«Não há crescimento quando se exclui outras pessoas».
Feliz por fazer parte das mudanças que se verificam em Macau, o empresário Ronald Bartolome partilha o seu conceito de restauração assente num ambiente caseiro. A‘O CLARIM, o sócio-gerente do restaurante “La Cucina Italiana” salienta que os deputados devem ter maior abertura para os trabalhadores não-residentes, porque sem eles não há crescimento. Assumindo ser muito difícil para um estrangeiro fazer negócio no continente chinês, acrescenta que até mesmo na RAEM as operadoras de Jogo estão a fazê-lo cada vez mais à maneira chinesa.
O CLARIM – É hoje sócio do restaurante “La Cucina Italiana” na Vila da Taipa…
RONALD BARTOLOME – Tenho alguns investidores que acreditaram em mim. Desenvolvi um plano de negócio para eles e até agora está a correr bem.
CL – É natural das Filipinas. Em Macau começou de forma humilde…
R.B. – Trabalhei cerca de dezasseis anos na “Pizzeria Toscana” com o Luca, a Isabella Acconci… Com a família Acconci! Trabalhar com eles permitiu-me ganhar conhecimentos sobre as raízes latinas das Filipinas, que foram colonizadas pelos espanhóis, visto a latinidade também ser parte integrante dos italianos. Ao trabalhar com eles consegui realçar o que de melhor há em mim. Na “La Cucina” partilho agora a minha definição de restauração com as pessoas.
CL – De que forma?
R.B. – Os nossos clientes são locais, expatriados e turistas. Gosto que se sintam em casa, por isso decorei o espaço com um toque caseiro. Já outros empresários preocupam-se mais com o número de mesas, a capacidade do espaço e o dinheiro que podem arrecadar. Penso que ao criar um ambiente caseiro dei oportunidade às pessoas de poderem sentir a comida como se fosse caseira ou cozinhada por mães.
CL – É engenheiro civil de formação, mas na “Pizzeria Toscana” trabalhou na linha-da-frente…
R.B. – Fui empregado de mesa e trabalhava em todo o lado: na cozinha, ia ao mercado…
CL – Como se sente agora na pele de empresário?
R.B. – Quando as pessoas dizem que sou empresário digo-lhes que não, porque sou um “construtor”. Gosto de construir. Por exemplo, tenho sempre o propósito de levar Macau a Hong Kong [no restaurante “La Cucina Italiana”, em Wanchai]. Gosto de partilhar com os clientes a sensação de estarem em Macau.
CL – Pertence a uma comunidade que desempenha um papel fundamental em Macau. De que maneira olham os locais para os filipinos que aqui vivem e trabalham?
R.B. – Estou feliz por partilhar com eles e dizer que faço parte das mudanças que se verificam em Macau, e partilhar que tudo é possível com trabalho árduo e determinação.
CL – Que percepção tem hoje do território em relação a quando cá chegou pela primeira vez?
R.B. – As pessoas são as mesmas [na maneira de estar], mas o meio mudou bastante.
CL – Para melhor ou para pior?
R.B. – Se perguntar a minha opinião, diria que gostaria de regressar ao passado para andar na rua e conhecer toda a gente ou ir ao mercado e perguntar o que compraram para o almoço ou para o jantar. Há agora muitas pessoas diferentes. O meio tornou-se mais frio.
CL – Macau corre o risco de perder a sua identidade e transformar-se em algo que não se sabe muito bem no quê?
R.B. – Temos o restaurante em Hong Kong… Julgo que Macau é especial. É algo que não existe em qualquer outra parte do mundo.
CL – Alguns deputados apoiam a diminuição do número de trabalhadores não-residentes. Se tal acontecer irá afectar muitos filipinos. O que lhe parece?
R.B. – Julgo que devem ter maior abertura porque para haver desenvolvimento é preciso incluir outras pessoas [para além de quem é residente]. Não há desenvolvimento só por si próprio.
CL – Será que estão apenas a tentar fazer passar uma mensagem populista com o propósito de fidelizar os eleitores e nada mais do que isso?
R.B. – Os não-residentes têm um grande contributo no crescimento de Macau.
CL – A comunidade filipina também contribui…
R.B. – Desde há muito tempo! Por exemplo, quem toma conta dos filhos quando os pais vão trabalhar? Na vida há sempre compromissos.
CL – Quais?
R.B. – Se algum destino quiser ser cosmopolita ou centro mundial da indústria do Jogo é claro que tem de incluir pessoas do exterior, em vez de se fechar em si próprio. Não há crescimento quando se exclui outras pessoas. Por que será que Macau tem registado grande sucesso na indústria do Jogo? É preciso pensar em quem toma conta das crianças dessas pessoas que trabalham. Julgo que os deputados deviam “olhar para o outro lado da montanha”. Para Singapura, para Hong Kong ou para outras partes do mundo! Talvez compreendam [a realidade], mas preocupam-se em demasia com o que a comunidade em geral possa dizer.
CL – Como vai o seu empreendedorismo no interior da China?
R.B. – Julgo que ainda tenho muito que aprender para perceber os princípios de como fazer negócio na China continental e ser capaz de “abrir a porta”. Diria que é muito difícil. É preciso entender a cultura de negócios. Há muitos aspectos a considerar. Por vezes é difícil digerir a compreensão de coisas que para mim são simples, mas que [na óptica chinesa] são complicadas e não resultam. Não basta saber como fazer ou fechar negócios, porque é preciso entender a cultura chinesa. É preciso muita compreensão mútua. E não pode ser só um lado a compreender o outro, mas sim os dois lados.
CL – Pode definir o modo de fazer negócio na China?
R.B. – Se quisermos fazer negócio na China temos que fazer à moda da China (risos).
CL – Embora seja uma Região Administrativa Especial, será que também em Macau as operadoras de Jogo negoceiam à moda da China? Ou terão a sua maneira muito própria de o fazer?
R.B. – Não importa o quanto conseguem influenciar, porque na verdade estão cada vez mais a fazê-lo à moda chinesa. Basta olhar para os cargos de topo. Se o negócio for conduzido de forma correcta, pode ser bem-sucedido. No entanto, é necessário um grande esforço para ser bem-sucedido e ter sorte no negócio…
CL – Será que o mesmo se aplica aos magnatas?
R.B. – Pode ser mais fácil, mas têm que ter em conta todos estes pequenos detalhes…
PEDRO DANIEL OLIVEIRA