposta pretendida.
CL– Com que tipo de expectativas é que a EWTN entra em Macau? E por que razão a empresa optou por Macau e não por Hong Kong?
E.L.– Dir-lhe-ia uma vez mais que se tratou da Divina Providência. Foi a TV Cabo de Macau que se manifestou aberta a esta possibilidade. Não podemos impôr a nossa vontade. Se Macau manifestou abertura é porque Deus quis que Macau fosse a nossa primeira base nesta região. Quando dizia que a nossa ambição é a de alcançar o maior número de católicos possível… Consegue imaginar quantos lares, quantos quartos de hotel em Macau recebem os conteúdos da TV Cabo? Alguns dos hóspedes dos hotéis podem ser católicos que se encontram de visita a Macau. Não serão necessariamente da China, mas de outros lados. É este tipo de pessoas que queremos alcançar; contribuir para que os católicos possam agir como católicos através de uma programação católica sólida. Não queremos convencer ninguém, não queremos mudar as pessoas. Não é essa a nossa missão. Mas se alguém for católico, vai sentir a necessidade de ser nutrido espiritualmente. A nossa missão é fazer com que este apoio esteja disponível através das plataformas que a Divina Providência coloca à nossa disposição. Neste momento, essa plataforma é a TV Cabo Macau. Vamos agarrar esta possibilidade e tirar o máximo proveito dela.
CL– O acordo assinado com a TV Cabo é apenas para a transmissão de conteúdos? Ou existe a possibilidade de, no futuro, a EWTN poder vir a produzir e a difundir conteúdos locais?
E.L.– É uma possibilidade. Estaremos certamente interessados em incluir na nossa programação conteúdos locais. Já estamos a fazer isso na Austrália e na Nova Zelândia. Estamos a fazê-lo também na Índia, depois de termos assinado recentemente um acordo com a Mother TV. A Igreja Católica é uma Igreja universal e se nos fosse dada a possibilidade de conduzir um intercâmbio de conteúdos, seria extraordinário.
CL– Em termos globais, como referia, a EWTN é a maior televisão católica do mundo. O grupo tem planos para estender ainda mais essa presença?
E.L.– Seguramente. De facto, olhamos com muita seriedade para a maximização do uso de outras plataformas, como os novos meios de comunicação, tendo em conta particularmente as novas audiências com que nos deparamos. Há especialistas que dizem que uma fatia importante da audiência se está a afastar da televisão e da rádio, ainda que sejam consumidores ávidos da Internet. A nossa missão passa por garantir que conseguimos estar onde eles estão. Se eles estiverem disponíveis nas redes sociais, a nossa missão é a de estar nas redes sociais. A EWTN pode parecer conservadora, apelar sobretudo a pessoas que estão na casa dos quarenta e dos cinquenta anos, mas nas redes sociais estamos a tentar alcançar as novas gerações através da Agência Católica de Notícias. Temos mais de um milhão de seguidores. Por outro lado, temos uma outra marca nas redes sociais que se chama “Church Pop” e que se destina aos mais jovens. Com ela tentamos alcançar os jovens até aos 24 anos. Estamos a procurar conduzir um ajustamento não só em termos de programação, mas também em relação às plataformas que usamos. Temos de ir ao encontro das audiências, onde quer que elas estejam.
CL– Com que desafios se depara a EWTN?
E.L.– Desafios? Bem, eu diria que são sobretudo desafios financeiros. Há medida que vamos crescendo, vamos necessitando de mais recursos financeiros, mas até ao momento Deus tem-se revelado generoso connosco. Temos vindo a operar tendo por base os donativos feitos por espectadores de todo o mundo e são eles que têm vindo a garantir a sobrevivência da EWTN ao longo dos últimos 38 anos. Pessoas que estudaram economia, que têm doutoramentos em economia, não conseguem entender como é que uma entidade como a EWTN conseguiu sobreviver tendo por base apenas a Divina Providência. A única explicação que podemos adiantar é a da nossa fé. Há 38 anos que assim é. A Madre Angélica diria «Se Deus tiver que nos derrubar, ele derrubar-nos-á. Talvez ele nos queira conduzir a algum lado».
Marco Carvalho