Deus, o doador da vida mais forte que a morte

5º DOMINGO DA QUARESMA – Ano A – 26 de Março

Deus, o doador da vida mais forte que a morte

Na semana passada concelebrei o funeral de um menino de dez anos. Fiquei realmente comovido com a grande fé demonstrada pela sua família, especialmente pelos pais. A comunidade paroquial, guiada pelo seu pároco, mostrou solidariedade e carinho ao participar na liturgia. Como podeis imaginar, foi uma experiência de “partir o coração”. Não é justo morrer tão jovem. Mas sejamos honestos: não importa a idade, nunca é fácil aceitar a morte.

Todos temos que morrer: esta é uma das verdades básicas da vida. No entanto, encaramos a morte como sendo anti-natural, como o nosso maior inimigo. Afinal, este não é um pensamento irracional. Feitos à imagem de Deus e chamados a entrar numa relação de amor com Ele, não fomos destinados por Deus a sofrer e morrer (cf. Catecismo da Igreja Católica nº 376). Naturalmente, temos sede de eternidade, do estado de “bem-aventurança” que é a meta da existência humana (CIC nº 1719). Somente depois do pecado original, do sofrimento e da morte terem passado a fazer parte da nossa história humana é que se deu uma trágica reviravolta no plano original de Deus. Fomos criados para a comunhão, mas a morte trouxe a separação. Não é de admirar que todos experimentemos a morte como o maior obstáculo ao nosso desejo natural de felicidade. Paradoxalmente, ainda culpamos Deus por esse destino, visto como um castigo inevitável.

Dominados pelo medo, usamos todos os meios ao nosso alcance para exorcizar o pensamento da morte: poder, prazer, conhecimento e ciência, sublimações religiosas, pensamento niilista (nada tem valor), todo o tipo de distrações… inutilmente, porque no final todos precisamos de enfrentar a tragédia da morte.

Portanto, somos verdadeiramente consolados pela reacção de Jesus diante do túmulo do Seu amigo Lázaro. O Evangelho deste Domingo (Jo., 11, 1-45) narra que Jesus chorou, «muito perturbado no espírito e profundamente comovido» (versículo 33). Ao verem tal demonstração de afecto, os presentes exclamavam: «Vejam como ele o amava!». As emoções de Jesus, finalmente, restauram a imagem de Deus como o doador da vida, e não da morte. Um poema com o ousado título “Não sóis um Deus mau”, de um poeta italiano contemporâneo, D. M. Turoldo, diz: “Mas tu, Deus, não gostas da morte / Tu desceste entre nós / para espantar a morte / para caçar, derrubar e destruir a morte. / A morte também te aleija, / por isso vós sois amigo de cada pessoa tocada pelo mal e pela dor, / e queres participar de cada uma delas. / Só uma gafe, ou amargo mal-entendido / – quando não é tolice – / nos faz dizer de ti: / ‘Deus é a Divina Indiferença’”. As lágrimas de Jesus lavam a falsa imagem de um Deus cruel que nos abandona na nossa hora mais escura.

«– Lázaro, vem para fora!», gritou Jesus em alta voz diante do seu túmulo. O que se seguiu – a ressurreição de Lázaro – não é um atalho concedido a uma pessoa com sorte para contornar a dolorosa experiência da morte. Tal não faria sentido: afinal, Lázaro não se tornou imortal e precisou de enfrentar a morte mais uma vez. Somente à luz da morte e da ressurreição de Cristo podemos entender este milagre. Ele não salvou Lázaro “da morte”; ao invés, ele o salvou, e a cada um de nós, de “dentro da experiência da morte”. Ao morrer por nós, Cristo iluminou as trevas da morte com a luz da Sua presença: «Não existe maior amor do que este: de alguém dar a própria vida por causa dos seus amigos. Vós sois meus amigos» (Jo., 15, 13-14). Ao ressuscitar dos mortos, Ele derrotou o poder do mal que usa o medo da morte para nos separar de Deus. O Seu amor transformou a morte de um lugar de solidão para se tornar na porta que conduz a uma comunhão inquebrantável: uma participação total na própria vida de Deus através da Graça.

Assim, a morte e ressurreição de Jesus motiva-nos não só a aceitar corajosamente a morte, mas também a viver com sentido a nossa vida como dom de amor, como Jesus, na lógica do grão de trigo que «se não cair na terra e não morrer, permanecerá ele só; mas se morrer produzirá muito fruto» (Jo., 12, 24). Através do milagre narrado no Evangelho de hoje, Jesus ofereceu a todos os presentes no túmulo de Lázaro, e a todos nós que escutamos, o dom da fé necessária para seguir Jesus na vida e na morte; nas nossas escolhas diárias, bem como no nosso último suspiro. Fé de que o Seu Amor é mais forte que o mal e a morte.

«Esclareceu-lhe Jesus: “Eu Sou a ressurreição e a vida. Aquele que crê em mim, mesmo que morra, viverá; e todo o que vive e crê em mim, não morrerá eternamente. Tu crês nisso?”» (Jo., 11, 25). Pois Marta escolheu acreditar.

O padre que celebrou o funeral do menino fez a mesma pergunta aos seus pais e a todos os presentes no funeral. Esta última parte do caminho da Quaresma quer ajudar-nos a dar a nossa própria resposta a Jesus.

Pe. Paolo Consonni, MCCJ

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