PAUL PUN, PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DE BENEFICÊNCIA PARA OS REFUGIADOS

PAUL PUN, PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DE BENEFICÊNCIA PARA OS REFUGIADOS

«Podíamos assinar um acordo com o ACNUR de forma a acolher cem refugiados por ano»

O auxílio e o acolhimento de refugiados está legislado em Macau desde 2004, mas em quinze anos o Governo não atribuiu o estatuto de refugiado a um único requerente de asilo. Há cidadãos estrangeiros – aos quais a Associação de Beneficência para os Refugiados presta apoio emocional – que aguardam por uma decisão do Executivo há mais de oito anos. Paul Pun, presidente do organismo, lembra que Macau é «uma cidade de refugiados» e acredita que o território deve fazer bem mais. O também secretário-geral da Cáritas defende que o Governo se deve prontificar a ajudar uma centena de refugiados todos os anos, em vez de esperar que os requerentes de asilo lhe venham bater à porta.

O CLARIMA questão dos refugiados foi bastante importante em Macau nos diferentes momentos da sua história. Foi um centro de acolhimento para milhares de pessoas vindas de países como a China e o Vietname. Continua a receber refugiados ou requerentes de asilo?

PAUL PUN– Nos períodos a que se refere, Macau teve de saber responder a um grande influxo de pessoas por causa dos conflitos que afectavam a China e, mais tarde, o Vietname. Recebemos muitos refugiados, muitas pessoas que requeriam asilo político. Hoje em dia, o número de requerentes de asilo é muito pequeno. Macau recebeu alguns pedidos, mas não é um problema substancial. Em Macau a lei relativa aos refugiados foi já legislada e implementada. O Governo concebeu o cartão de identificação de refugiado em 2004, mas desde então nenhum cartão foi emitido. As autoridades não atribuíram a ninguém o estatuto de refugiado. Acreditamos que Macau pode fazer algo no sentido de ajudar a resolver alguns dos problemas que afectam o mundo. Todos os países, todos os territórios, devem dar o seu contributo. Talvez um país de maior dimensão, na Europa, possa acolher dez mil refugiados. Em Macau, se nos comprometêssemos a acolher dez creio que já seria bom. Macau é um território pequeno. Devemos procurar perceber que número é o mais razoável para as características locais, de modo a que Macau possa dar o seu contributo.

CLDizia que o Governo não atribuiu o estatuto de refugiado a um único requerente de asilo… Qual é a diferença entre os dois conceitos?

P.P.– A diferença? Um requerente de asilo é alguém que sente que a sua vida está a ser ameaçada. Correm o risco de ser torturados no seu país natal e têm que abandonar as suas casas devido a razões políticas ou religiosas, porque são perseguidos e oprimidos. Quem se encontra nestas condições pode requerer asilo político. A Organização das Nações Unidas e o ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados) avaliam depois as declarações dos requerentes, e se tiverem razões para acreditar que as afirmações correspondem à verdade atribuem o estatuto de refugiado a essas pessoas. Chamamos requerentes de asilo aos deslocados a quem ainda não foi atribuído o estatuto de refugiado.

CLDizia que o número dos que pedem asilo a Macau é reduzido? Sabe quantos são exactamente? E de onde são provenientes?

P.P.– Não sei quantos são ao certo, mas creio que serão uma mão cheia. Conheço um requerente de asilo proveniente do Médio Oriente e um outro oriundo de África. No passado houve alguns casos provenientes da Índia, mas o número também não era significativo. Há dois anos tivemos o caso de alguém do Paquistão que sustentava que era refugiado, mas acho que o caso acabou por não dar em nada porque não se conseguiu comprovar as alegações feitas pelo requerente.

CLQue tipo de apoio recebem os requerentes de asilo por parte da Cáritas e da Associação de Beneficência para os Refugiados?

P.P.– O apoio que lhes fazemos chegar não é necessariamente apoio financeiro. O Instituto de Acção Social é o organismo associado à Comissão para os Refugiados e é o Instituto do Desporto que faculta apoio financeiro aos requerentes de asilo. O Instituto oferece-lhes habitação ou uma prestação para a renda e algum apoio financeiro para que o limiar de sobrevivência seja atingido. A Cáritas oferece-lhes sobretudo apoio emocional e promove actividades para que não sintam que estão sozinhos. Procuramos promover actividades de reforço de capacidades e de formação, de modo a que enquanto esperam pela decisão do Governo possam aprender alguma coisa. Por outro lado, é a Associação que os indica ao Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, para que também possam obter o apoio da ONU.

CLSe alguém entra em Macau com o estatuto de requerente de asilo, não está pois autorizado a trabalhar. Dizia que a maioria dos casos são antigos. Porque é que o Governo não decide de forma mais rápida?

P.P.– Sempre defendi que fossem autorizados a fazer alguma coisa. Macau tanto teria capacidade para receber dez, como para receber cem requerentes de asilo. O Governo não teria que se preocupar com eles, se lhes atribuísse o estatuto de refugiados. Com o cartão de refugiado, se fossem aceites por outros países, poderiam ir. Mas mesmo que não fossem, pelo menos teriam estatuto de refugiados e seriam autorizados a trabalhar, a fazer algo de produtivo. Neste momento não podem.

CLNão seria uma melhor solução, mesmo em termos económicos, oferecer o estatuto de refugiado aos requerentes de asilo que procuram o território?

P.P.– No meu entender, é a melhor solução! Mas há outras pessoas para quem a solução poderá não ser tão boa. Eles acreditam que se esta porta for aberta, muitas outras pessoas virão solicitar asilo às autoridades do território. É por isso que este processo tem de ser conduzido de forma inteligente. Dizia-lhe há pouco que um país de grande dimensão talvez consiga acolher dez mil refugiados sem problemas. Num local pequeno, como Macau, que número seria comparável? Quanto refugiados seriam demasiados refugiados? Na minha perspectiva, cem refugiados é uma quantia razoável. Um milhar talvez seja demais para Macau. Não queria utilizar a palavra “quota”, mas Macau devia definir o número de refugiados pelos quais se pode responsabilizar. Podíamos assinar um acordo com o ACNUR de forma a acolher cem refugiados por ano.

CLDe que outra forma é que Macau pode ajudar?

P.P.– Ao longo dos últimos seis anos temos vindo a recolher donativos para enviar aos refugiados sírios. Sentimos, no entanto, que o que fazemos não é suficiente. Dar dinheiro é fácil. Partilhar conhecimento é algo completamente diferente. Se os pudéssemos ajudar, seria óptimo. Não sabemos ao certo se podemos ajudar uma centena de requerentes de asilo porque nem todos são verdadeiramente refugiados, mas podemos ajudar aqueles que já obtiveram o estatuto de refugiado noutros países. Porque é que não vamos buscar cem destes refugiados e os ajudamos? Muitos nunca serão aceites por outros países e estão confinados a campos de refugiados. Podemos enviar alguém a estes campos, à Jordânia, por exemplo, e perguntar-lhes como é que podemos ajudar. Se alguns deles estiverem dispostos a viajar para o Extremo Oriente, as portas devem estar abertas. Estou certo que interessados não faltariam.

Marco Carvalho

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