«A sinceridade e a confiança em Deus são essenciais»
A irmã Maria Rosa Viloria, RGS, comemorou o Jubileu de Diamante de Profissão de Votos no passado dia 11 de Maio, data em que a Igreja Católica celebrou o 62.º Dia Mundial de Oração pelas Vocações. No dia anterior, as Irmãs de Nossa Senhora da Caridade do Bom Pastor – congregação da qual faz parte a irmã Rosa – festejou cinquenta anos de presença em Macau. As Irmãs do Bom Pastor (como são mais comummente designadas) actuam “na área da protecção e da recuperação da juventude feminina e de famílias com problemas”. Em entrevista a’O CLARIM, a religiosa partilhou o seu inspirador percurso de vida e falou sobre o trabalho que vem realizando em prol da Região desde há várias décadas.
O CLARIM – Irmã Rosa, celebrou há dias o 60.º aniversário da sua Profissão de Votos. Como encontrou a vocação?
IRMÃ MARIA ROSA VILORIA – É uma história e tanto. Encontrei um livro chamado “A Pastorinha Branca” sobre Santa Maria Eufrásia, a fundadora das Irmãs do Bom Pastor. A sua simplicidade e os desafios que enfrentou tocaram-me profundamente. Mas o que realmente despertou a minha vocação foi ver o sofrimento à minha volta, como quando a prima de três anos da minha mãe ficou gravemente queimada num incêndio. Isso fez-me perceber como a vida é frágil. Senti-me atraída pela missão do Bom Pastor de educar e reeducar raparigas e mulheres, e a simplicidade dessa vida chamou-me.
CL – O que é mais essencial para discernir uma vocação?
I.M.R.V. – A confiança em Deus é fundamental. Depois da morte do meu pai, aos 63 anos, e da minha mãe, aos 46, eu era a mais velha de seis irmãos, sendo que a mais nova tinha apenas três anos quando o meu pai faleceu e seis quando a minha mãe morreu. Pensava que não podia ser freira porque tinha de cuidar deles. Mas durante um retiro na Universidade das Filipinas o capelão desafiou-me a “dar uma oportunidade a Deus”. Falei com os meus irmãos – um irmão de dezasseis anos e uma irmã de dezoito – e eles encorajaram-me a seguir a minha vocação. Disseram-me: “Não te preocupes connosco, Deus tomará conta de nós”. O apoio deles foi vital. Até disseram que queriam que eu me tornasse freira para que alguém rezasse por eles!
CL – Foi então muito importante o apoio da sua família nessa decisão…
I.M.R.V. – Muito importante! Os meus irmãos insistiram que Deus cuidaria deles, mesmo quando me preocupei por deixá-los. Disseram-me para não me preocupar com o que outros familiares pudessem dizer, que isso não era da conta deles. Eles acreditavam que Deus providenciaria, e Ele providenciou! Apesar de o seguro dos nossos pais ter falhado, nunca nos faltou nada e não tive de me preocupar. Essa confiança permitiu-me entrar na vida religiosa.
CL – Quando e onde começou o seu serviço como Irmã do Bom Pastor?
I.M.R.V. – Em 1967, apenas dois anos depois de entrar, fui enviada para Hong Kong como irmã júnior – a mais jovem enviada até então. Havia agitação política nas Filipinas, mas os meus irmãos continuavam a escrever. Diziam: “Não te preocupes, Deus está a tomar conta de nós”. Fiquei em Hong Kong durante catorze anos, até 1981, e depois mudei-me para Macau em 1982.
CL – Qual foi a sua tarefa principal em Macau?
I.M.R.V. – Servi no Centro do Bom Pastor. Trabalhava principalmente na prisão durante o dia e passava tempo com as raparigas e mulheres no convento, quando não estava na prisão.
CL – O que mais a impressionou no trabalho que desenvolveu na prisão?
I.M.R.V. – Os reclusos eram muito receptivos ao amor de Deus, apesar de muitos terem cometido erros devido a negligência, falta de supervisão, más companhias ou falta de formação profissional. Uma frase de um recluso ficou-me na memória: pediu-me que escrevesse num relatório social para o seu julgamento: “Não expulsem as crianças da escola por serem malcriadas – são elas quem mais precisa de ajuda”. Explicou-me que adormecia nas aulas porque estava a cuidar dos irmãos à noite, e não porque não estava interessado nas matérias. Aprendi que não existe um prisioneiro verdadeiramente “mau” – mesmo alguém que matou, no fundo não é má pessoa.
CL – Este é o Ano Jubilar da Esperança. Como podem os cristãos, especialmente os católicos, espalhar a esperança nas comunidades onde as pessoas enfrentam situações sombrias e difíceis?
I.M.R.V. – A sinceridade e a confiança em Deus são essenciais. Recordar às pessoas que Deus as colocou neste mundo porque as ama, criadas à Sua imagem. Ninguém é feio aos Seus olhos. Mantenha-se perto de Deus, como uma criança que pede ajuda a um pai. Já vi isto funcionar na minha própria vida. Uma vez, quando me senti sobrecarregada por pessoas que me pediam ajuda, a qual não podia dar, gritei a Deus. No dia seguinte, encontrei exactamente os quatro mil euros de que precisava através de meios inesperados, como dinheiro deixado no meu convento. Deus responde às orações, por vezes de forma surpreendente.
CL – Como é que os católicos de Macau podem viver o espírito de caridade para ajudar os mais necessitados?
I.M.R.V. – Não presumir, mas ouvir. As pessoas querem ser ouvidas, não querem que lhes digam o que devem fazer. Ao ouvir, ajudamo-las a sentirem-se compreendidas e, muitas vezes, elas encontram soluções enquanto falam. Depois, é conduzi-las até Deus. Como perguntou Nossa Senhora de Guadalupe, «– Não sou eu a tua mãe?». Deus é o nosso Pai e promete cuidar de nós. As orações são sempre respondidas – talvez “sim”, “ainda não” ou “tenho algo melhor”. Confie n’Ele e continue a rezar com o coração, mesmo que as palavras lhe faltem, como um bebé que chora para a mãe.
Jasmin Yiu