PADRE ROBERT NĘCEK

PADRE ROBERT NĘCEK, ANTIGO PORTA-VOZ DO SECRETÁRIO PESSOAL DE KAROL WOJTYLA E PROFESSOR NA UNIVERSIDADE PONTIFÍCIA JOÃO PAULO II

«No Homem a Igreja encontra o seu caminho. As redes sociais estão a chamar as pessoas»

O legado do Papa João Paulo II, nomeadamente no que diz respeito à relação aberta e franca que sempre manteve com a Comunicação Social, esteve ontem em destaque no Seminário de São José. O padre Robert Nęcek, director do Departamento de Educação para os Media do Instituto de Jornalismo e de Comunicação Social da Universidade Pontifícia João Paulo II, em Cracóvia (Polónia), abordou o papel da Comunicação Social na divulgação dos ensinamentos de Karol Wojtyla. Em entrevista a’O CLARIM, o sacerdote falou sobre o impacto que as redes sociais têm nos esforços de evangelização conduzidos pela Igreja e deixa um aviso: não é sensato ignorar plataformas como o Twitter ou o Facebook.

O CLARIMO Papa João Paulo II gozava de uma boa imagem junto da Imprensa. Era uma espécie de fenómeno em termos mediáticos…

PE.ROBERT NĘCEK– É verdade! O Papa João Paulo II soube compreender a importância dos Meios de Comunicação Social e teve a perspicácia de aprender a comunicar com os jornalistas. Todos temos noção da importância da Comunicação Social e dos novos veículos de comunicação no mundo de hoje. O mundo de hoje está globalizado, é uma grande aldeia global muito graças aos Meios de Comunicação Social. Estes aceleram o contacto entre pessoas e povos, ao fazer com que a informação chegue de forma mais célere a todo o mundo. O Papa João Paulo II considerava que, ao acelerarem o contacto entre os povos, os Meios de Comunicação Social estavam ao serviço da Palavra de Deus. A Imprensa e os Meios de Comunicação Social oferecem a possibilidade de multiplicar o conhecimento e de exponenciar as obras de misericórdia num mundo globalizado como é o mundo de hoje. Perante tantos conflitos, tantas perturbações e tanto desentendimento, João Paulo II instou, por mais de uma ocasião, os jornalistas e os Meios de Comunicação Social a ajudar a divulgar a Boa Nova.

CLA relação quase afectuosa que João Paulo II tinha com a Comunicação Social, ajudou a fazer de Karol Wojtyla uma figura ainda mais respeitada pelos fiéis e pela comunidade católica?

P.R.N.– Em primeiro lugar, é necessário manter presente que o Papa é uma testemunha de Jesus Cristo. Os Meios de Comunicação Social são feitos pelo homem de hoje, por profissionais atentos ao mundo que os rodeia. Durante o pontificado de João Paulo II, tanto os fiéis como os jornalistas puderem acompanhar de uma forma inédita o modo como o Papa vivia o dia-a-dia, como se relacionava com o mundo e com as pessoas. Aos jornalistas foi oferecida a possibilidade de acompanhar a vida de João Paulo II no dia-a-dia. Antes de ter sido ordenado sacerdote, Karol Wojtyla teve uma experiência breve, mas muito intensa no teatro e no domínio das artes cénicas, e soube utilizar essa experiência para comunicar ao público e aos fiéis aquilo a que dava mais valor. João Paulo II sabia não só como usar a palavra, mas também como dar força à mensagem que queria transmitir através dos gestos e da postura que assumia.

CLOs sucessores de João Paulo II na cátedra de São Pedro – Bento XVI, primeiro, e agora Francisco – souberam preservar esta relação de proximidade com a Imprensa?

P.R.N.– Esta relação de proximidade acabou por enfraquecer um pouco durante o pontificado de Bento XVI. Durante os anos em que Bento XVI assumiu a cadeira de São Pedro houve alguns momentos dramáticos entre os jornalistas e o Pontífice. As relações entre o Papa Bento XVI e a Comunicação Social não foram, de facto, tão fáceis e tão cordiais. O Papa Francisco, por sua vez, herdou o carisma de João Paulo II. Consegue chegar à Comunicação Social com facilidade, até porque tem insistido frequentemente no contacto directo com os jornalistas. Outro exemplo desta postura de abertura é o facto do Papa Francisco marcar uma presença muito visível nas redes sociais. Para tomarmos o pulso à sua popularidade, basta ver quantos seguem o Papa no Twitter.

CLEsta facilidade de relacionamento que tanto o Papa João Paulo II como o Papa Francisco parecem ter com os jornalistas e com a Comunicação Social, é fruto de um carisma pessoal? Ou de uma preocupação particular com a Imprensa como meio de difusão da obra da Igreja e da Palavra de Deus?

