Ele espera por nós com um abraço carinhoso e misericordioso
Neste Quinto Domingo da Quaresma começamos uma nova fase do tempo litúrgico. Enquanto os Domingos anteriores foram mais voltados para realidades como o pecado e a penitência, a partir de hoje meditaremos sobre o perdão e a salvação realizados por Jesus com a sua morte redentora na cruz.
O Evangelho deste Domingo apresenta-nos a história da mulher adúltera arrependida. Diante da gravidade deste pecado, segundo a lei judaica, esta mulher deveria ser apedrejada. Contudo, de acordo com as leis romanas vigentes na colónia israelita, apenas o Império, através do seu representante local, tinha autoridade para condenar alguém à morte, o que deixava os judeus impedidos de aplicar a lei de Moisés. Sabendo disso, os fariseus tentam colocar Jesus diante de uma encruzilhada: quando questionado, se Jesus dissesse que eles podiam apedrejá-la, os romanos iriam condená-Lo; caso dissesse que não deveriam apedrejá-la, Ele contrariaria a lei religiosa.
Diante da armadilha criada pelo escribas e fariseus, Jesus pede para que aqueles que não tivessem pecado atirassem a primeira pedra e, após escrever algo indecifrável no chão, todos acabam por se afastar, deixando Jesus sozinho com aquela mulher. Ao contrário de querer desvendar o que foi escrito, Santo Agostinho foca no sentido daquela mensagem e comenta que naquele momento restaram apenas a miséria humana, representada pela adúltera arrependida, e a misericórdia divina, visível em Cristo. Isto ensina-nos que a beleza da misericórdia deve ser celebrada sem esquecermos a gravidade e a necessidade de reparação pelo pecado.
O grande acto de misericórdia de Jesus não nega a gravidade do acto de adultério daquela mulher. Existe uma tendência de utilizar o Evangelho para justificar e normalizar comportamentos contrários à lei divina como sendo naturais. É comum ouvirmos que Deus é amor, acolhe a todos e não excluiu ninguém. O que é verdade, mas não podemos esquecer que a misericórdia de Deus pressupõe o arrependimento e o desejo da pessoa não voltar a cometer o mesmo pecado. O pecado não ganha aqui uma nova dimensão neste Evangelho, continua a ser a morte da vida divina na alma humana. Tal como uma lâmpada não pode iluminar quando os seus fios estão cortados da corrente eléctrica, uma alma em pecado mortal está afastada da graça de Deus. A gravidade do pecado e a nossa redenção precisavam de um remédio que recebemos com a morte de Jesus na cruz.
Quando a Igreja, fiel à Sagrada Escritura, diz, por exemplo, que uma pessoa não pode comungar em pecado mortal, ela não quer excluir ninguém, ela apenas ensina que antes de comungarmos temos uma situação séria criada pelo nosso erro que precisamos resolver. Existe uma pedagogia divina nesse ensinamento. A privação da Comunhão não é um castigo ou exclusão das pessoas que falharam, mas um alerta de uma Mãe que sabe que o filho não pode continuar naquela situação. Como vivemos numa sociedade de tendência material e valorização apenas empírica, normalmente ignoramos esta realidade espiritual e o mal da alma vive ausente da graça de Deus.
Merece destacar ainda o processo de conversão da mulher pecadora. Ela pecou gravemente, arrependeu-se, recebeu o perdão divino e foi alertada para não voltar a pecar. Assim deve acontecer na nossa vida todas as vezes que pecamos. Nestas últimas semanas da Quaresma devemos reflectir sobre o nosso estado diante de Deus. O encontro entre o pecado e a misericórdia divina passa sempre pelo nosso arrependimento e o desejo de não voltar a pecar. Para que o remédio para a nossa salvação, que custou a morte de Cristo na cruz, seja aplicado na nossa vida, Jesus deixou o Sacramento da Reconciliação. A Igreja classifica este Sacramento, ao exemplo da Unção dos Enfermos, como um Sacramento de Cura. Ele cura a nossa alma de tudo que o nos afasta de Deus. Sabendo da importância deste Sacramento para a nossa salvação, a Igreja pede que confessêmos pelo menos uma vez por ano, exactamente neste momento do ano, para participarmos da Páscoa em estado de graça. Esta reconciliação com Deus, tão importante para vivermos em paz, terá a sua plenitude na aplicação da misericórdia recebida do Senhor no nosso relacionamento com os nossos irmãos, principalmente os que pecaram contra nós.
Convido-vos a um recolhimento pessoal e a se entregarem nos braços de Deus, num abraço de reconciliação. Ele está à nossa espera com um abraço carinhoso e misericordioso. Não tenham dúvidas e nunca venham a duvidar da misericórdia de Deus.
Pe. Daniel Ribeiro, SCJ