GUARDIÕES DAS CHAVES – 12

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Catacumbas e perdão: Calisto I

SÃO CALISTO I (218-222) – Calisto I foi o 16.º Pontífice Romano. As famosas Catacumbas de São Calisto, em Roma, têm o seu nome, pois foi ele que supervisionou a escavação destas catacumbas ao longo da Via Appia “onde estão enterrados 46 papas e cerca de 200.000 mártires” (Memmo Caporilli, Os Pontífices Romanos). Durante algum tempo, os restos mortais de São Pedro e São Paulo foram também ali guardados, até serem levados para a sua actual localização: as duas basílicas a eles dedicadas.

Podemos assim aferir a importância que a Igreja dá aos lugares de repouso para os mortos. Vale a pena citar o que a Congregação para a Doutrina da Fé determina no ponto 5 da “Instrução Ad resurgendum cum Christo a propósito da sepultura dos defuntos e da conservação das cinzas da cremação”, publicada em 2016:

“Quaisquer que sejam as motivações legítimas que levaram à escolha da cremação do cadáver, as cinzas do defunto devem ser conservadas, por norma, num lugar sagrado, isto é, no cemitério ou, se for o caso, numa igreja ou num lugar especialmente dedicado a esse fim determinado pela autoridade eclesiástica”.

“Desde o início os cristãos desejaram que os seus defuntos fossem objecto de orações e de memória por parte da comunidade cristã. Os seus túmulos tornaram-se lugares de oração, de memória e de reflexão. Os fiéis defuntos fazem parte da Igreja, que crê na comunhão ‘dos que peregrinam na terra, dos defuntos que estão levando a cabo a sua purificação e dos bem-aventurados do céu: formam todos uma só Igreja’ (Catecismo da Igreja Católica nº 962)”.

“A conservação das cinzas num lugar sagrado pode contribuir para que não se corra o risco de afastar os defuntos da oração e da recordação dos parentes e da comunidade cristã. Por outro lado, deste modo, se evita a possibilidade de esquecimento ou falta de respeito que podem acontecer, sobretudo depois de passar a primeira geração, ou então cair em práticas inconvenientes ou supersticiosas.”.

O Papa Calisto parece ter tido uma morte violenta. Caporilli escreve que o Pontífice “foi espancado até à morte com paus e os seus restos mortais atirados para um poço” (Os Pontífices Romanos). A tradição diz que este poço se encontra na igreja de São Calisto. O Liber Pontificalis refere que os seus restos mortais foram sepultados no cemitério de Calepodius, ao longo da Via Aurelia, mas acabaram por ser transferidos para a Basílica de Santa Maria em Trastevere, no Século IX (cf. Chapman, J. 1908. “Papa Calisto I”. The Catholic Encyclopedia. Nova Iorque. Robert Appleton Company). Esta basílica fica a um minuto a pé da igreja de São Calisto.

O acto mais notável do Papa Calisto foi provavelmente a clemência que demonstrou para com os que tinham abandonado a Igreja (apóstatas), os adúlteros e os assassinos. Nesta altura da História da Igreja primitiva, estes pecadores, mesmo que se arrependessem, eram excomungados sem esperança de perdão. Podemos imaginar a angústia que muitos dos cristãos afastados, mas arrependidos, sentiam, sobretudo quando se aproximava a sua morte. Ao dar a estes irmãos caídos acesso aos Sacramentos, o Santo Padre tornou-se querido por muitos, pois reflectiu verdadeiramente a infinita misericórdia de Deus nesse acto e foi uma recordação da resposta de Jesus a Pedro, que lhe disse que devia perdoar não só «sete vezes, mas setenta vezes sete» (Mateus 18, 22).

No entanto, coloca-se uma questão: o que acontece àqueles que realmente se arrependeram dos seus pecados, mas não tiveram acesso à confissão, uma vez que foram excomungados? Sabemos que, se uma pessoa está verdadeiramente arrependida de ter ofendido a Deus, mas não lhe é dada a possibilidade de confessar o seu pecado sem culpa própria, Deus, na sua infinita misericórdia, terá em conta a sua contrição. O Compêndio do Catecismo da Igreja Católica (nº 213) afirma: “Deus, apesar de querer ‘que todos tenham modo de se arrepender’ (2 Ped., 3, 9), tendo criado o homem livre e responsável, respeita as suas decisões. Portanto, é o próprio homem que, em plena autonomia, se exclui voluntariamente da comunhão com Deus se, até ao momento da própria morte, persiste no pecado mortal, recusando o amor misericordioso de Deus”. Quando uma pessoa está verdadeiramente arrependida dos seus pecados no momento da morte, é um sinal de que rejeita os seus pecados e, assim, abre-se à graça perdoadora de Deus.

A benevolência do Papa foi, no entanto, amargamente atacada por Tertuliano, que tinha caído num Montanismo rigorista (ver PAIS DA IGREJA n.º 19), e por Hipólito, que se autoproclamou antipapa (ver PAIS DA IGREJA n.º 18), como já referimos.

Pe. José Mario Mandía

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