CISMAS, REFORMAS E DIVISÕES NA IGREJA – CCXLI

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O Pentecostalismo – XIII

Uma das questões que mais assalta quem examina o fenómeno religioso na actualidade, é o porquê do Pentecostalismo ter crescido tanto na América Latina? Na verdade, a interrogação é suscitada, na base, pelo facto de dezenas de milhões de latino-americanos terem deixado (e estão a deixar) a Igreja Católica Apostólica Romana nas últimas décadas e abraçado o cristianismo pentecostal. Sim, é um “êxodo” maciço e… alarmante.

Dezenas de milhões de latino-americanos abandonaram a Igreja Católica Apostólica Romana nas últimas décadas e abraçaram o cristianismo pentecostal, isto de acordo com várias pesquisas científicas efectuadas em dezoito países latino-americanos, além de Porto Rico. Na realidade, actualmente, quase um em cada cinco latino-americanos descreve-se como protestante e, em todos os países pesquisados, a maioria – entre esses novos protestantes – identifica-se como pentecostal ou pertencente a uma denominação pentecostal. Os pentecostais, recorde-se, partilham muitas crenças com outros protestantes evangélicos, mas colocam uma ênfase maior nos chamados “dons do Espírito Santo”, que se revelam no dom de falar línguas, curar pela fé e profetizar, como temos visto. Quem nunca viu nalguns canais televisivos dessas denominações esses actos “espirituais” tão impactantes nas repletas assembleias de fiéis que a eles assistem ao vivo? Com mais de trezentos milhões de seguidores em todo o mundo, com grande crescimento em África e na América Latina, o Pentecostalismo é cada vez mais um fenómeno global. Pouco mais de cem anos depois, o movimento de reavivamento religioso nos Estados Unidos expande-se e cativa fiéis em quase todas as confissões cristãs.

O AVANÇO DO PENTECOSTALISMO

Há uma mudança, cuja maior expressão é o afastamento do catolicismo romano em direcção praticamente unívoca ao protestantismo pentecostal. Na América Latina, em particular, um alfobre tradicional de vocações e também de fiéis e fervor religioso. Ou já foi mais, talvez… Onde a Igreja Católica mais crescia, no “mundo tropical” – América Latina e África –, é onde a mensagem pentecostal ganha mais e mais adeptos.

O Pentecostalismo absorveu com muito sucesso a cultura latino-americana, revela um estudioso norte-americano das religiões contemporâneas, Andrew Chesnut. Este estudioso dá o exemplo da música: a que se ouve nas igrejas pentecostais tem os mesmos ritmos que as pessoas apreciam quando estão fora da igreja. Não há solenidade ou beleza litúrgica no Pentecostalismo, naquilo que é a tradição, mesmo que com “aggiornamentos” (“update”, “actualização”). Os sons de rua, de salões, de festas, de improvisos ou indígenas, ganharam uma correspondência espontânea nas celebrações pentecostais. Há uma continuidade da rua, da vida da cidade e quotidiana, para os salões de reavivamento. De facto, em apenas um século, o Pentecostalismo tornou-se mesmo “indígena”, ou “latino-americanizado”, numa maior medida do que o catolicismo romano nos seus quatro séculos na América Latina.

Mas existem outros factores. Por exemplo, alguns latino-americanos que cresceram como católicos, converteram-se ao Pentecostalismo num momento de crise da sua saúde. Esta conversão pela saúde sucedeu porque o Pentecostalismo coloca uma ênfase enorme na cura pela fé. Para vários analistas, esse ministério de cura é, tradicionalmente, um dos vectores propulsores do “boom” pentecostal, desde a sua fundação, mas com maior impacto desde há uns cinquenta anos na América Latina e em África, onde os flagelos sanitários têm sido frequentes e o fascínio destas curas se terá tornado por isso mais atractivo.

Depois temos uma correspondência de estilos entre pregadores e congregação. Ou seja, não uma clara distinção na linguagem usada por ambas as partes, apenas no tom mais elevado dos pregadores, por vezes histriónico, de tão inflamado e reverberado. No mais, quase tudo corresponde. Ou seja, muitas vezes os pregadores são também iletrados, pelo que falam com o seu rebanho da mesma forma que as pessoas na América Latina falam umas com as outras, quotidianamente. Tornam-se assim muito mais inteligíveis e sem barreiras de comunicação verbal. Além da linguagem, também se assemelham no aspecto e na forma de se apresentarem, e tendem a parecer-se, a identificar-se, com os seus congregados. Temos exemplos, como na Guatemala, onde muitos pregadores são maias, como na região de Iucatão (México), ou no Brasil, onde muitos ministros são afro-brasileiros. Há uma identidade étnica (e linguística) que gera correspondência e identificação entre ambas as partes. Alguns analistas consideram existir aí uma pedra de toque para esse crescimento pentecostal na América Latina, comparando com o contraste na Igreja Católica, onde a maioria dos sacerdotes pertence a uma elite. Estes são ou caucasianos ou mestiços, havendo muitos que na verdade são mesmo da Europa ou da América do Norte.

Há também certos grupos ou tipos específicos de pessoas, comunidades enfim, na América Latina, que são especialmente atraídos pelo Pentecostalismo. Ou o seu desenvolvimento, crescimento ou desenquadramento sócio-económico em relação ao mundo actual ou do contexto católico vigente, fizeram com que esses grupos se convertessem ao Pentecostalismo. De facto, o mesmo investigador, Andrew Chesnut, considera que, historicamente, o Pentecostalismo atraiu mais os pobres e os imigrantes. Mas, mais recentemente, começou a atrair profissionais de classe média, como médicos e advogados, que formariam as suas próprias denominações no Brasil e na Guatemala, por exemplo. A ênfase na “cura interior”, a responsabilidade individual e a teologia da prosperidade são especialmente atraentes para esses pentecostais mais ricos, provenientes de elites até, mas que se revêem nestas denominações devido àquelas crenças.

Em relação aos pobres, estes são manifestamente atraídos pela teologia da prosperidade, também conhecida como o “evangelho da saúde e da riqueza”. Esta atracção dá aos que nela acreditarem a esperança de que podem progredir independentemente da sua posição ou do grupo, comunidade. As pessoas são assim formatadas de que, com fé suficiente e um rogo ou petição activos de e a Deus, as coisas que cada crente quiser na vida eventualmente serão suas um dia, por via do seu fervor religioso. Para quem tem pouco, ou nada, eis uma mensagem muito poderosa e eficaz, o estímulo para não ir à igreja e entrar na casa ao lado, onde existe uma congregação pentecostal. Onde acreditar firmemente na prosperidade pode ser a chave, simples, para uma vida melhor, diferente daquela onde, na opinião dos pobres, vegetaram enquanto foram fiéis católicos. Esta é uma narrativa frequente, nas conversões pentecostais.

Vítor Teixeira 

Universidade Fernando Pessoa

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