Redireccionemos o Advento para Cristo
São muitos os sinais actuais de confusão, guerras de armas e de opiniões. Os efeitos estão à vista: muitas feridas, dores e desgastes. Procura-se harmonia, saúde e esperança que modas e pressões retorcidas mais dificultam. Não faltam ideias, teorias, cristãs e pagãs, para chegar à esperança que psicólogos, sociólogos, teólogos e pastores tentam propor. Entretanto as crises e confusões alimentam o cansaço e a incoerência na procura.
Leon Festinger (1957), nos anos 50 do Século XX, estudou a dissonância cognitiva como obstáculo a viver em coerência pessoal. Para este autor, a dissonância cognitiva é uma tensão e conflito entre convicções pessoais de valores e sentido de vida e pressões contrárias. Para reduzir as tensões recorre-se ao auto-engano próprio e a modas de momento. Na prática, tenta-se reduzir a ansiedade com atitudes de indiferença do tanto faz. Leon Festinger e investigadores associados concluíam que as pessoas sofriam de viver na incoerência entre o agir acertado e ideias retorcidas, mentindo a si mesmas e seguindo pressões de moda para reduzir esse mal-estar. Hoje, a dissonância cognitiva torna-se mais apertada devido à indiferença difusa entre o bem e o mal, o certo, o errado e a mentira. A atitude de tanto faz é comum na família, na escola; nos jovens e adultos, e concorre para uma cultura da banalidade e desagregação.
Será que hoje, ao contrário de há setenta anos, há mais pessoas a viverem na inconsistência? Na ansiedade, certamente! Esta dissonância de mente-coração e relacionamentos, desgasta e manifesta-se na irresponsabilidade e perturbações mentais, confusões do pensar de vida insensata. As pessoas com mais literacia defendem-se, recorrendo às receitas dos livros de auto-ajuda. Há de tudo nessas receitas avulsas, religiões e Igrejas cristãs. Contudo, outras ideias da Comunicação Social, da rua e das redes sociais, continuam a alimentar a dissonância, confusões e ansiedades. Será que hoje, ao contrário de há setenta anos, mais pessoas vivem com dissonâncias cognitivas e inconsistências de pensar e agir? As estatísticas de saúde e perturbações mentais mostram alguns indícios disso; os consumos destrutivos de drogas, jogos aditivos de redes, álcool e outros vêm aumentando.
Alguns pais, educadores e técnicos propõem medidas brandas, e outros esquecem que tanta gente já ferida e cansada da vida, desestruturada e derrotada, tem as defesas interiores do coração e dos neurónios desligadas pelas armadilhas afectivas e químicas do cérebro. Em tempos, dei comigo a reflectir sobre duas abordagens de ajuda: dada a pessoas com capacidades limitadas; e a pessoas com literacia. As abordagens a usar para as cerca de vinte por cento de pessoas com limitações têm de ser mais simples das usadas com as 30-40 por cento de pessoas de maior literacia e para as de literacia intermédia. Não raro algumas ajudas, em vez de levarem à esperança e sentido de eternidade, acabam no cemitério. E outras, sobre problemas complexos e ideias em conflito, resultam em mais ansiedade. Até a acção pastoral adequada para as elites da Igreja corre o risco de ficar submersa em ruídos de ideias contraditórias. E alguns dos oradores reconhecem que se tem que se regressar a Jesus Cristo, à Fé e confiança n’Ele, e nas suas palavras do Evangelho cuja clareza oferece âncoras e chaves de esperança de vida eterna. E são as únicas que podem dissipar as trevas culturais do caos actual.
Não bastam abordagens católicas facilitadoras e vagas, para desocultar o sentido da esperança cristã. Jesus declarou que era o Rei que veio a este mundo, mas “não é deste mundo”, e nos diz que estamos neste mundo, mas também não somos daqui. Razão teve o Papa Francisco, que na entrega da Cruz e do Ícone de Maria dos jovens portugueses aos sul-coreanos, na Praça de São Pedro, no dia de Cristo Rei, os alertou, com clareza, tendo resumido: “de olhar fixo em Jesus, sua cruz e em Maria”, sejam fortes com a certeza de “sermos salvos e acompanhados por Maria nossa mãe”, para vivermos sem medo, sem cedências e “sem maquilhagens espirituais” (cf. Homilia da Missa). Resistam à tentação de serem “estrelas por um dia” para serem “vistos, aprovados e elogiados”; não “vendam os vossos ideais e dignidade” (fim de citação).
Estamos praticamente no 3º Domingo do Advento. Está este mês a ser de magia e iluminações estonteantes? Consumo de comes-e-bebes à farta? Espera-se que tanta luz não esconda o Menino Deus presente no meio do povo, nem leve a esquecer os irmãos pobres. Advento é vinda, de quem? De Jesus Cristo e do amor e paz que Ele oferece aos cansados, dissonantes e esgotados na Peregrinação de Esperança, rumo ao Jubileu 2025.
Pe. Aires Gameiro
Membro da Ordem Hospitaleira de São João de Deus