Verde, velho, cinzas
A Igreja em Macau junta-se à Igreja universal para uma das celebrações mais emblemáticas do Cristianismo: o Domingo de Ramos na Paixão do Senhor. As nove paróquias que compõem a diocese de Macau reservam parte das missas celebradas, principalmente nos horários da manhã, para a realização de uma breve, mas bem significativa Bênção dos Ramos. Estes deverão ficar expostos nas casas dos fiéis durante o período de quase um ano, sendo posteriormente devolvidos à Diocese, a fim de serem queimados. As cinzas daí resultantes são impostas nas testas dos fiéis em forma de cruz, na Quarta-feira de Cinzas. Este ano teve lugar no passado dia 14 de Fevereiro.
Neste ano de 2024, mais precisamente a dia 24 de Março, a Igreja Católica celebra o Domingo de Ramos. Dá-se, assim, início à Semana Santa. Neste Domingo tão especial comemora-se a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, no qual a multidão O recebeu com alegria e O aclamou como o Messias. É esta Festa narrada em todos os Evangelhos canónicos (Marcos 11, 1-10; Mateus 21, 1-11; Lucas 19, 28-44; e João 12, 12-19).
Nesta data cruzam-se as duas tradições litúrgicas que originaram a celebração do Domingo de Ramos: a tradição litúrgica de Jerusalém e a tradição litúrgica de Roma. Na tradição litúrgica de Jerusalém, mais histórica, temos como que um acto profético de Jesus quando Ele entra como Rei da Paz e Messias, sendo depois condenado pelo cumprimento das profecias. “Bem-aventurado aquele que vem como Rei em nome do Senhor. Paz no céu e glória nas alturas”, gritava a multidão em Jerusalém quando Jesus entrara na cidade, tapando-lhe o caminho de tantos que ali estavam. Assim narra São Mateus no seu Evangelho, a profecia do triunfo pascal de Cristo e o anúncio da Sua Paixão. De recordar, no seu sentido profético, que no Antigo Testamento este dia foi anunciado em Zacarias 9, 9: «Alegra-te muito, ó filha de Sião; exulta, ó filha de Jerusalém; eis que o teu rei virá a ti, justo e trazendo a salvação, humilde, e montado sobre um jumento, sobre um jumentinho, filho de jumenta».
A segunda tradição litúrgica, a de Roma, é mais teológica, pelo convite aos fiéis para que entrem conscientemente na Semana Santa da Paixão de Cristo, antecipando a proclamação do mistério no Evangelho de Mateus (26, 14-27,66).
O Domingo de Ramos é o sexto e último Domingo da Quaresma, sendo um dia de tal importância que nenhuma espécie de comemoração é permitida na Missa. Começam os deveres da Páscoa. O Missal Romano indica a estação de São João de Latrão, local onde antes de Setembro de 1870 o Papa realizava a cerimónia deste Domingo. Os gregos também celebram o dia com grande solenidade, chamando-lhe “kyriake” ou “heorte ton baion” ou “heorte baiophoros” ou mesmo Domingo de Lázaro, pois a Festa da Ressurreição de Lázaro, no seu rito, cai na véspera. Os imperadores bizantinos costumavam distribuir ramos de palmeira e pequenos presentes na corte e entre familiares.
Os livros litúrgicos latinos chamam-no “Dominica in Palmis”, “Dominica Palmarum” ou “Dies Palmarum”. Foi também denominado de “Dominica Hosanna” ou simplesmente “Hosanna” (“Ozanna”), em alusão ao grito do povo durante a procissão da entrada de Jesus na cidade. A Páscoa florida é também uma designação do dia, devido às ramagens que polvilhavam as ruas e que todos estendiam em frente ao jumento que transportava Jesus. Ou seja, deriva do Latim “Pascha floridum”, que em Francês se diz “Pâques fleuries”, ou em Espanhol “Pascua florida”. Foi precisamente num Domingo de Páscoa florida que 1512 os espanhóis baptizaram o território do actual Estado da Flórida (Estados Unidos). Antigamente abençoavam-se flores que depois eram entrelaçadas entre as palmas das mãos.
O Domingo de Flores era muito conhecido em Inglaterra, na Alemanha como “Blumensonntag” ou “Blumentag”, bem como no Oriente, entre os povos usuários do missal glagolítico (que antecede o cirílico) e também entre os arménios. Estes últimos celebram outro Domingo de Ramos no sétimo Domingo após a Páscoa.
No Domingo de Ramos, os fiéis reúnem-se nas suas paróquias para receber a tradicional bênção das palmas do sacerdote e participar na procissão e na Missa Solene, na qual se lê a história da Paixão de Cristo. A tradição remonta ao Século IV em Jerusalém, embora a denominação do Domingo de Ramos tenha origens no Século VII, a partir dos escritos de Santo Isidoro de Sevilha (+636), que o denominou “grande dia”.
Vítor Teixeira
Universidade Fernando Pessoa