O tempo tem passado num ritmo calmo, sem grandes sobressaltos, apesar de começar a estar um bocado ansioso por fazer a travessia para as ilhas holandesas e para o Panamá. Penso que só vou descansar e relaxar quando estiver ancorado do lado do Pacífico, esperando calmamente por uma janela meteorológica que permita realizar a viagem que nos levará às paradisíacas ilhas das Marquesas, já na companhia da NaE, em Abril-Maio (nunca antes devido ao perigo das tempestades). O reencontro familiar dar-se-á em Dezembro.
Este vai e vem pela cadeia das ilhas das Caraíbas, velejando apenas com a Maria e com cachorro, é uma perda de tempo, embora assim tenha de ser pois a viagem de quatro dias rumo a oeste só pode ser feita, com maior margem de segurança, depois do final da época das tempestades, isto é, em Novembro, de preferência depois da segunda semana. Até lá há que ter paciência e ir alternando de ilha em ilha, tentando evitar o mau tempo e, ao mesmo tempo, aproveitando para descansar e preparar o barco, tanto a nível técnico como a nível da alimentação.
A nossa estada em Martinica prende-se com duas razões: a primeira, para reabastecer o Dee de tudo o que não se encontra nas outras ilhas – queijos, vinhos, sumos, carnes e outros produtos necessários que se encontram em maior variedade e com muito melhor preço. A segunda, de carácter técnico, tem a ver com o ângulo de navegação.
Nesta época do ano os ventos sopram, predominantemente, de Este ou Sudeste, pelo que quanto mais a norte for feita a partida mais vantajoso será o ângulo de navegação. O Dee não está adequadamente equipado para navegar com vento de popa; não temos balões nem paus para esticar as velas para as laterais, de forma a que apanhem mais vento de través, essencial para que a velejada seja mais rápida e mais confortável. Até ao momento ainda não conseguimos arranjar tal equipamento, uma vez que é demasiado caro para o nosso orçamento. A solução de recurso poderá passar por uma cana de bambu, com dimensão e grossura suficiente.
Há vários exemplos de barcos que completam a travessia do Pacífico com canas de bambu. Os capitães portugueses que entregam veleiros novos no Brasil utilizam ripas de madeira para o efeito de perfil em L, para uma maior resistência estrutural. Atam várias ripas de madeira de comprimento suficiente, recorrendo a este artefacto para manter as velas abertas. Não usam os paus de alumínio da embarcação, pois tudo tem de ser mantido em condições até à entrega ao proprietário do outro lado do Atlântico. Não pode haver o mínimo de riscos no material, caso contrário a entrega pode ser recusada. Não tinha conhecimento desta engenhoca; soube pelo nosso amigo do Gentileza, a quem o veleiro foi entregue desta forma. O desenrascanço tão característico dos português também se aplica na vela. Ao que parece, a coisa resulta muito bem. Todos os capitães que entregam veleiros fazem-no e são várias as marinas brasileiras onde se pode encontrar as peças de madeira.
Entretanto, aqui em Bequia, temos passado os dias entre a praia e o barco. Na primeira semana fomos apenas duas vezes a terra – uma vez para comprar alguma comida para cozinhar a bordo, e outra para comprar uma correia para o alternador porque o “stock” está a ficar reduzido. Com os problemas que temos tido não queremos ficar apeados. Felizmente, desde a mudança do alternador, ainda não rebentou mais nenhuma, sendo que até temos ligado o motor diariamente para ir repondo os níveis das baterias (estavam muito em baixo depois de várias semanas sem serem carregadas convenientemente). Como não sabemos até quando vamos viver neste estado de graça, não queremos ser apanhados desprevenidos. Ao mesmo tempo temos pesquisado em sites da China, com o objectivo de adquirirmos um alternador com uma potência a rondar os 300 amperes, contudo, ainda não tivemos sorte. Tudo o que encontramos tem metade da potência e é extremamente caro.
Para finalizar, para quem não tenha tido conhecimento, no passado fim-de-semana, no noticiário de sábado (24 de Outubro) do Canal Macau, foi transmitida uma entrevista com a NaE, gravada na RAEM, na Marina do Lamau, durante a qual falou sobre a nossa vida a bordo (as vantagens e as privações, entre outros assuntos que os nossos seguidores gostam sempre de estar a par). A ligação ao noticiário pode ser encontrada na nossa página do Facebook (www.facebook.com/sailingdee), ou na página da TDM. O espaço noticioso foi apresentado pelo nosso amigo Jorge Silva.
Na altura em que este texto for publicado já deveremos estar na ilha de St. Lucia, ou mesmo em Martinica. A saída oficial do País está agendada para segunda-feira (26 de Outubro), de onde rumaremos para a ilha de São Vicente, zarpando depois, no dia seguinte, de manhã cedo, para o sul da ilha de St. Lucia. Partiremos então para St. Anne, na ilha de Martinica. Esperemos que as condições meteorológicas cooperem connosco para que rapidamente possamos chegar a território francês e assim dar início ao processo de preparação para a viagem que nos levará a Aruba, Bonaire e Curacao.
JOÃO SANTOS GOMES