Vinte anos após o “handover”.
A comunidade portuguesa de Hong Kong foi de extrema importância para a vida económica e cultural daquela antiga colónia britânica. Ao longo das décadas os seus melhores filhos foram partindo para longínquas paragens e a comunidade está hoje muito reduzida e envelhecida. Para além do prestigiado Club Lusitano, do Club de Recreio (hoje com a maioria de sócios chineses), da Escola Camões, que de português tem o nome, de alguns pequenos restaurantes, de alguns técnicos e de uns tantos produtos portugueses ali vendidos, pouco mais existe. Até o Consulado de Portugal fechou e os assuntos dos cerca de trinta mil portugueses ali inscritos, dos quais muitos são de etnia chinesa, passaram para o Consulado Geral de Portugal em Macau.
Em tempos Roger Lobo, uma das mais destacadas figuras portuguesas de Hong Kong, lançava o alerta: «estamos a perder a nossa comunidade».
E que medidas poderiam ser tomadas para minimizar esse «distanciamento entre as novas gerações da comunidade de Macau e Hong Kong» mencionado por Roger Lobo? É difícil responder a essa questão… Os contactos, nas últimas décadas, resumiam-se praticamente a algum intercâmbio desportivo, especialmente nos torneios de hóquei em campo. Pouco mais havia e as gerações mais novas da comunidade portuguesa de Hong Kong não sentiam a necessidade de relações mais estreitas com Macau. Os contactos mais intensos – e, mesmo assim, irregulares – eram promovidos por personalidades mais velhas da comunidade.
O Club Lusitano e, até há algum tempo, o Club de Recreio, e pessoas como Arnaldo Sales, Rogério Lobo, Alberto Rodrigues e alguns outros ilustres membros da comunidade portuguesa de Hong Kong, que prestaram serviços relevantíssimos à então colónia da Coroa Britânica, procuraram manter relações com Macau e as instituições macaenses. Agora os jovens até já são muito poucos e bastante desenraizados.
A via mais eficaz para assegurar um intercâmbio profícuo será com certeza – ainda e sempre – através da intensificação das relações de Macau com o Club Lusitano, associação modelar, fundada por portugueses que deram muito de si e do seu e souberam pôr em prática o significado da palavra solidariedade.
A criação do Conselho das Comunidades Macaenses viria a contribuir de forma significativa para a aproximação entre todas as comunidades macaenses, não só as de Hong Kong com também aquelas radicadas em Portugal, nos Estados Unidos, no Canadá, no Brasil, na Austrália. Também o Instituto Internacional de Macau, que já tem protocolos firmados com as Casas de Macau na diáspora, através de colóquios, seminários e inúmeras publicações dá o seu contributo para que este objectivo seja atingido.
Macau foi sempre um ponto de chegada e ponto de partida, portanto toda a diáspora começa a partir de Macau. Não podemos esquecer que este ponto de partida para a existência da diáspora continua a ter um papel fundamental na manutenção e coordenação de toda a presença de macaenses no mundo. Daí os encontros que se fazem cada três anos e todo um trabalho de ligação que se procura manter com as organizações no exterior a partir de Macau. Não obstante, há sempre descontentes, e um dos desabafos mais divulgados foi a seguinte afirmação expressa em Inglês, via Internet, por um macaense emigrado: “a diáspora não precisa das associações de Macau, mas Macau precisa da diáspora”. Na realidade, todos uns dos outros para que a comunidade no seu todo se afirme, daí a necessidade de criar sinergias que os mantenham unidos.
Um dos passos para a afirmação da identidade macaense passa certamente pela aprendizagem e domínio da Língua Portuguesa, independentemente da idade das pessoas. Aquando um dos encontros dos presidentes das Casas a questão foi levantada. Alguns dos participantes não falavam Português, outros percebiam pouco, alguns quase nada, no entanto a APIM entendeu – e bem – que devia conduzir os trabalhos em Português. Há por isso eventos conduzidos basicamente em Português, embora se procure fazer sempre uma síntese em Inglês de tudo o que está a ser discutido e de todas as intervenções que são feitas. Há que ser compreensivo em relação a isto, não se podendo ser demasiado exigente.
É preciso não esquecer que o que acontece com os macaenses, acontece com os demais portugueses que partiram de outras origens e hoje fazem parte da grande diáspora portuguesa. Muita gente não teve acesso à língua materna, pois vivia no estrangeiro, sendo toda a sua educação conduzida noutra língua, no caso o Inglês, sobretudo os que estavam em Hong Kong e em Xangai. Uma das grandes preocupações do Conselho das Comunidades é exactamente esse: que as raízes que ligam as pessoas à terra-mãe se reforcem. E uma das formas de o fazer será também através da língua. Portanto, as dissonâncias e descontentamentos manifestados não podem ser de modo nenhum encarados como sinal de divisão entre macaenses. Antes pelo contrário, é até bom que haja reacções. O pior que pode acontecer quando se idealizam e preparam projectos (como foi a criação do Conselho das Comunidade Macaenses) é ter como resposta um silêncio absoluto que normalmente significa desinteresse ou apatia ou apenas concordância tácita e cega logo à partida com tudo o que se faz, o que não é de todo desejável.
Joaquim Magalhães de Castro