Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas

Portugalidade vista de Macau.

A propósito do 10 de Junho, O CLARIM quis saber o que cinco residentes de Macau pensam sobre a efeméride. Luiz Oliveira Dias falou de D. Sebastião, Jerónimo Santos da identidade de um povo, Tiago Pereira das dignas comemorações em Macau, Jorge d’Abreu dos ventos de mudança e Armando Lobo do cariz nacionalista.

«Quando se está no estrangeiro – e apesar de nenhum português se sentir estrangeiro em Macau, não é o mesmo que estarmos na nossa terra – este dia sente-se com muito mais intensidade», explicou Luiz Oliveira Dias, descrevendo que se trata de uma «intensidade feita de amor, de reverência, de saudade e de orgulho».

«Teve diversos nomes este nosso dia», assinalou o representante em Macau de D. Duarte Pio, chefe da Casa Real Portuguesa, lembrando que «agora é oficialmente de Portugal, de Camões e das Comunidades, contando que chega “Portugal”, porque está lá tudo».

«Infelizmente, continuam envoltas em nevoeiro as notícias que de lá vêm. Como [Fernando] Pessoa pressagiou noutros tempos de incerteza – “Portugal, hoje é nevoeiro”. Sempre, como hoje, a espera de um Dom Sebastião que nunca chega. Talvez para o ano…», adiantou Oliveira Dias.

A efeméride é vista por Jerónimo Santos como um «dia para reflectir sobre a identidade de um povo; o seu percurso histórico; o seu contributo para a História enquanto marca singular e indelével; as suas forças e fraquezas, qualidades e defeitos; os seus ilustres e os que o podiam ser mais».

«Enfim, [um] dia para reflectir sobre o espírito do povo de vocação universal no espírito do mundo de que falou Hegel, mas sempre plasmado pelo sentimento de pertença e de afecto que às vezes até pode turvar o olhar e fazê-lo menos certeiro», sublinhou o juiz do Tribunal Judicial de Base.

«Estando longe de Portugal, onde nasci e cresci, nessa reflexão também entra um outro tipo de sentimento capaz de fazer um arrepio ao ouvir o hino e ao ver subir a bandeira, cerimónia a que nunca faltei desde que aqui cheguei. Será um misto de saudade e, talvez, de constatação pelo peso dessa História, dos homens que a fizeram e do dever de continuar consciente que só eles explicam porque cheguei aqui e tenho os meus pés assentes no mesmo chão que segura a bandeira», vincou Jerónimo Santos.

Na óptica de Tiago Pereira, a efeméride «representa um dia em que celebramos a nossa História, a nossa língua, a nossa cultura, o nosso povo». Em declarações a partir de Portugal, o secretário-coordenador do Núcleo PS/Macau lembrou que o 10 de Junho «é sempre um dia com uma série de eventos que celebram a data», reforçando que o mesmo «tem sido sempre feito com grande dignidade em Macau».

 

Força dos tempos

O significado das comemorações levou Jorge d’Abreu até aos seus dias de estudante: «Nessa altura, era o feriado que antecedia as férias grandes do Verão, mas nunca percebi porque é que, havendo o feriado no dia 10, éramos obrigados a ir às aulas no dia seguinte, dia em que terminavam».

«Mais tarde, depois de aqui estar, o dia passou a representar para mim, de uma forma geral, o reencontro com amigos, porque apesar de Macau ser uma cidade pequena, por vezes há amigos e conhecidos que apenas tenho a oportunidade de rever nesta ocasião», sustentou o professor de Português da Faculdade de Direito da Universidade de Macau.

«Para além da alegre cavaqueira e do “pastelinho de bacalhau” e do “queijinho” que os diversos cônsules nos proporcionam, e as “baboseiras” que alguns dos enviados de Lisboa muitas vezes aqui vêm debitar sem conhecerem a realidade local e a vida da comunidade, pouco mais se tem aproveitado», disse ainda.

«No entanto, e felizmente com o doutor Vítor Sereno, ventos de mudança chegaram, e isso tem-se visto na prática com a sua iniciativa e dinamismo, sendo prova disso mesmo a instituição, este ano, de Junho como Mês de Portugal na RAEM» analisou Jorge d’Abreu, para quem o cônsul-geral de Portugal em Macau e Hong Kong «é uma pessoa dinâmica, sempre em busca de soluções», tanto quanto lhe parece «nada burocráticas».

Segundo Armando Lobo: «Portugal deve ser o único, ou pelo menos dos poucos [países], em que no seu Dia Nacional se celebra um poeta, e não algum herói, ou guerreiro, ou qualquer acto de guerra que se queira recordar e passar memória para os vindouros, porque quando Portugal está em crise as pessoas lembram-se sempre desses nomes que nos livram da tormenta, a começar por D. Afonso Henriques».

«Só a partir da 1ª República é que se comemora o Dia de Portugal. Era o dia de Camões, dia de Portugal e dos portugueses – pouco ou nada se alterou na designação. Após a tomada do poder e de o consolidar, Salazar modificou o nome para Dia de Camões, de Portugal e da Raça (dos portugueses), uma maneira de exacerbar o nacionalismo português», recordou o ex-tenente miliciano do Exército Português.

«Após o levantamento em África contra a presença de Portugal, Salazar, mais uma vez, mandou comemorar o Dia de Portugal, com grandes paradas militares, condecorando e louvando os militares portugueses que se distinguiram na luta pela continuação da presença de Portugal em África. Louvava-se a heroicidade do povo português que resistia em África», prosseguiu Armando Lobo, considerando «um exacerbar de Nacionalismo», ao estilo: «sozinhos, mas prontos para resistir».

«Actualmente, as paradas militares continuam, as condecorações também, e da luta de então apareceram novos países. As comemorações são agora mais políticas e terão mais um sabor de festa», concluiu o ex-oficial do Exército Português, destacado em Angola entre 1966 e 1969.

PEDRO DANIEL OLIVEIRA

pedrodanielhk@hotmail.com

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