De onde nos vem a dignidade?
Todos sabemos que as crianças devem respeitar os seus pais, os estudantes devem respeitar os seus professores, os subordinados devem respeitar os seus superiores. E, o contrário? Deverão os pais respeitar os seus filhos? Os professores respeitar os seus alunos? Os superiores respeitar os seus subordinados? Porque é que nos devemos respeitar mutuamente? Qual é a base da dignidade? De onde nos vem a dignidade?
É coisa de ricos? Se assim for, então os pobres não merecem respeito.
É por causa das casas? Então os sem abrigo não merecem respeito.
Deriva da educação? Então os que não puderam frequentar a escola por alguma razão, ou sofrem de qualquer problema mental também não merecem respeito.
Por causa da idade? Então as crianças e os bebés no ventre materno não merecem ser respeitados.
Por se ser saudável? Assim, pessoas com incapacidades ou doenças não merecem respeito.
Por causa da aparência? Assim, as pessoas que consideramos “feias” não merecerão respeito.
É a eloquência? Então os mudos e os gagos não merecem respeito.
Deriva do Poder? Então os cidadãos comuns, os subalternos em geral, não merecem respeito.
Devido a uma capacidade artística? Sendo assim os que não souberem dançar ou cantar não deverão merecer respeito.
É uma crença? Então os que não acreditam ou têm diferentes crenças não merecem respeito.
Devido à raça? Então Hitler estava certo ao exterminar os Judeus.
Será porque os seres humanos têm sentimentos? Mas é óbvio para nós que os animais também têm sentimentos. Também têm medo, sentem cansaço, ficam alegres ou zangados. Mas nós não respeitamos os seres humanos da mesma forma que respeitamos os animais. Ninguém reclamará se eu matar um porco para o assar, não é?
Se a dignidade não deriva de nenhum dos pressupostos anteriores, então, vem de onde?
A riqueza, as propriedades, a instrução, a idade, a saúde, a aparência, o poder, a crença, a raça, todas juntas compõem a diversidade e a diferença. A dignidade deve vir de algo comum a todas. E, o que temos em comum? A nossa natureza humana. Todos os seres humanos merecem respeito.
Além disso, a Igreja Católica apresenta um argumento ainda mais forte em defesa da dignidade humana. «Então Deus criou o homem à sua própria imagem, na imagem de Jesus Ele criou-o» diz o livro do Génesis (1:27). Homem e Mulher devem ser respeitados não apenas por serem humanos, mas porque são a imagem de Deus. Uma ofensa contra um homem ou uma mulher será, sempre, uma ofensa a Deus. É por isso que os Dez Mandamentos são tão importantes: eles garantem que os seres humanos sejam tratados como pessoas e não como coisas.
Os Mandamentos não suprimem a dignidade humana – aumentam-na e protegem-na. O Catecismo da Igreja Católica (CIC) ensina-nos: «Sendo uma imagem de Deus, o indivíduo humano possui a dignidade de ser uma pessoa, que não é, apenas algo, mas alguém. É capaz de ter conhecimento próprio, posse de si próprio e livremente oferecer-se e entrar em comunhão com outras pessoas. E é chamado, pela Graça de Deus a uma aliança com o seu Criador, a oferecer-lhe uma resposta de fé e amor que nenhuma outra criatura pode oferecer em seu lugar» (nº. 357). Por causa disso «assim todos desfrutam de dignidade igual» (CIC 1934) independentemente de raça ou credo, sexo ou tamanho, ou idade ou saúde. Cada pessoa por si merece respeito.
O ponto 357 diz muito mais, e assim vamos dissecá-lo para uma melhor compreensão.
O Indivíduo humano não é algo, mas alguém. O que fazemos com as coisas? Usamo-las. Utilizamo-las para diversas finalidades. “Amamos” coisas porque nos são úteis. Não usamos – não devemos usar – pessoas. Nós não as “amamos” devido à sua utilidade. Amamo-las por elas próprias. Ficaríeis ofendidos se a vossa filha ou filho, ou mesmo um amigo, vos dissesse “amo-te porque és útil para mim”. No entanto sabemos que isto acontece a todo o momento. As pessoas são tratadas como coisas. Usamo-las em busca de prazer, posses, ou poder – «a luxúria da carne e dos olhos e o orgulho da vida» (I João 2:16). São “amadas” porque são úteis. Não são tratadas como alguém… apenas como “coisas”.
O indivíduo humano «é capaz de ter conhecimento próprio, posse de si próprio e livremente oferecer-se e entrar em comunhão com outras pessoas». Somos feitos à imagem e semelhança de Deus, e por isso somos capazes de Conhecer (através do intelecto) e capazes de Amar (através da vontade). Somos capazes de conhecer não apenas o que nos rodeia, mas também a nós próprios, e também Àquele que nos criou. «Por essa razão somos capazes de entender a ordem das coisas estabelecida pelo Criador. De livre vontade, o homem é capaz de dirigir-se a si próprio para o seu verdadeiro bem» (CIC 1740). «Pela virtude da sua alma e os poderes espirituais do intelecto e vontade, o homem está capacitado com a Liberdade, uma manifestação extraordinária da imagem divina» (1705).
Repare-se nos três diferentes conceitos presentes. Conhecimento (intelecto), Amor (vontade) e Liberdade.
Existe ainda um quarto conceito : Responsabilidade. A Liberdade mais básica e que não deve nunca ser retirada ao homem é a de poder fazer escolhas livre, com conhecimento e e inteligentemente. A liberdade não é apenas a possibilidade de escolher qualquer coisa. Primeiro devo poder saber quais as possibilidades de escolha e informar-me sobre elas. Não escolher às cegas. A liberdade não é irracional. A minha razão (intelecto) deve examinar o que estas escolhas significam para mim e verificar qual a que mais me ajuda a crescer como pessoa… Só então farei a escolha. E assim que fizer a minha escolha, sei que a escolha é minha, e portanto sou o único responsável por ela. Suportarei a consequências dessa minha escolha. Intelecto, Vontade, Liberdade e Responsabilidade: é deste conjunto que vem a dignidade. (Haverá um outro artigo sobre este tema).
Assim, concluímos: «Todo o ser humano, criado à imagem de Deus, tem o direito natural de ser reconhecido como um ser responsável e livre. Todos devemos a cada um e a todos nós este respeito. O direito de exercer a liberdade, especialmente em questões de Moral e Religião, são um requisito inalienável da dignidade da pessoa humana. Este direito deve ser reconhecido e protegido pelas autoridades civis no contexto dos limites do bem comum e da ordem pública» (CIC 1738).
Pe. José Mario Mandía