A conversa que nunca existiu
“– Maria, acorda!”
“– Huh? O quê? Sabes que horas são?”
“– Sei. Mas temos que sair daqui, agora mesmo.”
“– O que é que estás a dizer?”
“– Temos que sair daqui. Herodes quer matar o nosso Bebé!”
“– E onde é que tu ouviste isso?”
“– Bem, o Anjo disse-me.”
“– Quando?”
“– No sonho.”
“– Ai, José, tu não podes estar sempre a acreditar nos sonhos. Além disso, se é assim tão importante, o Anjo também me teria dito a mim! Vai dormir e falamos sobre isto amanhã…”
Imaginem o que teria acontecido se esta conversa tivesse tido lugar: não teria havido o Messias, nem o Natal, nem a Igreja, nem os Sacramentos, nem a Salvação, nem um futuro para mim ou para vós, nem sentido para a Vida, nem nada que valesse a pena lutar por isso.
“Não te esqueças: muitas coisas grandiosas dependem de que tu e eu vivamos como Deus quer” (São Josemaría, Caminho 755).
São Paulo explica: «De facto, tal como pela desobediência de um só homem, todos se tornaram pecadores, assim também pela obediência de um só todos se hão de tornar justos (Romanos 5:19)». Quão grande é a diferença entre a desobediência e a obediência de apenas um homem!
A obediência é uma consequência imediata da humildade. Jesus mostrou-nos o caminho: «Ele rebaixou-se a si mesmo, tornando-se obediente até à morte, e morte de cruz (Filipenses 2:8)»
Quando Deus chamou Abraão este já tinha setenta e cinco anos (Génesis 12:1-3) e estava pronto para a reforma. Ainda assim obedeceu à chamada de Deus, esperando até ter cem anos (foram mais vinte e cinco anos!) para que Deus cumprisse a Sua promessa de lhe dar um filho (Génesis 21:5).
Abraão obedeceu, Moisés obedeceu, Joshua obedeceu, Samuel obedeceu, Maria obedeceu, José obedeceu, Pedro obedeceu… todos quantos se tornaram numa personagem principal da História da Salvação teveram que obedecer. Tu e eu também somos chamados para nos tornarmos numa personagem desta História. Tu e eu também somos chamados à obediência.
Uma das dificuldades da obediência é que o desejo de Deus, às vezes, tem a tendência para chocar com o nosso desejo. O Anjo disse a José: «Levanta-te, toma o Menino e sua Mãe, foge para o Egipto e fica lá até que eu te avise, pois Herodes procurará o menino para o matar (Mateus 2:13)».
Nós não gostamos de mudanças súbitas de planos, não é? E José também teve que enfrentar essa situação. Além disso, ele poderia ter pensado; “Que má organização… E eu que pensava que Deus sabia tudo!” Mas de qualquer forma obedeceu.
Por vezes a dificuldade está no facto de que Deus nem sempre especifica os detalhes. As instruções do Anjo eram para permanecer no Egipto «até que eu te avise (Mateus 2:13)». “Até que eu te avise” não é muito explícito, não é? José poderia ter solicitado mais alguns detalhes: “E isso significa uma semana, um mês, um ano…?” Mas as instruções que recebeu eram apenas aquelas, e ele obedeceu.
Outra das dificuldades com a obediência é que Deus nem sempre nos contacta directamente. Frequentemente expressa-Se por meio de intermediários. Samuel soube dos desígnios de Deus por intermédio de Eli (cf I Samuel 3), Saul ficou a saber por Ananias (cf Actos 9). E ainda pode acontecer que o intermediário não seja fácil de encontrar. Por vezes Ele fala através de circunstâncias que nós encontramos por nós próprios. Teresa de Lisieux tinha sonhos em que era uma mártir. Mas não havia qualquer possibilidade de se tornar numa mártir no interior do convento. Ao meditar sobre o capítulo 13 da Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios, concluiu que Deus apenas queria que ela fosse amor, isto é, que personificasse a Caridade nos seus contactos com as outras irmãs.
Na História da Salvação cada milagre é um relato de obediência. Os milagres acontecem quando, com a confiança plena na Sabedoria, Bondade e Poder de Deus, nós rezamos: “Seja feita a Sua vontade!”.
Pe. José Mario Mandía