18º DOMINGO COMUM – Ano B – 2 de Agosto

18º DOMINGO COMUM – Ano B – 2 de Agosto

À procura do alimento que dura para a vida eterna

“Não trabalheis pela comida que perece, mas pela comida que dura para a vida eterna, que o Filho do Homem vos dará (…) Porque o pão de Deus é aquele que desce do céu e dá vida ao mundo (…) Eu sou o pão da vida” (cf. Jo., 6, 27.33.35)

A frase acima, do Evangelho deste Domingo (Jo., 16, 24-35), faz-me lembrar a resposta de Jesus ao tentador durante o seu retiro de quarenta dias no deserto: “Nem só de pão se vive” (cf. Lc., 4, 4 e Mt., 4, 4). O alimento é um dos bens de primeira necessidade. Mas não é suficiente para dar sentido e objectivo à vida. Estarão os dois, o alimento que temos de ganhar com o nosso trabalho e aquele que “o Filho do Homem vos dará”, em contraste um com o outro?

Talvez o leitor esteja familiarizado com a teoria da pirâmide das necessidades desenvolvida por Abraham Maslow nas últimas décadas. Esta teoria diz que as necessidades humanas formam uma estrutura hierárquica, com as necessidades fisiológicas básicas (como comida e abrigo) na base, seguidas pela segurança, amor, pertença e estima. No topo da pirâmide está a necessidade de auto-realização.

A maioria de nós simplifica demasiado a teoria, concluindo que, se o conjunto mais básico de necessidades não for satisfeito, então uma pessoa não pode dedicar-se à procura de necessidades mais elevadas, mas tal não é verdade. A progressão de uma fase da pirâmide para a seguinte não é necessariamente linear. Muitos estudantes perseguem o seu sonho de aprender sacrificando a comida e o sono no processo. Muitos santos seguem a sua vocação sem se preocuparem com a satisfação das suas necessidades básicas. Muitos voluntários que trabalham em zonas perigosas arriscam as suas vidas para o bem dos outros, mesmo à custa da sua própria segurança.

Além disso, ao contrário de outro equívoco comum sobre a teoria de Maslow, a auto-realização não se segue automaticamente à satisfação de necessidades mais básicas. Algumas pessoas, depois de terem alcançado riqueza e conforto através de trabalho árduo, continuam a sentir um vazio interior. Por outro lado, através da fé, algumas pessoas empobrecidas ou doentes podem encontrar um sentido e um objectivo na vida, apesar das lutas e dores diárias.

Voltemos ao Evangelho. Em primeiro lugar, o convite de Jesus a “não trabalhar pela comida que perece” não significa que Ele a considere irrelevante. Como lemos no Domingo passado, Jesus preocupou-se profundamente com a fome física dos milhares de pessoas que vinham ouvi-lo e multiplicou pães e peixes. Durante o Êxodo, Deus enviou maná durante quarenta anos ao povo faminto de Israel que se encontrava no deserto, porque se preocupava com o seu bem-estar. Tal como Jesus nos ensinou, na oração do Pai Nosso invocamo-lo para que “o pão nosso de cada dia nos seja dado hoje”.

No entanto, Jesus compreendeu claramente o perigo de as pessoas se aproximarem Dele apenas para obter benefícios materiais e, para usar uma terminologia mais moderna, para restringir o papel de Deus na nossa vida ao quadro limitado da pirâmide das necessidades de Marlow. Quantas vezes nos aproximamos de Deus apenas por razões sociais, políticas, económicas e culturais, ou para garantir a nossa segurança e saúde? Esta abordagem é compreensível (temos de facto necessidades humanas!), mas não é transformadora. Apenas coloca Deus no horizonte das nossas necessidades, mais do que nos insere na vida da Trindade como filhos e filhas de Deus.

Temos necessidade de transcendência, isto é, de dar sentido às nossas acções e preocupações concretas e de as ligar ao Reino de Deus. No final da sua carreira, até Maslow se apercebeu de que a hierarquia que propunha estava incompleta. A auto-realização não era o pináculo da sua pirâmide – era a auto-transcendência. Precisamos de algo para além do nosso “eu” para dar significado e objectivo às nossas experiências humanas. Este é o “Pão da Vida” que Jesus veio oferecer-nos.

Em conclusão, por um lado, não devemos dar demasiada importância às nossas necessidades (alguém define-o como “a tirania das necessidades”) e, ao mesmo tempo, não as devemos ignorar porque fazem parte da nossa experiência e, portanto, da nossa relação com Deus. Por outras palavras, não devemos usar uma mentalidade dualista para abordar a questão de saber se o alimento que ganhamos com o nosso trabalho está em contraste com o Pão da Vida dado por Jesus. Ambos são importantes e ambos devem conduzir a Deus: na procura do alimento material, concentramo-nos mais na Sua dádiva; na procura do alimento espiritual, concentramo-nos mais no Doador.

A Eucaristia harmoniza os dois aspectos da nossa questão de uma forma não dualista. Levamos ao altar “a obra das nossas mãos”, o pão que perece. Uma vez oferecido, abençoado, partido e partilhado, esse mesmo alimento torna-se o Sacramento do Corpo de Cristo, o “Pão da Vida” que sustenta a nossa caminhada para a eternidade. Na Eucaristia, os dois pães não estão em contraste, mas em união. Ao recebermos a Eucaristia, somos convidados a integrar também os aspectos materiais e espirituais da nossa vida.

Pe. Paolo Consonni, MCCJ

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