P.R.N.– Nos dias que correm não há domínio nenhum em que a influência dos Meios de Comunicação Social não se faça notar. Aos media tradicionais vieram juntar-se nos últimos anos as redes sociais – o Facebook e outras plataformas. Nas redes sociais uma característica que se faz notada é a enorme adesão da juventude. Tanto o Papa João Paulo II como o Papa Bento XVI, e como agora o Papa Francisco, fizeram e fazem questão de sublinhar constantemente que é no Ser Humano, no Homem, que a Igreja encontra o seu caminho. O que é que isto significa? Significa que os Meios de Comunicação Social são um espelho onde se reflectem as expectativas do Homem. As redes sociais, por exemplo, estão a unir e a chamar as pessoas. Tendo em conta esta realidade, a Igreja não tem outra alternativa senão cooperar de forma aberta e ampla com os Meios de Comunicação Social. Só com o contributo dos media é possível fazer chegar a Palavra de Deus, a Boa Nova a todos os lugares.

CLQue tipo de desafios é que as redes sociais colocam à Igreja? O professor Robert Nęcek falou por diversas ocasiões nas redes sociais durante esta conversa…

P.R.N.– O maior problema que se coloca à Igreja é o da abertura e da curiosidade necessárias para entrar e explorar esta possibilidade, esta nova condição que está inerente às redes sociais. O problema – se é que é um problema – é que nem todos os padres, nem todos os religiosos, têm a mesma facilidade para interagir com as novas tecnologias. Por outro lado, há um desafio inevitável. O facto de que nem todos os religiosos têm a mesma facilidade para interagir com a nova realidade dos Meios de Comunicação Social; significa simplesmente que temos de nos educar no que ao acesso aos media diz respeito. Significa que temos de aprender a ler as mensagens que estes novos meios, estes novos conteúdos mediáticos nos transmitem. Temos, por outro lado, de fazer um esforço para comunicar claramente para que a Boa Nova que Jesus Cristo nos anuncia possa ser apreendida na sua plenitude. Tudo isto exige trabalho e entrega, tanto para os jornalistas como para a Igreja, se a nossa preocupação for a de chegar à verdade, procurar a verdade e transmitir a verdade.

CLTendo em conta que as redes sociais são utilizadas por uma grande variedade de pessoas com origens culturais diferentes – entre elas uma enorme quantidade de jovens – é um risco para a Igreja ignorar fenómenos como o Twitter ou o Facebook?

P.R.N.– Mais do que falar das dificuldades, gostava de abordar o impacto positivo do recurso às redes sociais. Para a Igreja Católica o principal alicerce é a palavra do Santo Padre. O que podemos ver, da parte do Papa Francisco, é a utilização do Twitter para evangelizar. O Homem de hoje – e, em particular, a juventude – gosta de respostas simples, curtas e directas. O Papa Francisco soube compreender as potencialidades do Twitter: poucas palavras, mas as palavras certas do Evangelho. Francisco tem consciência de que muitos não têm paciência para grandes explicações e para textos longos. O que é interessante verificar é que entre os seguidores do Papa Francisco estão não apenas católicos, mas também muçulmanos ou seguidores de outras religiões. Onde está o povo, onde estão as pessoas, também deve estar a Igreja.

CLVoltando à figura e ao legado do Papa João Paulo II… Foi o Papa da queda do Muro de Berlim, o Papa da abertura de um mundo novo. Continua a ser uma figura central na Polónia? O legado de São João Paulo II continua vivo na Polónia? Continua a ser um motivo de inspiração para os polacos?

P.R.N.– Ainda hoje, na Polónia, as pessoas vivem a presença de João Paulo II. Foi uma figura marcante da história da Polónia. É certo que desperta uma emoção diferente junto da geração que o conheceu quando ele ainda estava entre nós. A forma como as gerações que nasceram depois do pontificado de João Paulo II olha para o seu legado é, obviamente, diferente. O exemplo de João Paulo II sobrevive de diversas formas e tomou diversos caminhos. Na Polónia, após a morte de Karol Wojtyla surgiu uma Fundação que tem como principal desígnio ajudar a formar jovens que não têm condições financeiras para tal. A Fundação João Paulo II assumiu como missão ajudar a formar quadros qualificados entre a juventude carente. Este tipo de legado é um monumento vivo a João Paulo II. A Fundação tem ainda por missão promover os ensinamentos de São João Paulo II nas universidades: promover a dignidade e os direitos do Ser Humano, a misericórdia, a democracia e, de uma forma menos evidente, as vantagens do mercado livre. Outro domínio importante que a Fundação promove é o da expressão artística ligada a João Paulo II, seja através da pintura, da escultura ou da fotografia. Esta exposição que trouxemos até Macau é disso um exemplo. Os trabalhos da artista Joanna Sobcyzk-Pająk podem ser encontrados em muitas igrejas, quer na Polónia, quer nos Estados Unidos.

Marco Carvalho

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *