JANE MARTINS DISTINGUIDA PELO GOVERNO DO BRASIL COM O TÍTULO DE CAVALEIRO DA ORDEM DE RIO BRANCO

«Em qualquer lugar, terei sempre a pátria em minha lembrança»

JANE MARTINS DISTINGUIDA PELO GOVERNO DO BRASIL COM O TÍTULO DE CAVALEIRO DA ORDEM DE RIO BRANCO

A novidade chegou poucos dias antes da Avenida da Praia, na Taipa, receber mais uma edição do Festival da Lusofonia, certame em que a efusividade brasileira está sempre em destaque. A presidente da Casa do Brasil em Macau, Jane Martins, foi distinguida pelo Governo de Brasília com o título de cavaleiro da Ordem de Rio Branco pelo trabalho feito em prol da divulgação da cultura brasileira. O galardão, diz, é um prémio para uma comunidade que soube manter viva a sua identidade e as suas tradições do outro lado do mundo. Jane Martins, em entrevista a’O CLARIM.

O CLARIM– Foi agraciada pelo Governo brasileiro com o título de cavaleiro da Ordem de Rio Branco. Esta distinção acaba por valorizar também o trabalho feito pela Casa do Brasil em Macau. Algum dia julgou que tal seria possível?

JANE MARTINS– Não. Eu moro em Macau há 35 anos e mais ou menos há 25 que comecei a criar eventos, a promover festas de Carnaval, mas tudo de forma particular. Comecei a envolver-me no Festival da Lusofonia também a título privado, até porque a associação ainda não existia. Durante treze anos, fiz de tudo para divulgar o nome e a cultura do Brasil, fosse na culinária, fosse no artesanato, fosse através da própria festa da lusofonia. Só depois é que foi criada, por iniciativa minha e de dois outros amigos – a Carla Fellini e o Roberval Teixeira –, a Associação Casa do Brasil. Com a Casa do Brasil constituída, a responsabilidade de divulgar o nome do Brasil transitou para a Associação, mas o Consulado do Brasil já há muitos anos que me dizia reconhecer o meu trabalho como voluntária. Justamente por ser voluntária nunca recebi nada, nunca recebi dinheiro nenhum para fazer o que faço. É mesmo porque eu gosto do Brasil. Gosto da música, gosto da cultura e gosto da comida, e acho que tudo isso merece ser divulgado. Esse trabalho é agora feito em nome da Associação; portanto, esta medalha que vou receber foi atribuída em meu nome, mas distingue também a Associação. E é uma distinção merecida, porque a Associação tem feito muitas coisas desde há dez anos a esta parte. Tem organizado ciclos de cinema, exposições, participado no desfile internacional de Macau, no desfile do Ano Novo Chinês, promovido festas brasileiras e participado na Lusofonia. Temos tentado fazer o máximo que podemos. Somos todos voluntários e não recebemos subsídios para nada.

CL– A distinção chega precisamente num momento curioso. A atribuição da distinção foi anunciada escassos dias antes de mais um Festival da Lusofonia…

J.M.– Normalmente, estas honras são atribuídas no Dia do Diplomata, que se celebra a 20 de Abril. Por causa da pandemia, no Brasil decidiu-se adiar a cerimónia para o dia 13 de Outubro. Se eu tivesse condições de viajar para o Brasil, a minha intenção era a de receber a medalha no Palácio do Governo. Estas distinções são entregues pelo Presidente da República. Como não é possível, o Governo enviou a medalha e um diploma através da mala diplomática de Hong Kong, que ainda não chegou. Quando chegar – o cônsul já me telefonou e explicou-me – o Consulado tenciona promover uma cerimónia para me entregar a medalha. É claro que é em representação da Associação Casa do Brasil, mas também por acções particulares que eu venho promovendo há muitos anos. Foi por isso que o Consulado de Hong Kong indicou o meu nome.

CL– O prémio, como dizia, é também da Casa do Brasil em Macau. É um projecto que tem pernas para andar quando a Jane se despedir do território?

J.M.– Eu acho que sim. É um projecto que já está bem estruturado. Temos a nossa sede. Eu já tentei não ser presidente, até porque são muitos anos, não é? Já sou presidente há dez anos, mas os membros da Associação dizem que tenho que continuar. Agora, com este reconhecimento, vai ser ainda mais difícil sair. Mas um dia terei que regressar ao Brasil. Daqui a oito anos aposento-me e tenciono voltar para o Brasil. Mas acredito que as pessoas que aqui ficam vão dar continuidade à Associação. Pelo menos eu espero que sim. Já temos tudo esquematizado e eu acredito que não será algo que vai morrer sem mais nem menos. Pelo menos, eu acredito que não.

CL– Estamos a falar de quarenta anos em Macau, um pouco mais ou menos…

J.M.– Estou em Macau vai fazer 36 anos em Janeiro. É uma vida. Mas há algo que o Barão do Rio Branco dizia que é para mim uma inspiração e que é: “Em qualquer lugar, terei sempre a pátria em minha lembrança”. Posso estar em qualquer lugar do mundo que nunca vou esquecer o Brasil e tudo o que eu puder fazer para lembrar e honrar o Brasil, eu faço, mesmo não estando em Macau, estando em qualquer outro lugar do mundo. Normalmente os brasileiros são apaixonados pela pátria. Eu sou. Independentemente do rumo político pelo qual o País incorre, eu sou brasileira e nunca deixarei de ser.

CL– Se tivesse que traçar um retrato do que é a comunidade brasileira neste momento em Macau, o que diria?

J.M.– A maioria dos brasileiros radicados em Macau trabalham na área da aviação, depois na área religiosa, tanto católica, como no que toca a outros tipos de denominações religiosas. O futebol também é algo que tem trazido muitos brasileiros para Macau. Têm chegado muitos jogadores para tentar a vida aqui, para jogar aqui. Na área bancária conheço apenas três brasileiros: eu e mais dois colegas que trabalham no BNU. Há médicos, há pessoas que trabalham na área dos cosméticos, na área da restauração. E no geral é mais ou menos isso. Há arquitectos e professores também. É uma comunidade muito diversificada.

CL– Referia a questão da presença religiosa também…

J.M.– Padres brasileiros, em Macau, conheço quatro. E também há pastores, ligados a outras denominações religiosas. Conheço pelo menos quatro também.

CL– A comunidade brasileira de Macau é uma comunidade que mantém ainda uma faceta espiritual e religiosa activa?

J.M.– Sim, é bastante activa. Destes quatro padres que referia, há três que conheço relativamente bem. O padre Pedro, que está na igreja de São José Operário, na Areia Preta, é muito activo. Ele celebra, inclusive, missa para a comunidade brasileira. Celebrou recentemente uma missa para a comunidade no Dia de Nossa Senhora da Aparecida, que coincide com o Dia das Crianças no Brasil. É feriado no Brasil e o padre Pedro celebrou uma missa em língua portuguesa para os brasileiros, para os portugueses e para todos quantos quiseram assistir. É uma homenagem muito bonita. Foi uma missa muito bonita. Há um outro padre, o padre Rafael, que está colocado na igreja de São Lourenço e que é novo aqui – está em Macau há cerca de um ano – e há também o padre Daniel, que está na Sé. Todos eles conseguem ler a Bíblia em Chinês. Eles estão em Macau para evangelizar a população chinesa, mas também celebram missas em Português e em Inglês. O objectivo primordial, de acordo com o que me disse o padre Pedro, é o de evangelizar a comunidade chinesa. Eles têm de aprender primeiro Chinês para depois vir trabalhar para Macau. Este padre esteve em Macau mais ou menos uns 25 anos. Foi embora e depois voltou.

Marco Carvalho

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